Carbono Oculto

Justiça do Rio acata pedido de recuperação judicial da Rodopetro, alvo da Carbono Oculto

Defesa da distribuidora também pediu para suspender a apresentação da guia de recolhimento de tributos e do comprovante de pagamento de ICMS para o estado de SP, o que foi negado

Justiça do Rio acata pedido de recuperação judicial da Rodopetro, alvo da Carbono Oculto

BRASÍLIA — A Justiça do Rio de Janeiro acatou o pedido de recuperação judicial da Rodopetro (veja a decisão), alvo de mandados de busca a apreensão na Operação Carbono Oculto. A solicitação foi feita na quarta-feira (10/9) e aceita nesta quinta pela juíza Maria Izabel de Araújo, que assina a decisão.

A Rodopetro e outras distribuidoras ligadas a ela, que estavam instaladas no polo de Iguatemi (MS), são alvo da investigação do Ministério Público de São Paulo (MPSP) sobre os elos de facção criminosa instalada no mercado de combustíveis com o PCC.

Nesta semana, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) interditou uma “base fantasma” de distribuição de combustíveis em Iguatemi. Das 24 empresas que utilizavam o local como “barriga de aluguel”, oito são investigadas pela Carbono Oculto.

Entre elas está a Alpes, que compartilha endereço com a Safra e integra o conjunto de distribuidoras vinculadas à rede Rodopetro, que por sua vez, é ligada à Refinaria de Manguinhos (Refit).

Na petição, além de pedir o deferimento da recuperação judicial, a Rodopetro pediu a suspensão da apresentação da Guia Nacional de Recolhimento de Tributos Estaduais (GNRE) e do comprovante de pagamento do ICMS em favor do estado de São Paulo. Também solicitou a suspensão de todas as ações e execuções existentes contra a empresa.

Procurada, a Rodopetro não se manifestou até o fechamento da reportagem. O espaço segue aberto para o posicionamento da empresa.

Dívida de R$ 183,4 milhões

A agência eixos teve acesso à lista de credores da Rodopetro, entre os quais constam empresas associadas ao grupo, como a Refit e a distribuidora de Manguinhos, a Império, a 76 Oil, a Flagler e Direcional. A dívida total soma R$ 183,4 milhões, sendo a Refit a maior credora, com R$ 57 milhões.

A Justiça concordou com o pedido de recuperação judicial e a suspensão de ações e execuções contra a Rodopetro por 180 dias. A suspensão da exigência da GNRE e do comprovante de pagamento do ICMS ao estado de São Paulo, no entanto, foi negada. A decisão considerou haver uma “pretensão genérica de resguardar fato futuro e eventual”.

A Secretaria de Fazenda de São Paulo começou a cobrar solidariamente os clientes que compram de distribuidoras de combustíveis devedoras de ICMS. Em agosto, antes da operação Carbono Oculto, a Sefaz/SP emitiu R$ 210 milhões em autos de infração para cobrar de clientes o imposto devido por distribuidoras.

O entendimento da Sefaz/SP é que os clientes dessas empresas passam a ser citados nos autos de infração como devedores solidários e poderão responder a processos de execução fiscal.

A depender do caso, podem ser responsabilizados por ilícitos tributários, em razão da falta de pagamento de imposto.

“Petrobras beneficia as grandes”

Os advogados da empresa citam que o mercado de fornecimento de combustível do Brasil é dominado 80% pela Petrobras, restando os outros 20% provenientes de importação ou produção de pequenas empresas.

Cita, ainda, que a estatal destina a maior parte do volume às majors: Shell, Ipiranga e Vibra, em detrimento de outros agentes econômicos. Afirma também que a Petrobras não fornecia volumes significativos e que, por isso, recorria a importadores e pequenos produtores.

Um executivo do mercado de combustíveis disse à eixos, sob reserva, que a questão da competição com a Petrobras é “balela” e que a companhia não pratica preço diferenciado entre distribuidoras, apenas impõe a mesma política por polo de abastecimento.

Segundo ele, caso houvesse a prática de beneficiar uma empresa em detrimento de outra, isso já teria sido questionado junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o que nunca ocorreu.

Quanto ao pedido de suspensão da comprovação do pagamento de imposto, a fonte afirmou se tratar apenas de um mecanismo para combater a sonegação de imposto, que está sendo tratado como se fosse uma dupla cobrança de ICMS do modo como foi pedido à Justiça.

Denúncia e operação policial

A Rodopetro compõe um conjunto de empresas ligadas ao grupo Manguinhos implicadas na operação Carbono Oculto, deflagrada pela Polícia Federal, com o apoio da Receita Federal, que mira ligações de facção criminosa que atua no setor de combustíveis com o PCC.

O Ministério Público de São Paulo (MPSP) aponta que, após a revogação das autorizações da Aster e da Copape, em julho de 2024, o mercado da Aster (que atuava no elo da distribuição, enquanto a Copape agia na formulação), foi absorvido pela Rodopetro.

Segundo o MP, a empresa do grupo Manguinhos “praticamente dobrou suas aquisições para poder englobar as operações do grupo Aster/Copape” e assumiu o papel da distribuidora comandada por Mohamad Hussein Mourad

O MPSP também aponta que outras as empresas Império, Maximus, Estrela, Orizona, Start, Port Brasil, Alpes, Arka, Everest e VMR operam como empresas de fachada e também estão sob investigação.

A denúncia aponta que muitas delas compartilham a mesma sede, capital social idêntico e foram constituídas em períodos próximos, “sugerindo atuação concentrada e possível formação de cartel”, conforme a denúncia.

Esquema criminoso bilionário

A Polícia Federal cumpriu, no dia 28 de agosto, mais de 200 mandados de busca e apreensão contra 350 alvos em dez estados contra envolvidos no domínio de toda a cadeia produtiva da área de combustíveis, parte da qual foi capturada pelo Primeiro Comando da Capital (PCC).

As investigações apontam para uma dezena de práticas criminosas, desde crimes contra a ordem econômica, passando por adulteração de combustíveis, crimes ambientais, lavagem de dinheiro — inclusive do tráfico de drogas —, além de fraude fiscal e estelionato.

A Receita Federal estima que a organização criminosa alvo da Operação Carbono Oculto tenha movimentado, só entre 2020 e 2024, um total de R$ 52 bilhões em postos de combustível por meio do recolhimento de tributos em volume muito baixo e incompatível com suas atividades, provocando perdas de R$ 8,6 bilhões para os cofres públicos.

Os auditores do órgão detectaram a ação de 40 fundos de investimentos usados para blindar e investir os recursos do grupo cujo patrimônio estaria avaliado em R$ 30 bilhões.

Agenda legislativa e regulatória avança após operação

Depois da mega operação, projetos de lei que visavam combater fraudes no setor de combustíveis e que estavam parados no Congresso Nacional ganharam prioridade da agenda legislativa.

Desde a deflagração da Carbono Oculto, o Senado aprovou o projeto que tipifica o devedor contumaz e a Câmara dos Deputados aprovou o aumento da pena para furto de petróleo e derivados em dutos, estendendo o aumento da punição também aos receptadores.

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