BRASÍLIA — O pacote de redução de impostos, anunciado esta semana pelo governo federal como forma de reduzir a pressão sobre os preços dos combustíveis, custará R$ 64,8 bilhões aos cofres da União em 2022, de acordo com o texto em discussão neste momento no Senado.
O numero é maior do que as estimativas divulgadas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Na segunda-feira (6/6), após o anúncio oficial do plano de redução de impostos, ele havia afirmado que os cortes na carga tributária teriam um impacto fiscal de R$ 25 a R$ 50 bilhões.
A conta da desoneração
- Ao menos R$ 35,2 bilhões serão destinados, este ano, à desoneração dos tributos federais (PIS, Cofins e Cide) sobre a gasolina e o etanol — somada a isenção já vigente dos mesmos impostos para o diesel e o gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás de cozinha.
Os custos podem se estender pelos próximos anos, já que a proposta em tramitação no Senado prevê estender a isenção dos tributos federais para o etanol hidratado e o anidro até 2027, com custos estimados de mais R$ 7,5 bilhões em 2023 e R$ 7,8 bilhões em 2024. O item foi incluído nesta quinta-feira (9/6) no texto do PLP 18/2022 (do teto do ICMS) pelo relator, senador Fernando Bezerra (MDB/PE).
Falta o aval da equipe econômica — que não foi previamente consultada sobre a extensão do prazo da desoneração do biocombustível.
- Outros R$ 29,6 bilhões, fora do teto dos gastos, serão destinados em 2022 a compensar os estados que optarem por zerar o ICMS sobre o diesel e o GLP ou gás liquefeito de gás natural (GLGN) — e por reduzir para 12% a alíquota do tributo estadual sobre o etanol. A compensação está sendo discutida na PEC dos Combustíveis, que ainda não foi protocolada oficialmente no sistema do Senado.
Esse valor ainda pode mudar, a depender das negociações dos parlamentares para aprovação do texto. A proposta inicial coloca os R$ 29,6 bilhões como um teto para a compensação aos estados que quiserem participar da iniciativa. Ou seja, não há obrigação do governo Bolsonaro de cobrir a perda de arrecadação que possa eventualmente exceder o valor estipulado pelo governo federal.
Os números foram apresentados por Bezerra, que além de relator do PLP 18/22 ficará à frente da futura PEC dos Combustíveis.
Impacto pode ser nulo no diesel
O governo estima que a desoneração proposta terá um impacto de redução de R$ 0,76 no preço do litro do óleo diesel e de R$ 1,65 no litro da gasolina.
O real impacto do corte de impostos sobre o preço final dos combustíveis, no entanto, vai depender da dinâmica do mercado. O peso efetivo da desoneração pode ser maior ou menor, a depender de como os agentes (produtores, importadores, distribuidoras e postos) vão se comportar.
O comportamento dos preços internacionais e de seu respectivo repasse pela Petrobras e demais agentes dos diferentes elos da cadeia — além do comportamento dos custos dos biocombustíveis misturados aos derivados (no caso da gasolina, o etanol anidro) — podem impactar nos preços. A própria desoneração pode ser absorvida, em parte, nas margens das companhias do setor.
No caso do diesel, por exemplo, o impacto estimado da desoneração sobre a redução dos preços não é suficiente para cobrir sequer a defasagem atual dos preços praticados pela Petrobras em relação ao mercado internacional, segundo dados da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom) — que representa concorrentes da estatal, as tradings, no abastecimento do mercado doméstico.
Segundo a associação, na abertura do mercado desta quinta-feira, a Petrobras vendia o diesel e a gasolina, nas refinarias, a preços R$ 0,89 o litro abaixo do preço de paridade de importação (PPI).
“Os cenários das defasagens tanto para gasolina como para o óleo afastaram-se muito da paridade, o que inviabiliza as operações de importação”, diz a Abicom, entidade que representa importadores.
Ontem, no mesmo dia em que as forças políticas se movimentavam em Brasília nas articulações para aprovar o pacote de desoneração, a Petrobras emitiu nota reforçando sua preocupação com uma possível escassez global da oferta de diesel. E saiu novamente em defesa da necessidade de praticar preços de mercado como “condição necessária para que o país continue sendo suprido sem riscos de desabastecimento pelos diversos agentes”.
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Resta saber se a Petrobras fará novos reajustes. A companhia está há um mês sem mexer nos preços do diesel e há três meses segurando aumentos nos preços da gasolina.
Ou seja, a redução da carga tributária pode abrir espaço para que a Petrobras reajuste os preços, diante das preocupações com o abastecimento nacional — especialmente do diesel, que passa por desequilíbrio entre oferta e demanda do combustível em todo o mundo.
A conjuntura se agrava com a proximidade do período de reaquecimento do agronegócio, com a chegada do período de colheita e movimentação da safra durante o terceiro trimestre.
“Preços abaixo do mercado inviabilizam economicamente as importações necessárias para complemento da oferta nacional. Exemplos recentes de desalinhamento aos preços de mercado já se traduzem em problemas de abastecimento em países vizinhos ao Brasil”, alertou a Petrobras, em nota publicada na quarta-feira (8/6).
O fator eleição
O pacote de desoneração é a mais nova tentativa do governo federal de se descolar da responsabilidade da inflação dos combustíveis, diante da proximidade das eleições presidenciais.
Pesquisa eleitoral Genial/Quaest, divulgada na quarta-feira (8/6), mostra que Jair Bolsonaro (PL) é visto, pela opinião pública, como o principal vilão pelo aumento dos preços dos combustíveis. Ao todo, 28% dos 2 mil entrevistados disseram que o presidente da República é o maior responsável pela inflação dos derivados. No último levantamento, em abril, esse percentual era de 24% — a margem de erro é de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos.
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As entrevistas foram feitas entre os dias 2 e 5 de junho — antes, portanto, do anúncio do pacote de desoneração dos combustíveis. A Petrobras, alvo de críticas públicas de Bolsonaro e da oposição pela política de preços alinhada ao comportamento do mercado internacional, foi apontada como principal responsável pelo aumentos dos preços nas bombas por 16% dos entrevistados, seguida dos governadores — outro alvo dos ataques de Bolsonaro — com 14%.