Primeiras impressões e o que diz a proposta de tributação do RenovaBio

Em cerca de 30 minutos, Senado votou RenovaBio e a MP do Repetro (foto: Senado Federal)
Em cerca de 30 minutos, Senado votou RenovaBio e a MP do Repetro (foto: Senado Federal)

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Diálogos da Transição

apresentada por

Quem faz
Felipe Maciel, Gabriel Chiappini, Guilherme Serodio e Larissa Fafá
Editada por Gustavo Gaudarde
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As primeiras impressões sobre a tributação do RenovaBio, incluída na MP do Agro

A MP 897/19 teve seu texto-base aprovado esta semana na Câmara dos Deputados e, graças a inclusão de uma artigo no relatório elaborado por Pedro Lupion (DEM/PR), avançou o tema da tributação do RenovaBio.

Ainda pode mudar. Os deputados precisam concluir a votação e enviar o texto para o Senado. Mas além da força do projeto, que recebeu 329 votos favoráveis, a tributação dos créditos de descarbonização (CBIOs) não está entre os temas que impediram a conclusão da votação – são dez destaques, que devem ser votados semana que vem.

Entre parlamentares ligados ao tema, produtores de biocombustível e no Ministério de Minas e Energia (MME), há um entendimento que foi dado um passo importante para a operacionalização do RenovaBio – o risco era o tema ficar isolado em um projeto de lei próprio, afastado das prioridades do Congresso, ou ainda pior, depender da reforma tributária.

E é também um passo na direção correta, defendem deputados ligados aos produtores, pois reduz o custo de transação para o emissor dos créditos (produtores e importadores de biocombustíveis) ao propor uma alíquota de 15% sobre o valor da emissão inicial.

“Seria incongruente se [o país] tributasse a retirada de carbono da atmosfera. Se a gente consegue abrir para o mercado internacional, se um consumidor fora do sistema compra o CBIO, estamos reduzindo preço do combustível para o consumidor brasileiro”, defendeu Miguel Ivan Lacerda, diretor do Departamento de Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME), à epbr.

Na Câmara, Jerônimo Goergen (PP/RS) chegou a distribuir esta semana uma carta pedindo apoio dos deputados à votação da MP do Agro, com destaque para a questão dos crédito. O deputado é presidente da Frente Parlamentar Mista do Biodiesel

“Destaco a regulamentação sobre CBIOs, instrumento criado na aprovação do RenovaBio, que busca a valorização das externalidades positivas dos biocombustíveis e possibilitará ao Brasil ter uma matriz energética diversificada e das mais limpas no contexto internacional”, afirmou.

Já no mercado, há uma certa cautela, afinal o assunto não está sacramentado. A tributação especial proposta não abrange as distribuidoras de combustível e há dúvidas quanto a interpretação do artigo.

“O valor exato da alíquota é sempre objeto de debate. Assim, prefiro não opinar na dimensão da alíquota. Entretanto, o fato de haver uma alíquota definida, consolida a natureza jurídica do CBIO e permite que ele dê mais um passo para que possa ser transacionado. Haver uma alíquota definida é extremamente positivo”, comentou Felipe Bottini, sócio-fundador da Green Domus, que atua na certificação de produtores.

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Mas afinal, o que diz a MP do Agro?

A pedido da epbr, o sócio da área de Direito Tributário no escritório Barbosa, Müssnich, Aragão (BMA), Hermano Notaroberto Barbosa, analisou o art. 61 da MP 897/19, que regulamenta a tributação dos CBIO.

Em linhas gerais, a proposta é tributar os emissores em 15% sobre o valor da renda com a comercialização dos créditos. Regra vale até dezembro de 2030, mesmo prazo estipulado para o RenovaBio. Hermano Barbosa explica:

Qual seria a tributação, sem legislação específica
Como não existem regras tributárias especiais para operações com créditos de descarbonização (os CBIO), o regime fiscal da emissão e comercialização desses certificados resulta da aplicação das regras gerais tributárias.

Assim, os tributos deveriam incidir sobre o ganho apurado na venda do CBIO, considerando, naturalmente, os custos incorridos para a emissão ou aquisição desses certificados. Esse ganho compõe o lucro tributável da empresa que, uma vez apurado, está sujeito ao imposto de renda (IRPJ) e à contribuição social sobre o lucro (CSLL) cuja alíquota combinada é de 34%.”

O que muda com a proposta da MP 897, se aprovada
Ao invés da tributação normal dos ganhos eventualmente apurados na venda dos créditos, na forma acima, optou-se por uma tributação exclusiva na fonte (IRRF), à alíquota de 15%, vedada a dedução de perdas apuradas na comercialização.

Essas novas regras também se aplicariam a qualquer pessoa, física ou jurídica, que realizasse “sucessivamente” a compra e venda de CBIO. Ficam de fora das novas regras, portanto ainda sujeitas ao regime geral de tributação normal de ganhos, os distribuidores de combustíveis e, por exclusão, as pessoas que realizem a compra e venda de CBIO em operações que não sejam “sucessivas”.

