Fiscalização

PLP 109: relator descarta acordo com Fazenda e torna voluntário acesso da ANP a notas fiscais

O relator do PLP 109, Otto Alencar Filho, apresentou parecer que impede o acesso automático da ANP a notas fiscais. A medida contraria a Fazenda e enfraquece a fiscalização. O deputado deixa a Câmara para assumir vaga no TCE-BA

Otto Alencar Filho
Otto Alencar Filho

BRASÍLIA – O relator do PLP 109/2025, Otto Alencar Filho (PSD/BA), rejeitou uma proposta que conta com apoio do Ministério da Fazenda para assegurar, de fato, o compartilhamento de notas fiscais entre a Receita Federal e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). 

O parecer apresentado na quinta (11/12) não assegura o acesso, em mais um revés na discussão legislativa. Da forma proposta, o compartilhamento será voluntário, permitindo que agentes regulados – como distribuidoras de combustíveis investigadas – optem por negar o acesso.

Otto Filho foi sabatinado na quarta-feira para ocupar o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE-BA), por indicação do governador Jerônimo Rodrigues (PT). O futuro conselheiro deve se descompatibilizar na próxima semana, para a posse prevista para 16 de dezembro.

O PLP 109/2024, portanto, precisará de um novo relator e não há acordo para votação na próxima semana, de esforço concentrado antes do recesso parlamentar.

O parecer de Otto Filho prevê que “para que a ANP acesse os dados diretamente nas administrações tributárias, o agente regulado precisará consentir expressamente com esse compartilhamento, nos termos da legislação”. 

Dessa forma, frustra as intenções da agência, que busca ter acesso aos dados para intensificar e qualificar a fiscalização. Atualmente, os agentes são obrigados a informar as movimentações de combustíveis, venda e estoques de forma autodeclaratória. 

As recentes operações Carbono Oculto e Poço de Lobato, que tiveram como alvo dezenas de distribuidoras e as operações da Refit, dona da Refinaria de Manguinhos (RJ), deram visibilidade a práticas conhecidas do setor, mas de difícil fiscalização: a venda entre distribuidoras, antes de chegar aos destinos finais. 

A agência precisa verificar essas operações entre congêneres de forma manual, com atrasos e com base em dados incompletos. Em muitos casos, a ANP atestou que há fraudes em volumes, estoques e tentativas de ocultação dos reais fornecedores e clientes. 

Fazenda passou a apoiar acesso aos dados         

O acesso aos dados fiscais, informações protegidas por sigilo, têm apoio do Ministério da Fazenda e da Receita Federal. Segundo apuração da eixos, um texto foi fechado em novembro. 

O fisco quer assegurar a preservação do sigilo e guarda das informações. Na minuta, vista pela eixos, “as informações e dados compartilhados na forma desta lei mantêm seu caráter sigiloso, nos termos do art. 198 do Código Tributário Nacional”. 

O acesso pela ANP aos dados passa a ser obrigatório para obtenção e manutenção das outorgas e autorizações. 

A Fazenda apoia o acesso pela ANP aos dados e informações das Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e) de suas operações comerciais, incluindo Notas Fiscais ao Consumidor Eletrônicas (NFC-e) e Conhecimentos de Transporte Eletrônicos (CT-e).

Com isso, a agência conseguiria rastrear, inclusive, os caminhões-tanque. Em investigações recentes, a ANP identificou casos de desvios de metanol e outros produtos nas rotas em terra, após o desembarque dos navios. O trabalho, contudo, depende de agentes em campo e colaboração com outros órgãos.

Em 2024, o Ministério de Minas e Energia (MME) tentou emplacar o compartilhamento por decreto, mas a Casa Civil e a Fazenda entenderam que carecia de amparo legal – daí a proposta de lei complementar feita por Alceu Moreira (MDB/RS) no PLP 109/2024.

Moreira é presidente da Frente do Biodiesel (FPBIO), setor que sofre com focos de fraudes na mistura obrigatória do biocombustível. Um problema enfrentado no setor é a emissão de ‘bionotas’, notas fiscais frias de compra de venda do produto para enganar a fiscalização.

As fraudes no biodiesel também servem para ocultar o desvio de metanol, matéria-prima das usinas legítimas, mas usadas por grupos criminosos para alimentar o mercado paralelo de solventes. 

No parecer, Otto Filho inclui dados de produção, comercialização, movimentação, estoques e preços de derivados de petróleo, gás natural, combustíveis fósseis, biocombustíveis e sintéticos.

E ficam “expressamente excluídas do fornecimento periódico as informações sobre valores e tributos das operações”, impedindo que a ANP monte uma base de dados de preços de combustíveis.

Três relatores em cinco meses

O PLP 109/2024 foi aprovado na Comissão de Minas e Energia (CME) da Câmara, em setembro, com relatório de Tião Medeiros (PP/RS). A proposta limita o acesso da ANP a dados de volume e à natureza das operações, insuficiente para adensar a capacidade de fiscalização. 

Em novembro, Kim Kataguiri (União/SP), aprovou o segundo relatório na Comissão de Finanças e Tributação (CFT), com um dispositivo prevendo o sigilo dos dados, mas ampliando o escopo e assegurando o acesso, de fato, às informações pela ANP. 

Com a saída de Otto Filho para o TCE, o PLP 109/2024, terá um quarto relator e não é possível afirmar, neste momento, se a tempo de aprovar na Câmara este ano.  

Inscreva-se em nossas newsletters

Fique bem-informado sobre energia todos os dias