A análise da compra da FAN Distribuidora pela Raízen no Cade tem sido acompanhada de perto por concorrentes do setor.
A Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), Federação Nacional de Distribuidores de Combustíveis, Gás Natural e Biocombustíveis (Brasilcom) e Associação Brasileira de Downstream (ABD/IBP) pedem ao órgão que a operação seja condicionada à limitação de um benefício fiscal detido pela FAN.
O temor é que essa vantagem seja incorporada pela Raízen, a segunda maior distribuidora de combustíveis do país em participação de mercado. A FAN tem entre 1% e 2% do mercado de gasolina comum e diesel B da região Nordeste.
Nesta semana, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou um pedido cautelar da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para reverter uma decisão anterior do próprio tribunal, que autorizou a FAN a aproveitar créditos de PIS e Cofins sobre a comercialização de diesel e gasolina.
O recurso veio após a própria PGFN fechar, em 2021, um acordo com a FAN, em que a companhia abriu mão de valores retroativos, mas assegurou o reconhecimento do direito aos créditos fiscais, segundo informações da Folha de S. Paulo.
Concorrentes cobram neutralização de benefício
O receio das concorrentes é que, ao adquirir a distribuidora (que atua principalmente em estados do Nordeste), a Raízen passe a usufruir do benefício, provocando assimetria concorrencial.
O caso chegou ao Cade em outubro, e desde então o tribunal vem recebendo informações e posicionamentos de agentes do setor sobre os efeitos da operação.
A ABD, divisão do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP) que atua no mercado de downstream, defende a neutralização do benefício fiscal “para que se mantenha a simetria tributária entre os agentes econômicos do mesmo setor”.
A Brasilcom, por sua vez, defendeu junto ao Cade que a Raízen é uma das três grandes empresas que detêm, juntas, mais de 70% do mercado nacional de distribuição – as outras são Vibra, maior do país, e Ipiranga, do grupo Ultra.
“Caso a operação de compra e venda se concretize, a Raízen poderá ter um diferencial competitivo de alcance nacional e de larga escala, o que somado ao seu já conhecido poderio econômico”, diz a Brasilcom. A entidade representa distribuidoras regionais, de diferentes portes.
“[A compra da FAN] tem potencial para gerar dominação de mercados em curtos espaços de tempo, predando e prejudicando as demais distribuidoras, diminuindo a arrecadação federal, direcionando os mercados à indesejada concentração que traz tantos efeitos negativos à sociedade”.
Já a Abicom destaca que a FAN pode aplicar seu benefício fiscal à atividade de importação de derivados de petróleo, e a crítica é que a Raízen, caso a operação seja aprovada, poderia fazer o mesmo.
A compradora “passará a ser titular de uma vantagem competitiva assimétrica e anticompetitiva de alcance nacional, com efeitos nefastos e predatórios evidentes tanto na distribuição quanto na importação de combustíveis”, defende a Abicom.
Todas reforçam o mesmo argumento: o setor de distribuição de combustíveis opera com margens apertadas e com elevada carga tributária. Assim, agentes econômicos que gozem de qualquer assimetria tributária possuem vantagem competitiva capaz de gerar distorções na competitividade.
Ipiranga calcula vantagem em R$ 10 bi
Individualmente, a Ipiranga reforçou a oposição à incorporação do benefício fiscal pela Raízen. Apresenta cálculos que indicam que o benefício representará ganho de R$ 10,2 bilhões anualmente para a compradora.
“Não se está a comprar uma empresa, mas um bilhete de loteria, às custas do contribuinte e da predação direta aos concorrentes”, argumentou a Ipiranga ao Cade.
A Petrobahia, aproveitou a oportunidade para lembrar que a própria Raízen já se manifestou anteriormente contra este tipo de manobra, com o argumento de que provocaria desequilíbrio concorrencial. O caso recuperado ocorreu em 2017, quando o Cade analisou (e vetou) a aquisição da Alesat pela Ipiranga.
À época, a Raízen argumentou que o aproveitamento de benefício tributário de isenção de recolhimento de CSLL, concedido à Alesat, poderia causar um relevante impacto no mercado. Por isso, pediu que o tribunal adotasse medidas que impedissem essa possibilidade.
A Dislub Equador afirma que a compra da FAN pela Raízen pode ampliar a concentração de mercado.
“Apesar da empresa que está sendo comprada não ter tamanho relevante nacionalmente, a empresa compradora possui conhecido potencial, larga experiência no ramo, infraestrutura relevante e também atua como supridora de etanol e de derivados de petróleo na região [Nordeste], concorrendo com Petrobras!”.
Raízen nega prejuízo à concorrência
Em defesa do negócio, a Raízen afirmou que as respostas enviadas por associações e sindicatos, distribuidoras e revendedoras de combustíveis, majoritariamente, “confirmam que o nível de concentração gerado pela operação não apresenta qualquer risco ou preocupação concorrencial”.
Procurada pela agência epbr, a empresa preferiu não comentar o caso. Ao tribunal, a empresa argumentou que o negócio representa uma “oportunidade de realizar uma gestão mais eficiente do seu processo de distribuição, alinhada à sua estratégia empresarial na região [Nordeste]”.
Ao Cade, afirmou que a compra da FAN representa “uma boa oportunidade de aumento de capacidade operacional no mercado de distribuição de combustíveis” e cita tanto o “aproveitamento de benefícios fiscais da FAN” como a compra da base distribuidora em Guamaré (RN), “que será a primeira base da Raízen no estado”.