Por Guilherme Serodio e Gustavo Gaudarde
Eleitor declarado de Jair Bolsonaro (PSL) no segundo turno destas eleições, Rubens Ometto financiou, ao menos, 54 candidatos, de 14 partidos diferentes. Até o momento, ajudou a eleger 25 políticos, entre parlamentares federais e estaduais e governadores, como Ronaldo Caiado (DEM), que já venceu a disputa pelo governo de Goiás.
Na Câmara Federal, Ometto ajudou a pagar pela campanhas de 28 candidatos, 15 deles eleitos. Se fossem todos de um partido, essa bancada que contou com recursos do empresário seria a 12ª maior da Câmara, na frente de boa parte das siglas do Centrão, como Solidariedade, PTB, Pros e PSC.
Rubens Ometto é o maior financiador individual destas eleições – doou R$ 7,030 milhões, de acordo com dados disponíveis até a manhã desta segunda-feira (15). Em entrevista ao Brazil Journal, afirmou que votará em Bolsonaro na disputa com Fernando Haddad (PT) e que votou, no primeiro turno, em Geraldo Alckmin (PSDB), que não decolou.
Ometto é controlador da Cosan, empresa sócia da Shell na distribuidora Raízen, e entrou na lista de bilionários da Forbes em 2010 – o primeiro do setor de etanol.
Procurado pela epbr, a assessoria de Ometto informou apenas que “as doações eleitorais foram realizadas em caráter pessoal e seguem as regras estabelecidas pelo Tribunal Superior Eleitoral e demais normas aplicáveis”.
Em uma breve análise, na entrevista ao Brazil Journal, Ometto resume a sua visão do cenário político brasileiro: empresários precisam participar da política, com “críticas construtivas”; a esquerda (em referência ao PT) “avançou em algumas áreas e errou demais em outras, na economia e na corrupção”.
Na prática, Ometto financiou as eleições de duas formas: por meio de partidos de centro, que tradicionalmente participam dos governos independe de posições ideológicas; e, na escolha de candidaturas individuais, o empresário reflete sua preferência por partidos de centro-direita, como o PSDB, sem deixar de lado opositores de centro-esquerda, como PDT, PT e PSB, por exemplo.
Isso considerando, claro, o espectro ideológico tradicional da política brasileira, deslocado com a ascensão da direita bolsonarista, que vai provocar um reposicionamento desta janela. Para Bolsonaro (e parte de seus apoiadores), os partidos tradicionais “são todos de esquerda”.
De lulistas a Bolsonaro
Ao menos com o bolso, as visões de Ometto são menos polarizadas. As doações beneficiaram 14 diferentes partidos, o principal sendo o PSDB, de Alckmin, com R$ 1,55 milhão. O DEM e o PP, partidos que fecharam coligação, ainda que fragmentada nas bases, com a campanha tucana, receberam R$ 1,3 milhão e R$ 1 milhão, respectivamente. Veja a lista completa no fim da matéria.
O PT de Haddad, por sua vez, recebeu R$ 300 mil, o PDT, de Ciro Gomes, R$ 100 mil. O PSB, que entre Haddad e Ciro negociou com o PT uma neutralidade, para o primeiro turno teve candidaturas financiadas por Ometto com R$ 230 mil.
O empresário do etanol apoiou apenas um candidato do PSL, de Bolsonaro: Tenente Nascimento, eleito deputado estadual em São Paulo com 45 mil votos, que recebeu de Ometto R$ 50 mil dos R$ 77 mil declarados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Mas há um detalhe: apesar do discurso ideológico, o maior “cheque em branco”, isto é, doações para diretórios de partidos que podem ir para quaisquer candidaturas, foi doado ao MDB, de Henrique Meirelles, Romero Jucá, Renan Calheiros e Requião, para citar alguns.
Há, entre os emedebistas, quem apoie a libertação de Lula, outros querem um país governado por Bolsonaro. O MDB recebeu R$ 1,25 milhão do empresário, sendo R$ 600 mil para diretórios do partido.
