Combustíveis e Bioenergia

Bolsonaro apela para que Petrobras segure reajustes e evite "convulsão nacional"

Presidente da República diz que, ao lucrar R$ 44 bilhões no 1º trimestre, Petrobras está “abusando do povo brasileiro”

Bolsonaro, na foto, apela para que Petrobras segure reajustes e evite "convulsão nacional"
“Apelo para que contenham, diminuam um pouco o lucro abusivo que vocês têm em detrimento da população brasileira”, disse Bolsonaro durante live (Foto: Anderson Riedel/PR)

RIO — Menos de um mês após trocar o comando da Petrobras, por insatisfação com a política de preços da estatal, o presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a pressionar publicamente a petroleira e fez um apelo para que a companhia segure o reajuste dos preços dos combustíveis. Segundo ele, um novo aumento no preço do diesel poderá criar uma “convulsão social” no país.

Minutos antes de a Petrobras divulgar um lucro de R$ 44,8 bilhões no primeiro trimestre, Bolsonaro disse que a empresa está “abusando do povo brasileiro” e que a inflação dos combustíveis pode “quebrar e levar o Brasil para uma situação bastante complicada”.

“Apelo para que contenham, diminuam um pouco o lucro abusivo que vocês têm em detrimento da população brasileira”, discursou o presidente, durante live com seguidores nas redes sociais, sem mencionar que a União, controladora da companhia, é a acionista que mais recebe recursos da distribuição dos dividendos da petroleira.

Bolsonaro fez o apelo diretamente ao ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, e ao novo presidente da Petrobras, José Mauro Coelho — que tomou posse há apenas 22 dias.

“Diminua a voracidade do lucro. Acabando a guerra [na Ucrânia], que volte à normalidade, não tem problema nenhum”, completou.

A Petrobras está há 55 dias sem reajustar os preços nas refinarias, mas o valor do litro da gasolina bateu novo recorde nos postos brasileiros na semana passada, de acordo com dados da ANP. Em paralelo, no mercado global, os preços do diesel continuam em alta e a Petrobras vem praticando preços abaixo da paridade internacional — com defasagens de 17% da gasolina e 25% no diesel, segundo a Abicom, representante dos importadores privados, concorrentes da estatal no abastecimento do mercado doméstico.

Há menos de um mês no cargo, Coelho sente a pressão política logo no início de sua administração. Na quarta-feira (4/5), o presidente da Petrobras foi convidado a ir à Câmara dos Deputados prestar esclarecimentos sobre a política de preços da empresa.

Em entrevista ao Estadão, na quarta-feira, Coelho disse que seu principal desafio à frente da estatal será melhorar a comunicação da empresa com a sociedade. E negou haver qualquer pressão do governo sobre a política de preços da companhia.

“O presidente [Jair] Bolsonaro não me pediu absolutamente nada específico. Só pediu para eu conduzir a companhia”, disse Coelho, que voltou a defender a política de preços e afirmou que Bolsonaro “já entendeu muito bem a questão de preço de mercado”.

Bolsonaro critica governadores por manobra

Bolsonaro também fez críticas aos governadores e fez um apelo pela redução da cobrança do ICMS. Ele disse que os estados desrespeitaram o PLP 11/2020, aprovado no Congresso.

Após o Congresso Nacional aprovar a desoneração do ICMS do diesel S10 e S500, os estados, por meio do Confaz, definiram uma alíquota que praticamente preservou a arrecadação e a carga tributária sobre o combustível.

Entenda: o PLP 11, sancionado este ano, foi uma tentativa de o governo federal, com apoio da base, forçar a criação da alíquota única nacional de ICMS que não varia com as oscilações dos preços na bomba. Os estados, contudo, driblaram a desoneração, acatando parte da reforma, mas não a redução da carga.

decisão sobre o novo ICMS do diesel foi tomada, em março, pelo Confaz, sem apoio do governo federal. O novo modelo entra em vigor em 1º de julho.