As dúvidas e soluções
Esta última definição sobre o que seriam operações “sucessivas” ainda pode gerar dúvidas e discussões. Além disso, embora a lógica das novas regras seja de uma tributação apenas sobre a receita, sem tributação sobre ganhos, esta última parte (não tributação de ganhos) ainda é fruto de interpretação da lei. Por mais lógica e justa que ela seja, seria muito salutar esse esclarecimento, seja na própria lei ou em sua futura regulamentação.

De modo geral, as novas regras podem ser favoráveis para os emissores, por substituírem uma tributação integral dos ganhos apurados, à alíquota combinada de 34% (IRPJ/CSLL), por uma tributação única na fonte de 15% sobre as receitas de venda dos CBIO. Ainda assim, é preciso cuidado porque a vantagem fiscal do novo regime para o emissor pode não ocorrer sempre.

Por exemplo, emissores que apurem prejuízo no conjunto de suas atividades, e que portanto não teriam um incremento de sua tributação ao apurarem lucro na venda de CBIO, se veriam na situação indesejável de terem uma receita tributável pelo IRRF à alíquota de 15% do preço bruto de venda dos certificados, enquanto a recuperação fiscal das despesas administrativas ou financeiras relativas à emissão, por meio de sua dedução na apuração do IRPJ e CSLL, seria postergada para o futuro e sujeita a limitações.

Uma solução possível e bem-vinda para o projeto de lei seria tornar esse regime especial opcional para os emissores de CBIO. A legislação tributária federal tem inúmeros exemplos de regimes fiscais especiais que são optativos e este poderia ser mais um caso.

Não se pode descartar, inclusive, os riscos desse modelo alternativo de tributação ter sua constitucionalidade questionada, sob o argumento de que estabeleceria uma tributação sobre patrimônio, e não sobre a renda. Esse risco também seria eliminado se o novo regime passasse a ser opcional para todos.

E sobre a diferenciação exclusiva para os emissores…
É natural que as novas regras de tributação tenham se voltado para o emissor dos certificados, pois são esses que o legislador quis incentivar, e não para os intermediários de sua comercialização.

Por outro lado, quando substituem a tributação dos ganhos pela taxação da receita, as novas regras podem impactar a formação de um mercado secundário de negociação dos CBIO, já que tais operações apenas passariam a fazer sentido se a margem obtida pelo intermediário fosse superior a 15%.

Segundo a redação aprovada pela Câmara dos Deputados, as novas regras não se aplicam aos distribuidores de combustível, caso eles próprios comercializassem CBIO. Nessas operações, eles permaneceriam sujeitos às regras fiscais gerais, que implicam na tributação de eventual ganho obtido na operação, às alíquotas normais de referidos tributos.

Curtas do PDE 2029

Saiu o Plano Decenal de Energia (PDE) 2029 e na versão final do estudo, produzido pela Empresa de Pesquisas Energética (EPE), foi incluído um capítulo adicional, considerando um cenário bem-sucedido para a políticas do Novo Mercado de Gás – a iniciativa do governo, com a Petrobras e estados, para abrir o mercado.

Em epbr, destacamos que a redução do preço do gás pode adicionar R$ 43 bilhões em investimentos para ampliar a infraestrutura de produção, movimentação e importação de gás natural.

Com efeito no consumo. Considerando apenas o cenário de referência, a expansão da demanda não-termelétrica de gás é estimada em 8,8 milhões de m³/dia, para 66,5 milhões de m³/dia…

… Com o Novo Mercado de Gás, a EPE adiciona 16,8 milhões de m³/dia, totalizando 83,3 milhões de m³/dia. Isso é, principalmente, expansão do consumo industrial, se o preço do gás cair como esperado, com reflexo em todo o conjunto da economia.

No CanalEnergia, destaque para a aposta na geração termoelétrica. As renováveis – hidrelétricas de grande e pequeno porte, eólicas, solares e termelétricas a biomassa – responderão por 80% da matriz elétrica, enquanto as térmicas, incluindo carvão, sobem de 14% em 2019 para 18% em dez anos.

O estudo considera também a geração termonuclear como uma “opção natural”. No EstadãoGoverno indica pela 1ª vez no Plano Decenal de Energia possíveis novas usinas nucleares no BrasilDocumento tem um capítulo dedicado à fonte.

Aliás,o ministro Bento Albuquerque afirmou à agência Infra que a discussão no governo para retomada das obras de Angra 3 envolve injeção de recursos da União na Eletronuclear para capitalizar o projeto e aumentar a atratividade de uma sociedade de propósito específico, com entrada de sócio privado ou internacional.

O PDE 2029 também traz uma perspectiva de transição. Ainda que receba investimentos volumosos, estimados em R$ 1.9 trilhão no setor de óleo, os derivados perderão espaço no consumo final de energia, caindo dos 38,4% atuais para 36,2% em 2029. Já o gás natural deve aumentar sua participação, de 7,7% para 8% no período

Por fim, previsão é que o Brasil atingirá 11 GW instalados de capacidade a partir da micro e minigeração distribuída em 2029, com 1,3 milhão de clientes em todos os estados, o que representará cerca de 2,3% da carga total do sistema nacional, no final da década.

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