Com voto declarado em Alckmin (agora, em Bolsonaro), Ometto doou para campanhas de três petistas e dois foram eleitos deputados federais, Arlindo Chinaglia e Carlos Zarattini. Quatro nomes do PSDB para a Câmara Federal, financiados em parte por Ometto, foram rejeitados nas urnas.
Entre os bolsonaristas, destaque para Onyx Lorenzoni (DEM/RS), que recebeu R$ 200 mil do empresário. Distante da cúpula do seu partido nos últimos anos, o deputado é um dos coordenadores da campanha de Bolsonaro e apontado como principal articulador do candidato no Congresso – foi confirmado por Bolsonaro como seu futuro ministro da Casa Civil, caso ganhe a eleição.
Considerando apenas repasses para diretórios partidários, Ometto doou R$ 600 mil para o MDB, R$ 300 mil para o PSDB e R$ 200 mil, cada, para PP, PTB e PSB.
A “bancada Ometto” e o setor sucroalcooleiro
Apesar do discurso ideologicamente alinhado com a centro-direita, o empresário seguiu na lógica de suas doações um caminho mais tradicional: beneficiou de forma abrangente candidatos influentes nas áreas de atuação de suas empresas tanto à direita quanto à esquerda. Com R$ 2 milhões, Ometto ajudou a eleger 15 deputados federais, de sete partidos.
As doações mostram uma preferência a nomes envolvidos com o setor sucroalcooleiro e de energia. Ometto doou o mesmo valor (R$ 50 mil) para a líder da bancada ruralista, deputada reeleita Tereza Cristina (DEM/MS), e para o ex-ministro de Minas e Energia do governo Temer, Fernando Bezerra Coelho Filho (DEM/PE), também reeleito. Nilson Leitão (PSDB/MT), antigo líder da bancada ruralista que concorreu, sem sucesso, ao Senado recebeu R$ 100 mil.
Arlindo Chinaglia (PT/SP) recebeu R$ 100 mil do empresário. O deputado reeleito foi um dos maiores opositores no Congresso à privatização da Eletrobras e suas subsidiárias, enviando dezenas de requerimentos à comissão especial criada para analisar a proposta de privatização da companhia. Chinaglia também ajudou a articular a aproximação entre os parlamentares da oposição e governadores que se posicionaram contra a venda.
Outro parlamentar do PT, Carlos Zarattini (PT/SP) também recebeu R$ 100 mil em doações de Ometto. O PT foi em peso contra a proposta de venda direta de etanol de refinarias para os postos, projeto que ganhou visibilidade em junho deste ano após a greve dos caminhoneiros, mas que agradava apenas parte do setor sucroalcooleiro, nominalmente os industriais do nordeste do país.
Vale também para o governador eleito em Goiás, Ronaldo Caiado, do DEM, que atualmente é senador e atuou contra a venda direta do etanol. Caiado recebeu R$ 100 mil em doações de Ometto.
Por sinal, São Paulo, maior estado produtor de cana-de-açúcar, é onde estão 22 dos 54 políticos com recursos doados por Ometto. Inclusive, chama atenção o interesse pela Assembleia Legislativa de São Paulo: Ometto ajudou 13 candidaturas de deputados estaduais, nove delas em São Paulo, duas no Rio, uma em Roraima e uma em Santa Catarina.
Em São Paulo, também há recursos destinados para Paulo Skaf, que tentou o governo pelo MDB, mas perdeu. Márcio França (PSB) e João Dória (PSDB), concorrem no segundo turno. Para Mara Grabilli, Ometto doou R$ 100 mil. A deputada estadual, agora eleita Senadora pelo PSDB apoia Dória e Bolsonaro – é o eixo bolsonarista no berço do tucanato.
Dória, inclusive, tem tentado se aproximar cada vez mais de Bolsonaro, uma estratégia de conquista de votos que deu resultado no primeiro turno, a exemplo das viradas de Zuma (Novo) e Wilson Witzel (PSC), que lideraram em Minas Gerais e no Rio as disputas de governador, após usarem os últimos debates televisivos para declarar apoio ao capitão reformado do PSL.
