NESTA EDIÇÃO. Campanha que começou por Europa e EUA desembarca no Brasil em busca de protagonismo para caminhões e ônibus elétricos na descarbonização dos transportes.
Grupo vai enfrentar lobby do agro na COP30.
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Organizações da sociedade civil lançaram uma coalizão em defesa de políticas públicas para dar tração à eletrificação de veículos pesados no Brasil — um movimento em resposta à preferência declarada do governo brasileiro pelos biocombustíveis.
Com a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) entre as articuladoras, a iniciativa Gigantes Elétricos se prepara para levar a agenda da eletromobilidade à COP30, marcada para novembro em Belém (PA).
A estratégia é disputar o mercado de ônibus e caminhões a diesel, onde hoje biodiesel, biometano, diesel verde e coprocessado se propõem a deslocar o consumo de combustível fóssil.
E, com isso, comprar uma briga com o agronegócio.
“Quando se fala de biocombustíveis para os caminhões, tem um item nesse debate: a soja. Por mais que existam iniciativas para exploração em terras degradadas, o que a gente vê realmente é a expansão nos biomas brasileiros”, aponta Clemente Gauer, diretor de Segurança da ABVE.
“Além disso, os fertilizantes, o transporte, toda a cultura desse biocombustível é dependente de combustível fóssil”, critica.
A Gigantes Elétricos é parte de um movimento internacional com presença na Europa (lobista da eletrificação) e nos Estados Unidos para pressionar a transição de montadoras.
No Brasil, fazem parte a Rede GTA (Rede de Trabalho Amazônico), Associação Brasileira de Proprietários e Usuários de Veículos Elétricos e Inovadores (ABRAVEi), Conselho Global de Comunicação Estratégica (GSCC) e The Sunrise Project.
Sétimo maior produtor de caminhões do mundo, o Brasil transporta cerca de 65% da sua carga por rodovias, com um consumo anual de mais de 67 bilhões de litros de diesel B (fóssil + biodiesel).
Por ter uma matriz elétrica 88% renovável, a Gigantes Elétricos estima que o país poderia ter operações até 76,5% mais baratas em comparação com os caminhões movidos a diesel.
Falta, no entanto, apoio político e sinal de mercado para desenvolver infraestrutura de recarga nos corredores logísticos e incentivar a transição entre os transportadores.
Em entrevista à eixos, Gauer, que também é diretor da ABRAVEi, explica que o movimento busca um arcabouço regulatório que atraia investimentos nessas áreas, além de permitir a competição de ônibus e caminhões elétricos com seus similares à combustão.
Na visão do grupo, a principal política de incentivos ao setor automotivo no Brasil, o programa Mobilidade Verde (Mover), da forma como está, não traz vantagens competitivas para os caminhões elétricos.
“Nosso objetivo é realmente criar condições de regulações públicas. Eventualmente, alterações no Mover para que os veículos elétricos possam disputar não só os mercados de nicho, como vem sendo explorado hoje, que é o da última milha, mas todos os demais”, comenta.
Competição com bio
Desenvolvimentos no mercado de baterias nos últimos anos estão reduzindo os preços e aumentando a eficiência, o que permitiria à eletrificação competir com os biocombustíveis e tornar o frete mais barato, segundo a coalizão.
Do ponto de vista tecnológico e de eficiência, o diretor da ABVE aponta que baterias livres de cobalto, níquel e manganês, chamadas LFP, já usadas no transporte público permitem uma queda significativa nos custos, além de durar até três vezes mais que as que dominavam o mercado até pouco tempo.
A aposta maior nos biocombustíveis também é encarada como uma forma de prolongar a vida da combustão, na contramão de rotas adotadas em grandes mercados como Europa, China e Estados Unidos (apesar de Trump).
O grupo rebate ainda o argumento de que as características continentais do Brasil inviabilizam a eletrificação pesada.
Segundo Gauer, cerca de 80% da carga transportada aqui percorre trechos de no máximo 300 quilômetros, o que permitiria uma penetração maior dos caminhões elétricos na frota.
“É importante entender que a maior parte do transporte de carga no Brasil não é continental. A maior parte dele é regional. Nós não acreditamos em uma solução única. Estamos advogando para que existam mais opções, e a eletromobilidade é uma delas”, defende.
Cobrimos por aqui
Curtas
Biocombustíveis e COP. Também de olho na COP30, a ONG Repórter Brasil lançou um relatório sobre os custos sociais e ambientais da bioenergia. Desmatamento, trabalho escravo e conflitos fundiários são algumas questões que ainda mancham a reputação do setor e demandam resposta rápida do poder público.
- A conta dos biocombustíveis (.pdf) traz recomendações de salvaguardas para abordar essas questões, como a implementação de sistemas eficazes de rastreabilidade nas cadeias de fornecimento.
Mais bio. O MME criou um subcomitê para avaliar a viabilidade de misturas de 25% de biodiesel no diesel e 35% de etanol na gasolina. O grupo vai coordenar estudos e propor medidas para a regulamentação e implementação da lei do Combustível do Futuro. Os trabalhos começam pelo biodiesel.
Plano integrado. A EPE prorrogou a consulta pública do Plano Nacional Integrado das Infraestruturas de Gás Natural e Biometano (PNIIGB) para 7 de novembro. O plano reúne 13 projetos considerados prioritários para ampliar a oferta de gás natural e biometano, além de mitigar gargalos e expandir a malha integrada de gasodutos no país.
Crise dos semicondutores. O governo brasileiro negocia prioridade na compra da produção restante de semicondutores chineses em meio à crise geopolítica, segundo o secretário de Desenvolvimento Industrial do MDIC, Uallace Moreira. Caso não haja uma solução rápida, algumas montadoras podem paralisar em até três semanas.
Inabilitadas no A-5. A Aneel inabilitou a PCH Guarani, da Guarani Geração de Energia, em Santa Catarina, por descumprir o requisito de índice mínimo de liquidez geral exigido no edital do leilão de energia nova A-5. A PCH Ribeirão Bonito, da Rio Turvo Energética, no Paraná, também foi desabilitada por conta de uma decisão judicial.
UHE Três Irmãos. A Axia Energia, novo nome da Eletrobras, anunciou, nesta quarta-feira (29/10), que comprou o restante da participação na Tijoá Energia. O acordo no valor de R$ 247 milhões prevê a aquisição de 50,1% da concessionária responsável pela UHE Três Irmãos, no rio Tietê (SP). Com o acordo, a Axia Energia passará a consolidar 100% da usina de 808 MW.
Expansão nuclear. O governo dos Estados Unidos e os controladores da Westinghouse fecharam um acordo de US$ 80 bilhões para a construção de um complexo de reatores nucleares, usando recursos de um acordo comercial com o Japão. (Financial Times/Valor)
Edital para transição justa. Termina no dia 7 de novembro o prazo para entidades sem fins lucrativos se inscreverem no edital Energia Solidária da EDP. A companhia prevê destinar até R$ 500 mil a projetos que apresentem soluções relacionadas ao Acesso à Energia, à Eficiência Energética e ao Combate à Pobreza Energética.

