O tempo entre a última sexta-feira e ontem significou o fim de semana mais importante para o setor energético brasileiro em 2018. Em um período de 48 horas, o troca-troca com a janela partidária que permitiu a mudança do ex-ministro de Minas e Energia Fernando Bezerra Coelho Filho do MDB, quinze dias depois de se filiar, para o DEM, jogou o ministério de volta no colo do MDB, partido que dominou a pasta ao longo dos últimos 15 anos, desde o primeiro governo Lula. A mesma janela partidária bagunçou o andamento de esperados projetos do setor, como o processo que permite a Petrobras a vender fatia da cessão onerosa, que vai mudar de relator no Congresso. Por último, mas não menos importante, a prisão do ex-presidente Lula movimentou os mercados em geral por adicionar mais instabilidade ao cenário político e pode precipitar a mobilização da esquerda com foco na eleição, recrudescendo a resistência de políticos desse campo a agendas liberais, gerando impacto até no setor energético, como na proposta de privatização da Eletrobras.
A chegada de Moreira Franco ao ministério de Minas e Energia é o desfecho de um cenário de mudança que não vinha agradando aos agentes do mercado interessados na privatização da Eletrobras. Após o anúncio oficial da indicação do novo ministro os papéis da Eletrobras sofreram impacto direto. As ações preferenciais da companhia caíram de R$ 28,15 para R$ 18,36 ontem. Só nesta segunda as ações caíram 1,95 ponto, variando -9,56 no dia.
Embora essa se mantenha como uma das principais pautas do MME em 2018 – ao menos no discurso do governo – a tarefa não será simples. Muitos políticos, inclusive da base aliada do governo Temer, são contra a privatização da estatal. Alguns deputados acreditam que o ano eleitoral e resistência de parte dos governadores pode tornar a tarefa ainda mais complexa. Moreira Franco, que toma posse nesta terça-feria com outros nove ministros, já afirmou que a pauta será prioritária para o governo.
O caso Moreira e o caso Lula
O resultado pode ficar ainda pior nesta terça, se pesar no mercado a posição da procuradora regional da república Andréa Lyrio Souza, que apontou perante o Tribunal Regional Federal da primeira região (TRF1) que a posse de Moreira Franco como ministro a Secretaria-Geral da Presidência ainda no ano passado seria uma blindagem ao ministro, semelhante ao caso do ex-presidente Lula que fora nomeado ministro por Dilma Rousseff mas teve a posse impedida por decisão liminar do ministro Gilmar Mendes no Supremo Tribunal Federal. A posição do MP foi expressa na semana passada no caso do TRF1 e divulgada ontem à tarde pela revista Época. O MP defende a exoneração de Moreira, pedida pela Justiça Federal do Amapá na primeira instância.
A chegada de Márcio Félix à secretaria-executiva do MME é outro movimento no xadrez que – para alguns – sugere que o foco da política energética do governo Temer mudou. Félix era secretário de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis da pasta, funcionário de carreira da Petrobras e muito mais próximo desse setor – apesar de ser engenheiro elétrico – do que do setor elétrico. Seu nome tranquiliza as petroleiras, com foco nos três leilões de petróleo que a ANP deve realizar ainda este ano. As empresa s do setor petróleo enxergam como positiva a permanência de Félix no ministério, já que ele participou e liderou importantes mudanças para o setor.
Agora Félix terá que trabalhar para quem espera a privatização da Eletrobras e também a revisão do setor elétrico. Toda a mudança, inevitavelmente, agrada alguns e desagrada outros. Paulo Pedrosa, que comandava a pasta, tinha forte ligação com o setor elétrico, tendo sido diretor da Aneel e também presidente de associação de grandes consumidores de energia. Félix, por outro lado, tem grande habilidade com o congresso nacional e interlocução com governadores, o que será importante no caso da estatal.
O próprio Félix nega a mudança no foco e garante que a Eletrobras será prioridade número 1. “Ao passar no concorrido vestibular de Engenharia Elétrica da UnB, não sabia que quatro décadas depois essa seria uma das minhas credenciais para o desafio #Eletrobras Prioridade 1″, disse em uma rede social.