Petrobras distribuirá R$ 48 bi em dividendos

A estatal anunciou na noite desta quinta-feira (5/5) um lucro líquido de R$ 44,8 bilhões relativo ao primeiro trimestre — um resultado 38 vezes maior que o registrado em igual período do ano passado. O balanço da companhia nos três primeiros meses do ano ainda refletem a gestão do general Joaquim Silva e Luna.

Com ganhos em praticamente todos os segmentos de negócios, a companhia teve sucesso em capturar a recuperação acentuada dos preços do petróleo, que fecharam o período em uma média de US$ 101 — a maior desde 2014. Na comparação anual, a cotação da commodity valorizou 66,5%.

Com o lucro em mãos, o conselho de administração da Petrobras aprovou a distribuição de R$ 48,5 bilhões em dividendos (R$ 3,72 por ação), relativos à antecipação da remuneração aos acionistas em 2022 e à liberação de reservas de lucros do balanço de 2021. Cerca de um terço desse valor vai para os cofres da União.

Em seu discurso de posse, Coelho repetiu a retórica das gestões passadas da empresa, ao afirmar que o foco numa administração baseada na geração de valor permite à Petrobras retornar mais renda à sociedade na forma de impostos, royalties e tributos aos governos federal, estaduais e municipais.

Ao comentar o lucro divulgado, ontem, o novo presidente da Petrobras reforçou o discurso:

“Neste trimestre, pagamos para União, estados e municípios em tributos uma vez e meia o valor do nosso lucro líquido. A Petrobras está distribuindo os frutos de sua geração de valor para a população brasileira”, escreveu, em carta aos acionistas.

José Mauro Coelho é o terceiro presidente da Petrobras no governo de Jair Bolsonaro (PL), que demitiu Roberto Castello Branco e Joaquim Silva e Luna em meio a crises desencadeadas por aumentos nos preços dos combustíveis.

A troca mais recente no comando da estatal teve como estopim o reajuste de 18,7% da gasolina e de 24,9% do diesel, anunciado em 10 de março, enquanto Bolsonaro pressionava Silva e Luna a manter os preços temporariamente congelados, na expectativa de que a cotação do petróleo começasse a ceder após o pico registrado no início da guerra na Ucrânia.

Bolsonaro sente a pressão política da inflação dos derivados. O presidente da República foi apontado em pesquisa Genial/Quaest, de abril, como o principal responsável pela inflação dos derivados no país.

Estatal registrou alta no lucro do refino

No centro das críticas do presidente Jair Bolsonaro, o segmento de refino, transporte e comercialização da Petrobras apresentou um crescimento no lucro operacional. No primeiro trimestre, os ganhos no segmento totalizaram R$ 13,5 bilhões, um aumento de 41,2% na comparação anual, mesmo com a perda de volume de vendas decorrente da alienação da Refinaria Landulpho Alves (BA), para o Mubadala.

A companhia reportou um aumento no faturamento. Apenas com a venda de diesel, principal produto comercializado pela empresa, a companhia teve uma receita líquida de R$ 38,9 bilhões, crescimento de 54,5% em um ano. Nas vendas de gasolina, o faturamento totalizou R$ 19,4 bilhões (+75%) e no gás liquefeito de petróleo (GLP), R$ 6,2 bilhões (+23).

Apesar disso, houve um recuo na lucratividade — medida pelo indicador margem Ebitda — de 16% para 13% na comparação anual.

A margem Ebitda é a razão do lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização pela receita líquida de uma empresa. O índice dá um indicativo da lucratividade operacional do negócio.

O recuo da margem Ebitda coincide com o período em que a Petrobras segurou parcialmente os reajustes, em meio ao pico do petróleo no mercado internacional. Entre janeiro e março, a empresa chegou a ficar 57 dias sem mexer nos preços nas refinarias.