No Paraná, estão cinco dos 54 políticos parcialmente financiados pelo controlador da Cosan. O estado também é um grande produtor de cana-de-açúcar e onde a indústria mantém um importante lobby.
Sergio Souza (MDB/PR), que veio candidato ao Senado, recebeu R$ 200 mil em doações de Ometto. O político foi presidente da Frente Parlamentar pela Valorização do Setor Sucroenergético na atual legislatura. No segundo mandato de Dilma, quis o aumento da Cide de R$ 0,10 para R$ 0,60 por litro de gasolina, para ajudar a recuperar a produção de etanol. Na época, afirmou que a medida era necessária para “estancar o fechamento de usinas ao redor do Brasil”.
Pedro Lupion (DEM/PR), destinatário de R$200 mil em doações, é deputado estadual e presidente da comissão de Agricultura da Assembleia Legislativa do Paraná na legislatura atual.
O ex-ministro da Saúde Ricardo Barros (PP/PR) recebeu R$ 200 mil. Sob seu comando, o Ministério da Saúde, pretendia, em 2017, apresentar ao governo uma proposta para aumentar imposto para bebidas açucaradas, seguindo uma recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Na mesma época, Ricardo Barros discutia com a indústria um acordo para reduzir a quantidade de açúcar em alimentos processados. A proposta foi apresentada pelo ex-ministro no Ethanol Summit — evento promovido pela Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar).
A promessa de aumentar a tributação das bebidas com açúcar não foi adiante. Mas uma proposta de conteúdo semelhante tramita na Câmara dos Deputados. Apresentado pelo deputado Paulo Teixeira (PT/SP), o PL 8541/2017 cita estudos do Ministério da Saúde de 2016, mas não contou com apoio do governo Temer.
No Rio de Janeiro, Ometto doou para dois deputados: Julio Lopes (PP/RJ), um dos parlamentares mais ligados a pautas de energia, que recebeu R$ 100 mil, mas não se reelegeu.
Mesmo valor foi doado a Hugo Leal (PSD/RJ), membro da Comissão de Minas e Energia da Câmara. Em junho desde ano, Leal abriu o debate sobre a cadeia de logística da distribuição de combustíveis após a greve dos caminhoneiros do mês anterior, ao convocar em 30 de maio uma audiência pública para debater o tema.
Governadores rivais na lista de beneficiados
No Mato Grosso, Ometto ajudou a financiar as campanhas para governador de Wellington Fagundes, do PR, e de Pedro Taques, do PSDB. Rivais, os dois políticos perderam no 1º turno para Mauro Mendes, do DEM, que venceu com 58% dos votos válidos. Até a manhã desta segunda-feira (15/10), não havia registro de doações de Ometto para Mendes.
Pedro Taques é o atual governador mato-grossense que tentava a reeleição, mas recebeu 19% dos votos válidos, terminando o pleito em 3º colocado. Wellington Fagundes conseguiu 19,6% dos votos; é senador com mandato até 2023.
Beneficiados por doações de Ometto, elegeram-se governador Ronaldo Caiado (DEM) em Goiás e Ratinho Júnior (PSD) no Paraná. Caiado, senador e proprietário rural, é um velho conhecido do setor.
Ratinho Júnior ou Carlos Massa Júnior, herdeiro do apresentador do SBT, Ratinho, declarou apoio a Bolsonaro e está construindo uma carreira pública na esteira dos feitos do pai. A biografia oficial do governador eleito divide a atuação política, iniciada aos 21 anos na assembleia paranaense, e cargos no grupo Massa, que atua em agronegócio, alimentos e outros mercados – os mais notórios são redes de rádio e televisão. Ratinho Júnior e o pai gastaram R$ 2,5 milhão na campanha, que recebeu R$ 8,4 milhões – R$ 150 mil de Rubens Ometto.