Prisão de Lula pode reforçar oposição no Congresso
No Congresso, a proposta de privatizar a companhia e suas subsidiárias também encontra oponentes. Embora minoritário, o PT está determinado a trabalhar contra a privatização da Eletrobras. Para isso, o partido espera mobilizar governadores que temem ser prejudicados pela privatização e estão mais sensíveis contra pautas impopulares em ano eleitoral. Todos os nove governadores do Nordeste – a região do país onde Lula tem maior popularidade – assinaram no fim do ano passado uma carta ao presidente Temer se posicionando contra a privatização. Esses mesmos governadores são esperados em Curitiba, em uma visita a Lula, nessa semanal, de acordo com o colunista Lauro Jardim. O objetivo do encontro é criar um fato político e reforçar o apoio dos líderes estaduais a Lula.
Em entrevista à E&P Brasil na semana passada, o deputado Arlindo Chinaglia (PT/SP) afirmou que o objetivo da oposição na comissão que analisa o PL 9463/18 (o projeto de privatização da Eletrobras) é mobilizar governadores contra a proposta. Chinaglia afirmou que o PT irá cobrar uma posição dura do governador mineiro, Fernando Pimentel, seu colega de partido.
“Vamos a Minas. O Pimentel está se omitindo mas não vai ter como escapar de se posicionar”, disse o deputado. Se Pimentel comprar a briga, mais de um terço dos governadores dos 27 entes da federação terão se posicionado oficialmente contra a privatização, mostrando a impopularidade da medida justamente entre aqueles que poderiam abrir palanque para o candidato do governo na eleição de outubro, seja lá quem for o escolhido.
A oposição aberta de governadores favorece o desembarque da proposta de privatização por deputados que em ano eleitoral precisarão do apoio da direção estadual de seus partidos para a reeleição. Em Minas, a bancada do MDB é contrária à privatização de Furnas.
Mudança nos governos estaduais favorece candidatos da esquerda ao planalto
O fim de semana também marcou a desincompatibilização de governadores interessados em concorrer ao Senado ou governo federal em outubro. Enquanto cientistas políticos e analistas quebram cabeça tentando antever se uma aliança ampla entre candidatos a esquerda será precipitada com a prisão de Lula ou se o PT manterá a candidatura do ex-presidente, o certo é que o resultado com a posse dos vices reforçou o quadro dos partidos que estão na oposição ao governo Temer.
PT, PSB, PDT e PC do B saem para a corrida eleitoral com o apoio de 15 dos 27 governadores, entre eles o mandatário de Alagoas, Renan Filho (MDB), alinhado com o PT; e de Sergipe, Belivaldo Chagas (PSD), que costurou apoio a Ciro Gomes (PDT) em troca de uma aliança estadual.
Entre os 12 líderes estaduais que permanecem na base de apoio governista, o MDB de Temer, conta com cinco governadores seguindo a direção nacional; o PSDB de Geraldo Alckmin tem outros cinco e Rodrigo Maia (DEM) tem o apoio de dois governadores do PP.
Na Comissão de Minas e Energia da Câmara, as mudanças do último mês também tiveram impacto. Projeto prioritário para o governo, o PL 8939/2017, que libera a Petrobras para vender até 70% das áreas da cessão onerosa, perdeu seu relator, César Souza (PSD), que deixou de ser membro da CME. O equilíbrio de forças na comissão ainda é incerto. Após a aceitação do nome de Marcelo Squassoni para a presidência na semana passada, os três vice-presidentes devem ser escolhidos amanhã, na próxima reunião da CME.
Amanhã Supremo deve decidir a sorte de Lula pela segunda semana seguida
Sobre as eleições e a política partidária dos próximos meses, um pouco mais de tensão será adicionada ao caldeirão amanhã, quando o ministro Marco Aurélio Mello levará ao plenário do Supremo um requerimento para que a corte analise um pedido de liminar contra a prisão em segunda instância. A votação vai impactar na decisão do TRF4 no caso Lula mais uma vez e pode soltar o petista.
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