Biocombustíveis

Reação da indústria do etanol à desoneração da gasolina é "oportunista", diz Renan Filho

Em seu primeiro discurso como ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB/AL) também promete expansão das ferrovias

Reação de usinas de etanol à isenção de impostos federais para gasolina é oportunista, diz Renan Filho. Na imagem: Renan Filho (MDB/AL) assume o Ministérios dos Transportes e discursa (Foto: Ricardo Botelho)
Renan Filho (MDB/AL) assume o Ministérios dos Transportes prometendo mais ferrovias (Foto: Ricardo Botelho)

BRASÍLIA — O novo ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB/AL), classificou como “oportunista” a reação indignada de lideranças do setor sucroenergético em relação à MP 1157, que prorrogou a desoneração da gasolina e etanol por 60 dias.

Nesta segunda (2/1), a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) e o Fórum Nacional Sucroenergético — ambos liderados por agentes simpáticos ao governo de Jair Bolsonaro — classificaram a MP, uma das primeiras do governo Lula, de “atentado econômico, ambiental, social e jurídico”.

O setor ameaça judicializar a questão. Unica e FNS alegam que a medida é inconstitucional, já que a MP mantém a gasolina e o biocombustível sem diferencial tributário — como garantido pela emenda constitucional 123/2022, aprovada no Congresso, no ano passado, para garantir a competitividade do etanol, nos postos, frente à desoneração da gasolina.

Para Renan Filho, as lideranças do etanol emitiram uma “nota atrasada“.

“Deveria ter emitido a nota no momento apropriado. Esperou passar a eleição para emitir essa nota. Isso é oportunismo, a meu ver”, comentou o novo ministro dos Transportes.

Renan Filho destacou, porém, que não pretende interferir na questão. A pasta de Transportes estará focada, segundo ele, na recuperação e ampliação da infraestrutura de transportes.

“A questão de desoneração dos combustíveis é uma questão do Ministério da Fazenda. E decisão presidencial. Como ministro dos Transportes, o que eu vou oferecer a esse segmento é reconstrução de rodovia, ferrovia. Ferrovia boa para reduzir custos.”

“Eu não entro nas questões tributárias e nas questões de prorrogação de incentivos porque essas são uma decisão do presidente da República e do Ministério da Fazenda.”

Renan Calheiros defende MP

O senador Renan Calheiros (MDB/AL), pai de Renan Filho, saiu em defesa da postergação da desoneração.

“É uma medida que o governo precisaria ter tomado, sim. Porque você não pode, na improvisação de uma posse, nos primeiros dias de um governo, arcar com o ônus de uma reoneração da forma como o Congresso fez” disse.

Calheiros reforçou o discurso de seu filho, ao classificar a posição da Unica e FNS como “uma reação tardia”.

E defendeu a revisão da política de preços de combustíveis da Petrobras — que, desde 2016, no governo Michel Temer, busca o alinhamento ao preço de paridade de importação.

“Essa política vigente pune a produção nacional e leva em consideração variantes que não podem ser compatibilizadas com as prioridades do país. Eu defendo uma mudança. Não sei ainda qual é o posicionamento do governo com relação a isso. Mas eu defendo, sim”, afirmou.

Unica: desoneração é tema de ministros com “melhores elementos”

Em resposta às declarações do novo ministro, a Unica afirmou que tem tudo para “acreditar que uma acusação tão séria ao setor sucroenergético, uma das mais importantes indústrias para Alagoas e para o Brasil, feita pelo ministro Renan Filho, foi um ato mal refletido que deve ser relevado”.

“(…) Acho que a declaração do ministro Renan está superada. Ele mesmo disse que não deve continuar emitindo opiniões sobre o assunto que não é atribuição da sua pasta, e que o tema deve ser tratado pelos ministros que possuem melhores elementos para analisá-lo”, diz a resposta assinada pela entidade, presidida por Evandro Gussi, ex-deputado federal pelo PV de São Paulo.

A MP da desoneração é assinada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Questionada sobre a acusação de inconstitucionalidade do texto, a pasta não respondeu até o momento.

A reação do setor ganhou imediatamente caráter eleitoral. A desoneração da gasolina em 2022 afetou o mercado de etanol hidratado, mesmo com a redução do ICMS do biocombustível.

Foram gastos R$ 3,8 bilhões da União, autorizados pela PEC do Auxílio Brasil, para compensar estados pela desoneração do etanol. Outra medida costurada no Senado à época, pelo relator Fernando Bezerra (MDB/PE), foi justamente a aprovação da emenda 123/2022.

“Na ocasião em que o presidente Bolsonaro tomou a decisão equivocada de subsidiar os combustíveis fósseis, não precisamos emitir nota, pois o Congresso Nacional, liderado pelo Senado Federal, reagiu à altura, aprovando uma emenda à Constituição, que passava a garantir diferencial competitivo ao etanol, gerando uma compensação de 3,8 bilhões de reais e fixando prazo máximo da isenção até 31 de dezembro de 2022”, diz a nota.

“Quanto à referência às eleições, faço minhas as palavras do presidente Lula: elas acabaram e não devem ser mais um tema a dividir o Brasil. Importante mesmo é explicar para o mundo como assumimos um compromisso com o combate às mudanças climáticas em um dia e subsidiamos combustível fóssil no outro ou como isso vai destruir empregos em Alagoas e no Brasil”, conclui.

Desperdício de diesel nas estradas

Em seu discurso de posse, nesta terça (3/1), Renan Filho destacou que a má conservação das estradas brasileiras gera perdas estimadas de R$ 4 bilhões por ano para as transportadoras, com o desperdício de diesel.

A conta, citada pelo ministro, é de um estudo da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) — segundo o qual as transportadoras consomem cerca de 1 bilhão de litros a mais de diesel, por ano, devido à precariedade das rodovias brasileiras.

Ainda de acordo com o estudo citado por Renan Filho, 66% das rodovias brasileiras se encontram hoje em estado ruim, péssimo ou com algum problema.

“Estamos às vésperas da safra agrícola, que demanda boas estradas e ferrovias para ser escoada. E é triste não estarmos à altura de prestarmos um serviço de excelência que um país pujante com o Brasil nos demanda”, discursou.

Ele criticou a gestão anterior, do então Ministério da Infraestrutura, chefiado pelo agora governador de São Paulo, Tarcísio Freitas. Renan Filho afirmou que, entre 2019 e 2022, houve um volume “insuficiente” de investimentos nas estradas, que estariam “sobrecarregadas”.

“Estamos, nos últimos anos, no menor nível de recursos para esta pasta. Estima-se que a recuperação da malha, demandaria R$ 100 bilhões em investimentos… O baixo investimento associado à alta demanda tem resultado claro: os buracos, logo depois de tapados, ressurgem maiores que antes”, disse.

O ministro recém-empossado destacou ainda que, além de retomar obras paradas e realizar novos investimentos, a pasta se dedicará a revisar acordos de concessão — somados, os contratos correspondem a 15 mil quilômetros de rodovias.

Mais ferrovias

Renan Filho também anunciou que uma das prioridades de sua gestão na pasta será a ampliação da malha ferroviária. Ele citou a recente criação de uma secretaria exclusiva para tocar os investimentos na malha.

Além de revisitar o marco regulatório das ferrovias, o órgão recém-criado deve buscar parcerias com o setor privado para impulsionar o processo de recuperação e ampliação.

“Buscaremos ampliar a participação das ferrovias na nossa matriz de transportes, unindo forças com o setor privado para tornar as autorizações realidade, e concluir as obras públicas que escoarão nossa safra ainda nesse governo”, afirmou.

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