BRASÍLIA — O Ministério de Minas e Energia (MME) vai propor um decreto para revisar o teto das alíquotas de participações especiais, uma cobrança além dos royalties que incidem apenas sobre campos de alta produção contratados no regime de concessão.
A revisão das alíquotas de participações especiais foi uma recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) em 2021, não seguida pelo governo de Jair Bolsonaro (PL). A corte entendeu — e agora o governo Lula acompanha — que a cobrança está defasada, dado que foi pensada para os grandes campos, mas do pós-sal.
A medida faz parte de um pacote fiscal fechado na pasta a pedido do ministro Alexandre Silveira (PSD), na segunda (2/6).
A pasta calcula uma arrecadação adicional de R$ 4 bilhões em 2025 e R$ 9 bilhões em 2026. O MME estima ser capaz de elevar a arrecadação este ano em R$ 20 bilhões, somando aí os R$ 15 bilhões do leilão de participações da União em campos do pré-sal, enviado com urgência para a Câmara, e outras medidas regulatórias.
É uma resposta de Silveira à crise desencadeada pela elevação das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), proposta pelo Ministério da Fazenda.
O governo também precisou congelar R$ 30 bilhões, afetando o pagamento de R$ 7 bilhões em emendas parlamentares, um problema com o Congresso Nacional que Lula (PT) precisa contornar.
A equipe econômica estimou ganhos de R$ 20 bilhões este ano com o decreto original, mas se vê obrigada a recuar: Fernando Haddad (PT) apresentará medidas alternativas nesta terça (3/6) ao presidente Lula, antes do embarque da comitiva para a França.
O aumento dos tetos das alíquotas afetará especialmente o campo de Tupi, no pré-sal da Bacia de Santos. É operado pela Petrobras (65%), com os sócios Shell (25%) e Petrogal (10%). Em março, produziu 780 mil barris por dia.
Tupi disputa o posto de maior produtor de país com Búzios, também operado pela Petrobras, mas no regime de partilha, que não está sujeito ao pagamento de participações especiais.
O pacote fiscal do petróleo, calculado pelo MME, inclui ações que totalizam R$ 20 bi em 2025:
- O leilão das participações da União no pré-sal, que depende da aprovação do projeto no do Congresso Nacional, R$ 15 bi;
- Decreto do aumento das alíquotas de participações especiais, R$ 4 bi (50% da União);
- Aumento da base de cálculo para royalties com a revisão dos preços de referência, previsto pela ANP para julho, R$ 1 bi;
- Acordos de individualização de Jubarte e Sapinhoá, em curso na PPSA, e quando são definidas parcelas da União nos campos contratados e em operação rendendo mais óleo para comercialização, R$ 2 bi.
Para 2026, o MME estima ganhos de R$ 15 bilhões para a União, mas apenas R$ 6 bi são fruto das novas medidas regulatórias (royalties e participações especiais). Outros R$ 9 bi são de leilões de petróleo da União (PPSA) e de blocos no pré-sal (ANP).
Haddad afirmou nesta terça-feira (3/6) que boa parte das estimativas do MME já foram consideradas nas projeções fiscais da Fazenda e o pacote não muda as propostas que serão apresentadas em resposta à crise do IOF.
“Creio que vamos ter uma reunião com o presidente [Lula] bastante produtiva, porque chegamos a um entendimento, [faltam] pequenos detalhes para serem arbitrados, de fato pequenos. Eu penso que o plano de voo está bem montado”, disse na manhã desta terça (3/6).
Silveira afirmou, em outro evento, que há sintonia entre as pastas: “a negociação feita pelo ministro Haddad, do IOF, continua paralela, buscando uma alternativa para que a gente possa readequar o orçamento. Mas esses R$ 35 bilhões vão poder minimizar os impactos”.
O que esperar do decreto de aumento das participações especiais?
As participações especiais são uma alíquota progressiva, com alíquotas de 10% a 40% sobre o valor da produção, descontados custos operacionais. O MME propõe aumentar o teto da cobrança. É como o imposto de renda, com cada alíquota incidente sobre as faixas incrementais de produção.
Em 2021, os ministros do TCU consideraram a progressividade atual inadequada e recomendaram ao MME e ao então Ministério da Economia (ME), comandado por Paulo Guedes, a revisão do decreto 2.705/1998 “visando a conferir progressividade adequada e eficiência arrecadatória”.
“Urge ajustar legislação e regulação alusivas ao componente fiscal participação especial, os quais tendem a desestimular a eficiência do sistema e a reduzir a arrecadação estatal”, disse o ministro Walton Alencar Rodrigues, relator do caso.
O governo não precisa seguir recomendações do TCU. Quando a corte de contas identifica desvios graves em políticas estatais, são feitas determinações.
- A participação especial incide sobre a Receita Líquida da Produção (RLP), que corresponde à receita bruta de cada campo, deduzidos custos operacionais, investimentos, depreciações e tributos. ANP calcula, fiscaliza e cobra os valores trimestralmente.
- Na concessão, os campos estão sujeitos a royalties de 5% a 10%. A participação especial foi criada para ser como compensação extraordinária devida pelos concessionários nos casos de grande volume de produção ou de elevada rentabilidade, variando da isenção até 40% para campos offshore de águas profundas.
Incide apenas sobre os campos de concessão. O maior deles é Tupi, que produziu mais de 770 barris por dia em média no primeiro trimestre de 2025. Ultrapassa 1 milhão de barris de óleo equivalente (boe) quando somado o gás natural. Supera, em muito, o segundo maior: Jubarte produziu pouco mais de 140 mil boe/dia no período.
As faixas atuais de incidência, em produção trimestral (mil m3), com a média diária a aproximada em barris por dia, são:
- 450 mil m3 (31 mil b/d): isento;
- 450-900 mil m3 (63 mil b/d): 10%;
- 900-1.350 mil m3 (94 mil b/d): 20%;
- 1.350-1.800 mil m3 (126 mil b/d): 30%;
- 1.800-2.250 mil m3 (157 mil b/d): 35%;
- Acima de 2.250 mil m3: 40%;
No primeiro trimestre de 2025, as participações especiais renderam R$ 8,784 bilhões, com 47% destinados ao Fundo Social; 3% para despesas da União e 50% para estados e municípios.
Do ponto de vista fiscal, o recurso é carimbado para o Fundo Social, e financiamento de políticas de saúde e educação. Com o marco vigente, o aumento da arrecadação não necessariamente eleva o limite de gastos do governo federal, mas o cumprimento do orçamento.
O Rio de Janeiro é o principal beneficiado justamente em razão da localização do campo de Tupi, contratado no regime de concessão. Recebeu R$ 3,129 bilhões referente à produção do primeiro trimestre, equivalente a 26% do total pago pelas petroleiras e 89% de todo o valor distribuído aos estados.