Essa newsletter é enviada primeiro
aos assinantes, por e-mail.
Assine gratuitamente
Diálogos da Transição
apresentada por
A falha das empresas de óleo e gás em atender ao desafio de reduzir as emissões de gases do efeito estufa pode ameaçar sua lucratividade e até mesmo sua aceitabilidade pela sociedade no longo prazo.
Esse é o retrato feito pela Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) no relatório The Oil and Gas Industry in Energy Transitions apresentado no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça.
O diagnóstico, como citamos na segunda, passa pela constatação da IEA que o setor global de petróleo destina 1% de toda sua alocação de capital em projetos de geração de energia de baixo carbono.
Levantamento da BloombergNEF corrobora com os dados da IEA. Nunca as empresas de petróleo investiram tanto em projetos de energia renováveis, mas os esforços estão concentrados nas grandes.
Até setembro, três quartos de todos os projetos sancionados ficaram concentrados em sete companhia – BP, Chevron, Equinor, Repsol, Shell, Saudi Aramco e Total. Perfil dos investimentos, que reflete as discussões que estão ocorrendo em Davos.
Se fosse preciso polarizar o debate (não é), a discussão climática no Fórum Econômico Mundial poderia ser simplificada entre os defensores de uma urgência pelo fim da produção de combustíveis fósseis, em oposição a necessidade de suprir a demanda energética global.
A posição da IEA reflete uma preocupação com a insuficiência dos esforços de cima para baixo – não basta as maiores empresas do mundo estarem comprometidas com a transição para um economia de baixo carbono.
Isso colabora com os apelos pela imposição de impostos sobre carbono, o que, em geral, encontra oposição nos setores de energia, independente do porte das empresas.
“Nenhuma empresa de energia estará livre de ser afetada pela transição energética”, diz Birol.
E há cada vez mais pressão. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, defendeu que os estudos para criação de um imposto de carbono são sérios, em mensagem voltada especialmente para quem faz negócio com a Europa (Valor).
“Não faz sentido reduzir as emissões de gases de efeito estufa apenas internamente se aumentarmos a importação de CO2 do exterior”, disse Leyen.
E em tempos de guerra comercial, concluiu: “não é apenas uma questão climática; é também uma questão de justiça em relação a nossas empresas e nossos trabalhadores. Vamos protegê-los da concorrência desleal”. É o conceito de dumping de carbono.
As soluções, claro, passam pelo aumento dos investimento, não apenas das empresas que lideram o mercado, mas a IEA destaca alguns prioridades:
A primeira, conter os vazamentos de metano. A agência estima que 15% das emissões globais de gases do efeito estufa relacionados ao setor de energia são oriundas do processo de extração de petróleo e gás.
“A primeira tarefa para todas as partes da indústria é reduzir a pegada de carbono de suas próprias operações”, afirma Birol. “Uma grande parte dessas emissões pode ser reduzida de forma relativamente rápida e fácil”.
Outra, é neutralizar as emissões. De acordo com a IEA, dentro de 10 anos os combustíveis não-fósseis –como hidrogênio, biometano e biocombustíveis – precisam representar cerca de 15% dos investimentos totais em fornecimento de combustíveis para que o mundo possa entrar na rota para reduzir os impactos do aquecimento global, em linha com o Acordo de Paris.
A vantagem comparativa é a capacidade de oferecer energia sem emissão líquida de carbono. A agência aponta que a ausência de combustíveis de baixo carbono tornará a transição energética muito mais difícil e cara.
O gás precisa deslocar o carvão. Há uma tendência de que a geração de energia a gás natural supere a suprimento a queima de carvão – o desafio é quando e viabilizar os investimentos para o próximo passo dessa transição que é capturar, reutilizar e armazenar as emissões de carbono.
E, no futuro, o gás natural não é entendido pela IEA como uma solução de longo prazo, para manter a geração de energia elétrica em uma rota de desenvolvimento sustentável,
Desafio é particularmente maior para empresas nacionais, como a Petrobras e a Saudi Aramco, uma vez que os governos de seus países dependem altamente das receitas da extração de petróleo. Hoje, as empresas nacionais de óleo e gás respondem por mais de 50% da produção global de óleo e por uma parcela ainda maior das reservas disponíveis.
A IEA aponta que mesmo o foco maior em gás natural – caso do governo brasileiro – não é uma opção duradoura e que, embora algumas empresas nacionais possam preferir manter-se especializadas nesse combustível, também precisarão desenvolver respostas para quando o gás deixar de ter demanda ou retorno suficiente aos investimentos.
Nesta quinta (23), o próprio Fatih Birol alertou que o debate em Davos é centrado no Ocidente e ineficiente para conter mudanças climáticas. A demanda por energia em economias emergentes representa uma ameaça de crescimento da demanda por carvão.
Em outros destaques de Davos…
…Dados do Carbon Brief indicam que desde 2000 o mundo dobrou a capacidade de geração de energia a partir de carvão, chegando a 2.000 GW, com crescimento forte na China e na Índia. Outros 236 GW estão em construção e mais 336 GW em planejamento.
“Como vamos lidar com o problema da queima de carvão em países em desenvolvimento sem afetar suas economias? Sem provocar grandes impactos sobre as populações pobres da Ásia?”, questionou o diretor da IEA.
… O verdadeiro dilema da transição é como produzir energia com menos emissão de gases do efeito estufa – e não buscar a eliminação da produção de petróleo e gás, defendeu o presidente da Total, Patrick Pouyanné.
“É claro que todos queremos ter emissões neutralizadas, o que quer dizer que precisamos desenvolver tecnologias de captura de carbono, mas acho que essa [eliminar a produção de fósseis] é uma forma errada de colocar o debate. É preciso haver menos emissões, mas nossa primeira missão é trazer energia para as pessoas do planeta”.
… A demanda mundial por petróleo permanecerá acima de 100 milhão de barris por dia em 2040, afirma o presidente da Saudi Aramco, Amin Nasser.
“Haverá mais 2 bilhões de pessoas no mundo em 2040, há atualmente 3 bilhões de pessoas usando biomassa e esterco animal para cozinhar e há 1 bilhão de pessoas hoje sem eletricidade. Quase 50% da população mundial nunca voou em um avião”.
… Mas os CEOs das empresas de óleo negociam, em Davos, um plano para cortes mais profundos de emissões. A Bloomberg (em inglês, ou no Valor) apurou há discussões entre executivos para ampliar iniciativas para o chamado Escopo 3 de emissões de gases do efeito estufa.
O Escopo 1 são emissões diretas das companhias e suas controladas; o Escopo 2 engloba emissões indiretas, o que inclui compra de energia; e o Escopo 3, todas as emissões não contempladas nos outros grupos, o que expande para a cadeia de suprimento e o ciclo de vida dos produtos.
[sc name=”news-transicao”]