BRASÍLIA — Os secretários dos estados apresentaram uma proposta ao Senado de aumentar a alíquota da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) do setor de petróleo para 20% a 30%, atrelada ao preço do barril.
Hoje, a alíquota base é de 9%, com direito a abatimentos de parte de custos e investimentos.
O objetivo, justificam os estados, é abrir uma nova fonte de receitas à União e, assim, permitir a montagem de um fundo para compensar a queda de arrecadação estadual prevista com o PLP 18/2022.
As propostas dos governadores foram reunidas em um substitutivo enviado pelo Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) ao Senado.
A sugestão, contudo, encontra resistências entre os senadores.
O texto foi antecipado pelo político epbr, serviço exclusivo de informações sobre política energética da agência epbr.
Windfall tax à brasileira?
Na prática, a proposta de CSLL seria uma maneira de implementar uma espécie de windfall tax à brasileira, a partir de um tributo existente, mas de forma permanente, sempre que houver elevação da cotação internacional do barril de petróleo.
“Assim, o mecanismo de compensação não ocasionará desequilíbrio de receitas para nenhum dos três entes federativos, haja vista que o conjunto de receitas da União que financiará o fundo será compensado com novas receitas na CSLL”, defendem os governadores, no substitutivo apresentado.
Pela legislação, a criação de novos impostos só pode ser implementada no ano fiscal seguinte. Os estados sugerem uma alíquota de 30% em 2022 para toda a cadeia de petróleo e derivados — exploração, perfuração, produção, refino e importação e transporte;
Há um gatilho para reduzir o tributo para 20% a partir de 2023, caso a média de cotação internacional do Brent seja menor do que US$ 80 nos últimos seis meses.
A CSLL pode voltar a subir para o patamar de 30%, caso a média do mesmo período volte a ser maior que US$ 80 no semestre anterior.
O presidente do Comsefaz, Décio Padilha, chegou a citar, esta semana, o caso mais recente da Inglaterra.
O país anunciou uma windfall tax de 25% sobre lucros extraordinários das petroleiras, atrelados principalmente ao aumento da cotação do petróleo com a guerra na Ucrânia.
O governo federal tenta pressionar para diminuir o mecanismo de compensação aos estados, incluído originalmente na tramitação do projeto na Câmara.
Na versão do PLP 18/2022 aprovada pelos deputados, a perda de arrecadação do ICMS será compensada por meio de descontos em parcelas de dívidas refinanciadas dos estados junto à União.
O que os governadores propõem:
- O fundo: Criação da conta de compensação arrecadatória aos estados, a ser financiada com até 40% do que a União recebe de dividendos da Petrobras e royalties e participações especiais;
- Municípios na conta: As prefeituras teriam direito a um quarto do valor do fundo, que seria operacionalizado pelos próprios estados e municípios;
- Aumento da CSLL: Para compensar a perda de arrecadação da União, os estados sugerem aumentar a CSLL, de 30% em 2022, para empresas do setor de petróleo e derivados — exploração, perfuração, produção, refino e importação e transporte;
- Gatilho: A CSLL seria reduzida para 20% a partir de 2023, se a cotação do barril for menor do que US$ 80. A alíquota de 30% pode ser restabelecida nos próximos anos, no entanto, sempre que a média do barril de petróleo dos últimos seis meses for maior do que US$ 80;
- Extensão de prazo: Os estados pedem que, para energia elétrica e comunicações, a redução da alíquota de ICMS prevista no PLP 18/2022 seja gradual, com redução de ao menos 2% ao ano até alcançar os valores definidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2024 – um acordo com os estados modulou os efeitos da decisão sobre a cobrança de ICMS sobre energia elétrica e telecomunicações. O restante dos combustíveis — principalmente a gasolina, etanol e GLP — só teriam alíquotas reduzidas a partir de 2025.
Aumento da CSLL quer repor recursos para criar fundo de compensação aos estados
A proposta de aumento de impostos serviria para evitar um desfalque na arrecadação da União.
Isso porque a proposta dos estados prevê também a criação de uma conta de compensação aos estados que seria abastecida com 40% dos dividendos da Petrobras à União e dos royalties e participações especiais de exploração de petróleo.
É semelhante ao desenho feito pelo Senado Federal para uma conta estabilizadora de combustíveis no PL 1472/21, mas com o objetivo de suavizar a queda na arrecadação dos cofres públicos estaduais.
O fundo seria operacionalizado pelos estados e municípios e as prefeituras teriam direito a 25% dos recursos.
