BRASÍLIA — Levantamento do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) divulgado nesta quarta (16/11) na COP27, no Egito, mostra que o Brasil gastou R$ 118,2 bilhões com subsídios aos combustíveis fósseis em 2021, e esse valor pode ser ainda maior em 2022, quando consideradas as isenções de impostos concedidas por Jair Bolsonaro (PL) em sua corrida eleitoral.
Do total de subsídios concedidos no ano passado, a maior parte, R$ 71,9 bilhões, foi destinada ao consumo. Para a produção foram alocados R$ 46,3 bilhões.
De acordo com o relatório, o maior subsídio à produção de petróleo e gás no Brasil vem do Repetro, mecanismo que isenta de tributos a importação e produção interna de máquinas e equipamentos para a exploração de petróleo e gás.
O segundo maior subsídio beneficiou consumidores de gasolina e diesel, com sucessivas reduções de dois tributos incidentes sobre combustíveis, o PIS/Cofins e a Cide-Combustíveis.
O documento divide os subsídios em duas modalidades: consumo e incentivo a produção. Os subsídios ocorrem por meio de renúncias fiscais: (Gastos Tributários e outros regimes de renúncias de de impostos) e por Gastos Diretos (recursos do orçamento federal para as petroleiras realizarem pesquisas, por exemplo).
Do lado do consumo, um exemplo prático ocorre quando o governo brasileiro, diante do aumento dos preços internacionais, zera a cobrança de impostos, como ocorreu entre março e abril do ano passado, com a isenção do PIS-Cofins para o óleo diesel e gasolina. A desoneração deste tributo resultou em R$ 60 bilhões em subsídios durante todo o ano de 2021.
“Os subsídios são pouco efetivos para o controle inflacionário, pois o aumento dos preços não se deve ao aumento dos impostos, mas, sim, à internalização das oscilações dos preços internacionais, tanto é que a inflação se manteve alta em 2022, mesmo com as renúncias do ano passado”, explica Livi Gerbase, assessora política do Inesc.
“Essas benesses ao setor deveriam ser limitadas no tempo e pensadas a partir das necessidades das pessoas mais pobres, pois, do jeito que estão, os subsídios só aprofundam ainda mais as desigualdades. Isso porque não existem compensações por parte do governo ou da indústria dos combustíveis fósseis, e o PIS-Cofins é um tributo criado para financiar a Saúde Pública, Assistência Social e Previdência”, acrescenta.
Subsídio a fósseis e dividendos para os acionistas
Para o Inesc, o Brasil tem campos de petróleo muito eficientes, que não necessitam de incentivos fiscais para serem rentáveis, como o pré-sal. No entanto, ofereceu R$ 40 bilhões para essa finalidade, por meio do Repetro e de renúncias associadas à redução da Contribuição Social sobre Lucro Líquido e do Imposto de Renda.
“Tais subsídios contribuem para a geração de lucros extraordinários pelas petrolíferas: a Petrobras registrou o maior lucro da história da empresa em 2021 – R$ 106 bilhões, em grande parte repassado para seus acionistas na forma de dividendos”, informa o estudo.
Segundo o documento, os subsídios estabelecidos na Lei nº 13.586/2017 em grande medida impedem o Estado de acessar importantes parcelas das rendas petrolíferas, além de estimular a expansão dos investimentos em fósseis no Brasil, o que traz impactos climáticos negativos.
“É fundamental a revisão desse tipo de benefício fiscal à luz dos desafios e compromissos relativos às alterações climáticas assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris”, diz.
Lucrando com a crise
Levantamento da gestora de ativos Janus Henderson mostra que crise energética pós-invasão da Ucrânia pela Rússia levou a Petrobras — e seus pares globais no setor de energia — a contabilizar um recorde no pagamento de dividendos no terceiro trimestre de 2022. A brasileira foi a terceira maior pagadora do mundo no T3 e pode acabar o ano como a segunda.
A 36ª edição do Índice Global de Dividendos analisa os pagamentos de 1200 empresas de todo o mundo, e conclui que os produtores de petróleo e gás foram os grandes impulsionadores do crescimento no terceiro trimestre, aumentando seus dividendos em três quartos em relação ao ano anterior para um recorde de US$ 46,4 bilhões de dólares.
Taiwan, Estados Unidos, Hong Kong e Canadá foram os mais importantes contribuintes para o crescimento, compensando a desaceleração da China.
Carvão incentivado
Em 2021, o subsídio destinado ao carvão, proveniente da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) foi de R$ 749 milhões. Para fins de comparação, o valor destinado às fontes renováveis dentro da própria CDE é cerca de três vezes menor.
“Esse subsídio é altamente questionável. A contribuição do carvão é de apenas 2,7% da oferta de geração de eletricidade no Brasil, mas as emissões oriundas dessa fonte representam 30% das emissões totais do setor elétrico”, aponta o estudo do Inesc.
“A diversificação da matriz energética torna o carvão desnecessário, mas ele se mantém na atualidade devido à renovação e ampliação dos subsídios ao setor, em especial por meio do novo Programa para o Uso Sustentável do Carvão Mineral”, completa.
Tendência mundial
No mundo, o apoio às fontes de energia fósseis também está em alta.
Dados da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) mostram que os subsídios dobraram em 2021, sem necessariamente atingir a população que mais sofre com o aumento dos custos de energia.
No ano passado, o apoio geral dos governos aos combustíveis fósseis em 51 países em todo o mundo saltou para US$ 697,2 bilhões em 2021, ante US$ 362,4 bilhões em 2020, à medida que os preços da energia aumentaram com a recuperação da economia global.
E a tendência é mais subsídio. OCDE e IEA apontam que os apoios públicos ao consumo de fósseis tendem a aumentar ainda mais em 2022 devido à inflação dos combustíveis e da eletricidade.