CUIABÁ — O ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF) defendeu a constitucionalidade dos trechos da Lei do Renovabio (13.576/2017) contestados pelo PRD e pelo PDT. O ministro afirmou que os partidos tentam estender ao STF debates próprios aos poderes Legislativo e Executivo.
“Diante de políticas públicas em curso, é esperado que critique os méritos e até proponha correções de rumo, mas na arena própria, e não junto ao Supremo, cuja missão deve restringir-se ao controle de constitucionalidade”, argumentou Nunes Marques. Veja a íntegra do voto (.pdf)
O julgamento em plenário virtual das ADIs 7596 e 7617, de autoria do PRD e do PDT, respectivamente, teve início nesta sexta-feira (7/11) e vai até o dia 14/11. Ambas são relatadas por Nunes Marques.
Os partidos argumentam que o programa fere o princípio da isonomia ao onerar apenas o elo da distribuição de combustíveis, que precisa cumprir com a meta de aquisição de CBIOs, e beneficia importadores e produtores de biocombustíveis.
O relator não concorda com a tese do tratamento desigual, e argumenta que o ônus da política de descarbonização recai sobre os consumidores finais dos combustíveis fósseis, uma vez que o custo com a aquisição de Créditos de Descarbonização (CBIOs) é repassado ao consumidor, no valor do combustível comercializado.
“Não procede a alegação de que os distribuidores de combustíveis fósseis foram os únicos a arcar com os ônus da política de descarbonização desenhada pelo RenovaBio”, afirma Nunes Marques.
“Por óbvio, os desembolsos com a aquisição dos CBIOs são repassados ao consumidor final. A partir dessa insofismável premissa é possível afirmar que os ônus foram verdadeiramente endereçados aos usuários, pois serão eles a suportar o aumento do preço da gasolina associado ao encarecimento da distribuição do combustível”, completa.
Ele faz a ressalva de que a majoração dos preços em virtude das flutuações no mercado dos CBIOs deve estar submetida a constante calibragem. Nesta semana, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) arquivou um inquérito sobre possível infração à ordem econômica nas negociações de CBIOs em 2022.
Ao questionarem o programa, os partidos afirmam que ele desrespeita o princípio do poluidor-pagador, ao transferir todo o ônus aos distribuidores, que são responsáveis por 0,39% da emissão total de Gases do Efeito Estufa (GEEs) no ciclo do poço à roda.
Para o relator, o percentual de emissões do setor não guarda relação com o ônus do programa.
“Ocorre que os CBIOs, por intermédio dos quais deverá ser comprovado o cumprimento das metas individuais de descarbonização, não equivalem às multas ou indenizações aplicadas aos poluidores do ar. Exatamente por isso as metas de descarbonização e os valores dos CBIOs não devem guardar proporção com o apontado percentual de 0,39%”.
O relator defendeu, assim, a constitucionalidade da lei do Renovabio e sua importância no contexto de crise climática.
“O debate sobre o RenovaBio precisa gravitar em torno das graves questões climáticas que têm deixado o mundo em alerta. Há que descolar a discussão de preocupações puramente mercadológicas, mormente porque não caracterizado, na espécie, qualquer indício de desrespeito aos núcleos dos direitos e garantias fundamentais”.
Novas penalidades são endossadas
O relator também defendeu as novas penalidades previstas na Lei 15.082/2024 em relação ao descumprimento das metas do RenovaBio. O PRD aditou seu pedido inicial para incluir o tema na ADI. Para Nunes Marques, a medida é “salutar à concorrência”.
“Os inadimplentes nos pagamentos para aquisição de CBIOs, em relação aos distribuidores de combustíveis fósseis que cumprem a política do RenovaBio, criam vantagens econômicas ilegais na formação de seus preços, prejudicando a concorrência justa no setor”.
“Por outro lado, o art. 9º-C, caput, atribui a penalidade de revogação da autorização não a qualquer distribuidor inadimplente, mas àquele que reincidir na inadimplência. A medida é razoável e proporcional, porquanto não obsta, depois de regularizadas as metas inadimplidas, a obtenção de nova autorização”, avalia.
Caráter político-partidário da ação
O ministro ainda criticou o caráter político-partidário das ações. Na inicial, protocolada em abril do ano passado, o PDT afirmou que o Renovabio “Foi produto da interlocução direta de agentes econômicos do setor sucroalcooleiro com autoridades públicas, inclusive o então titular do Ministério de Minas e Energia (MME)”.
Nunes Marques afirmou que a sigla não apresentou provas para subsidiar seu argumento. “Diante da ausência de elementos probatórios, e apenas por ilação, não se pode concluir que agentes públicos tenham atuado com abuso de poder ou desvio de finalidade”.
Seguindo a mesma lógica, o ministro sugeriu que a mesma acusação poderia ser direcionada ao partido. “Fosse assim, estaria também autorizada a conjectura de que o PDT, dissimulando preocupação com o meio ambiente, em verdade esgrime junto ao STF para defender os interesses dos distribuidores de combustíveis fósseis”.