Jair Bolsonaro (PL), contudo, já manifestou que vetaria o uso de recursos da União para compensar estados pela desoneração.
Estados negociam prazo maior para novo ICMS
Outra sugestão dos estados para o relator do PLP 18/22, Fernando Bezerra (MDB/PE), é um calendário diferenciado para aplicação das novas alíquotas do ICMS a partir da aprovação da matéria.
Pedem um mês para definição dos impostos estaduais para o diesel, gás natural e transportes. O restante dos combustíveis, como a gasolina, etanol e GLP, só teriam as alíquotas modificadas a partir de 2025.
A gasolina é o combustível que deve ter maior impacto tributário com a criação do teto para o ICMS. A média do imposto cobrado pelos estados sobre o combustível é de 27,8%, segundo dados de junho da Fecombustíveis.
Para energia elétrica e comunicações, propõem uma redução gradual de ao menos 2% por ano até alcançar o valor definido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2024.
Desoneração coloca estados em colisão com governo
Com a aproximação das eleições eleitoral, o governo Bolsonaro tenta de todas as formas se distanciar da crise provocada pelos altos preços dos combustíveis. Diversas medidas já foram tomadas pelo Congresso Nacional, estados e, mais recentemente, pelo Supremo Tribunal Federal para tentar conter a inflação, sem efeitos expressivos na curva de preços.
Com o PLP 18/2022, o Comitê Nacional de Secretários de Fazenda (Comsefaz) estima que o impacto na arrecadação será da ordem de R$ 64 bilhões para os e R$ 83,5 bilhões por ano para os estados e municípios brasileiros.
“A redução desses recursos impactará diretamente a manutenção de serviços públicos, como saúde, educação e segurança pública mantidos por estados e municípios”, diz o Comsefaz.
Isso porque parte da arrecadação é transferida para os municípios e há obrigações constitucionais de gastos mínimos com saúde, educação, além de outras receitas vinculadas à políticas públicas.
“Exemplo disso é o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), financiado predominantemente por 20% da arrecadação do ICMS”, afirmam os secretários de Fazenda.
Tanto os estados, como o governo federal já realizaram de alguma forma a desoneração dos combustíveis.
- Estados congelaram os preços sobre os quais incidem o ICMS do diesel, gasolina, GLP e etanol em 2021. Medida é válida até o fim de junho e pode ser estendida.
- O governo federal zerou a tributação do GLP destinado aos consumidores domésticos em 2021, um desconto de cerca de R$ 2 por botijão. Este ano, zerou a tributação do diesel (35 centavos por litro) e do biodiesel (15 centavos por litro), com a aprovação do PLP 11/2021, em março. Vale até o fim deste ano.
O ICMS é cobrado sobre o valor dos produtos na ponta, que estão congelados desde novembro de 2021. Isto é, a arrecadação deixou de acompanhar a alta dos combustíveis.
Este ano, ao definir a nova alíquota para o diesel, os estados também congelaram a cobrança por mais 12 meses, até junho de 2023. Para outros combustíveis – gasolina, etanol e o gás de cozinha (GLP) – a base de cálculo está congelada até o fim de junho, mas os estados cogitam prorrogar.
Com a ação de Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF), a situação é incerta. Liminar do ministro André Mendonça derrubou a parte da nova tributação do diesel que faria com que o novo imposto cobrado a partir de um valor fixo de cerca de R$ 1 por litro fosse ajustado nos estados.
Medida entraria em vigor em 1º de julho.
Com a lei aprovada no Congresso Nacional em março, o governo e o mercado de combustíveis contavam com a definição de uma alíquota única nacional, na origem e fixa, independente dos preços na bomba.
Para evitar que alguns estados tivessem perdas na arrecadação, o Confaz definiu um valor alto (R$ 1 por litro), com descontos caso a caso, para adequar a nova regra à arrecadação dos estados.
Agora, o governo federal tenta forçar no STF a aplicação de uma regra alternativa prevista no PLP 11: obrigado os estados a cobrar o ICMS com base na média de preços de 60 meses, o que pelo histórico, provocaria de fato uma desoneração do diesel até o fim do ano.
Nesta quinta (2/6), é realizada uma audiência de conciliação entre governo federal, estados e o ministro André Mendonça, no STF.
Atualização: texto alterado para refletir o detalhamento da proposta de alteração da CSLL e inclusão do histórico de desonerações dos combustíveis pelo governo federal e pelos estados.