RIO — Para o diretor do Instituto Nacional do Desenvolvimento da Química (IdQ), Milton Rego, os subsídios destinados ao hidrogênio de baixo carbono devem garantir que o país avance na descarbonização de sua própria indústria. Em entrevista à agência eixos ele defende que o apoio deve ir além da produção do hidrogênio, e alcançar o consumo interno.
Na última terça (22/10), o Ministério da Fazenda abriu uma consulta para receber contribuições para regulamentação de subsídios previstos no marco legal do hidrogênio de baixa emissão de carbono, bem como na lei de incentivos para o hidrogênio, que juntos devem disponibilizar mais de R$ 20 bilhões entre 2028 e 2032.
O objetivo é definir os critérios de habilitação para empresas interessadas em acessar os incentivos do Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (Rehidro) – lei 14.948/2024 – e do Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (PHBC) – lei 14.990/2024.
Embora a legislação traga a previsão de que os incentivos podem beneficiar produtores e consumidores, Rego alerta para o risco de favorecimento da exportação, sem promover o adensamento industrial nacional.
“O subsídio deveria vir na questão dos produtos limpos, tanto quanto na produção de hidrogênio. O que a gente tem que evitar é ter subsídio para a produção de hidrogênio e esse subsídio não vir a ser um fator que estimule a indústria brasileira a ser mais competitiva”, afirma Rego.
Essa preocupação está alinha à Fazenda, que entre outras perguntas, questiona como assegurar que os créditos fiscais favoreçam a comercialização do hidrogênio em território nacional.
“A gente não pode pensar em dar subsídio para uma indústria se estabelecer para exportar. O subsídio tem que ficar no Brasil. E como é que fica no Brasil? De duas formas: ou diminuindo o custo do hidrogênio para acelerar a descarbonização ou incentivando as indústrias a utilizarem o hidrogênio como insumo para esse processo”, argumenta o diretor.
Subsídio para descarbonização europeia
O IdQ é composto por 8 associações representativas do setor químico, entre elas Abiquim, (indústria química) e Abiclor (álcalis e cloro), potenciais consumidoras do insumo. Fundado em 2021, o instituto exerce a Secretaria Executiva da Frente Parlamentar da Química.
Rego alerta que o foco excessivo na exportação pode prejudicar a economia brasileira a longo prazo, e levar o país mais uma vez para a “armadilha” de ser um produtor de commodities.
Ele menciona que a produção de hidrogênio verde, que poderia ser um diferencial competitivo do Brasil devido à sua matriz energética limpa, corre o risco de ser limitada a plantas voltadas para o mercado externo, ajudando na descarbonização de países que competem com o Brasil em alguns segmentos da indústria.
“O hidrogênio produzido no Brasil deve ser utilizado para descarbonizar a indústria brasileira, e não para produzir uma commodity, com tecnologias importadas, especialmente da Europa, exportar amônia de volta para a Europa descarbonizar seus produtos e depois vender para nós esses produtos”, explica Rego.
O diretor reconhece que o governo, particularmente o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), está atento a essa questão, tentando garantir que os subsídios realmente adensem a cadeia industrial nacional e auxiliem na descarbonização de setores estratégicos como cimento, aço, química e papel celulose.
Contudo, ele alerta que há lobbies fortes atuando em prol da produção e exportação do hidrogênio.
“A grande questão são lobbies que, nesse momento, estão buscando unicamente a produção para exportação”, comenta.
Logística e mercado de carbono
Outro ponto levantado por Milton Rego é a logística para escoar o hidrogênio dentro do mercado doméstico.
Ele destaca que a produção de hidrogênio em portos, por exemplo, pode facilitar a exportação, mas cria barreiras para o consumo interno.
“Você pode fazer uma planta de hidrogênio em um porto e depois dizer assim, ‘não consigo vender no mercado doméstico porque não tenho maneira de escoar’, mas eu tenho um navio que pode levar amônia para qualquer lugar do mundo. Então, a gente não pode cair numa situação dessa”, alerta.
Além disso, Rego defende a criação de um mercado regulado de carbono no Brasil como forma de valorizar o hidrogênio de baixo carbono.
“Você só vai dar valor a um hidrogênio de baixo carbono se o resultado final da utilização dessa matéria-prima tiver um diferencial no preço do meu produto”.
Para o diretor, esse mercado seria essencial para que as empresas possam justificar o uso de hidrogênio de baixo carbono em suas operações, especialmente diante da concorrência internacional, onde produtos com maior pegada de carbono ainda são vendidos no Brasil sem diferenciação de preço.