RIO — Lula (PT) afirmou nesta quinta (29) que a questão dos preços dos combustíveis será um assunto a ser tratado pela nova diretoria da Petrobras. Basta, segundo o presidente eleito, “assinar” a redução dos preços.
“Basta que a mesma mão que assinou o aumento, assinasse a diminuição também. Isso vai acontecer a partir do momento que a gente montar a diretoria da Petrobras — porque ainda leva um tempo, porque tem toda uma legislação que rege as empresas estatais — e nós vamos então fazer [assinar a diminuição]”, disse Lula na cerimônia de anúncio de ministros.
Ao longo do governo Bolsonaro (PL) — com mais intensidade durante a campanha — o PT e Lula foram críticos da política de paridade de preços de importação, o PPI instituído por Pedro Parente na companhia, durante o governo de Michel Temer (MDB).
O alinhamento com preços internacionais foi aplicado de forma irregular na gestão Bolsonaro, com períodos de alinhamento e congelamento. Ainda assim, com a disparada nos mercados internacionais, os preços da Petrobras subiram consistentemente entre 2021 e 2022.
- Nesta quinta (29/12), Lula conclui o anúncio de ministros, incluindo a confirmação do senador Alexandre Silveira (PSD/MG) para o Ministério de Minas e Energia (MME).
Manter o controle de preços via Petrobras tende a abrir não apenas uma crise com o mercado financeiro, em razão de possíveis impactos no balanço e nos dividendos pagos pela companhia, mas com o mercado de combustíveis, que concorre com a estatal.
Há vidraças jurídicas, na legislação em vigor que afeta a governança da companhia, além do termo assinado com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) — o TCC do Refino — em que a Petrobras se compromete não apenas com a venda de refinarias, mas com práticas que mantenham o mercado aberto.
Nada disso impediu as fases de congelamento de preços no governo Bolsonaro, contudo. Ocorreu especialmente no período eleitoral. Antes de o cenário externo dar um alívio e a Petrobras reduzir preços no início de dezembro, o diesel chegou perto de 80 dias e a gasolina, de 100 dias sem reajustes.
Lula erra decisão sobre desoneração
No evento, Lula afirmou incorretamente que Bolsonaro “mandou uma medida provisória [e] acabou com a desoneração do óleo diesel, da gasolina, e do gás [de cozinha]”.
Logo em seguida, a informação foi corrigida pela assessoria. O futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi quem decidiu impedir a edição de uma medida provisória para estender a desoneração dos combustíveis.
Os impostos federais estão suspensos até 31 de dezembro, como parte de um conjunto de medidas tomadas pelo Congresso Federal e patrocinadas por Bolsonaro. Envolveram os cortes de ICMS, combatidos pelos estados.
Fundo para proteção de consumidores
O assunto foi ignorado pelo grupo de transição para energia, por ser tratar, na avaliação dos integrantes, de uma questão orçamentário, da Fazenda. O subgrupo recomendou endereçar novamente a criação de um fundo para proteção dos consumidores.
A proposta é colocar de pé no primeiro trimestre de 2023 a ideia que começou a ser desenvolvida no PL 1472/2021, da conta de controle de volatilidades. O Senado Federal aprovou este ano, sob relatoria de Jean Paul Prates (PT/RN).
Ele próprio, o principal cotado para presidir a Petrobras, após ter sido o coordenador do subgrupo de óleo e gás na transição.
São diversos sinais trocados
Durante a campanha, o PT sinalizou que seria preciso manter, ainda que temporariamente, a desoneração dos combustíveis. Prates busca, há meses, tranquilizar agentes do mercado que a volta do partido ao poder não significará resolver a questão na canetada.
O coordenador do grupo de energia, Maurício Tolmasquim, vinha reforçando a mensagem. Em novembro, afirmou que a política da Petrobras não era um tema nas discussões do gabinete.
“É claro que já foi anunciado durante a campanha que o governo [Lula] terá uma política de preços para o país, mas isso não afeta a política da Petrobras”, disse à CNN.
— Jean Paul Prates (@senadorjean) November 30, 2022
Na sua versão original, o projeto de lei taxava de forma progressiva as exportações de óleo, com a justificativa de criar uma fonte adicional de arrecadação quando os preços estiverem em alta e, no longo prazo, estimular o refino doméstico.
A taxa caiu; Jean Paul Prates retirou a medida de seu relatório e, nos bastidores, concordou que não seria adequado sobretaxar exportações de óleo. O fundo foi engavetado na Câmara pelo governo Bolsonaro, por iniciativa de Paulo Guedes e Arthur Lira.
Jean Paul Prates defende também outras medidas, como uma atuação maior da ANP, agência reguladora do setor, na produção de informações sobre o mercado, para subsidiar ações do governo.
Ficou para última hora
Os preços do diesel, componente do frete, afetam os preços dos alimentos, enquanto a falta de acesso ao GLP obriga a população mais pobre a correr a alternativas que colocam a vida em risco, como cozinhar com álcool ou outros combustíveis líquidos.
O GLP, aliás, começa a subir em 2019 quando o governo Bolsonaro ignora alertas que a liberalização de preços precisava vir acompanhada de uma política social, o que não ocorreu.
Escolhido em novembro para o cargo — durante a COP27, no Egito — Haddad tratou do assunto essa semana com Lula, há cinco dias da posse do novo presidente.
Uma MP chegou a ser trabalhada por técnicos do governo, a princípio com uma manutenção temporária da desoneração, de 30 a 90 dias, até Haddad decidir com Lula enterrar a prorrogação.
Haddad tem defendido que é preciso adotar uma política de corte em desonerações, a partir de um entendimento que faz parte das pactuações para uma reforma tributária a ser discutida, novamente, em 2023.
ICMS vai subir
As discussões do ICMS no STF foram acompanhadas na reta final por membros do partido, mas com pouca participação efetiva.
Uma medida tomada monocraticamente por André Mendonça, ministro nomeado por Bolsonaro, reduziu as bases de cálculo também até 31 de dezembro.
A partir de janeiro, o valor sobre o qual incidem as alíquotas da gasolina, diesel e do GLP vão subir. No segundo trimestre, entram em vigor novas regras que também representam uma elevação do tributo estadual em relação à carga atual.
A própria reforma do ICMS não foi plenamente cumprida, como prevê as leis complementares sancionadas este ano. Na disputa judicial, dezenas de ações e relatores se envolveram para, no fim, deixar a discussão para 2023.
O acordo foi mediado em uma comissão criada por Gilmar Mendes.
Mendonça, relator de outra ação, determinou diversas vezes a regulamentação do ICMS monofásico, com alíquota única no país inteiro. Esse mês, os estados editaram a regra, excluindo a gasolina, como previsto no acordo.
Ficam pendentes: a tributação da gasolina, a desoneração da energia, o destino das leis que estão em vigor e a discussão orçamentária sobre quanto caberá à União compensar os estados pelas perdas deste ano e futuras.
No fim, foi um acordo fechado entre os estados e representantes do governo que está deixando o poder, da Economia e da Advocacia-Geral da União (AGU), que assentiram, inclusive, em abdicar de recursos junto ao STF, caso trechos das leis sejam derrubados por liminares.
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