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Senado aprova mercado regulado de carbono após acordo com agro

Governo espera ter legislação aprovada até a COP28 em novembro; emendas na Câmara podem adiar os planos

Senado aprova PL do mercado regulado de carbono com emendas do agronegócio. Na imagem: Senadora Tereza Cristina (PP/MS) e Leila Barros (PDT/DF) se cumprimentam com aperto de mãos na CMA (Comissão de Meio Ambiente), do Senado (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)
Senadoras Tereza Cristina (PP/MS) e Leila Barros (PDT/DF) na CMA (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

BRASÍLIA — A Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado aprovou nesta quarta (4/10), por unanimidade, o projeto de lei 412/2022 que cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) – o mercado de carbono brasileiro – com foco nas atividades industriais.

A implementação deve ocorrer de forma gradual, dentro de um prazo de até 12 meses após a publicação da lei, prorrogável por igual período, para sua regulamentação.

O texto foi aprovado na CMA de forma terminativa após negociações com a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) para deixar de fora do mercado regulado atividades primárias como criação de gado e cultivo de soja e cana.

Deve seguir direto para discussão na Câmara dos Deputados. Também foi feito um acordo para evitar a apresentação de recurso para levar a matéria ao Plenário do Senado, o que atrasaria a tramitação.

Emendas do agro

Relatora da matéria, a senadora Leila Barros (PDT/DF) acolheu parcialmente as emendas de Tereza Cristina (PP/MS) explicitando a exclusão do agronegócio entre as atividades reguladas.

Ex-ministra da Agricultura no governo Bolsonaro, Tereza Cristina (PP/MS) disse que o setor está “confortável” com o avanço do projeto de lei.

“Fizemos um acordo que foi integralmente cumprido pela senadora Leila. A FPA e a bancada do agronegócio estão muito confortáveis com a aprovação do relatório”.

Um dos argumentos da FPA para ficar fora é a ausência de precedentes e metodologias para regular as emissões da agropecuária, o que poderia gerar aumentos de custos ao produtor, com impactos para toda a economia.

“Não existe uma legislação a nível mundial que inclua o agro, até porque não tem uma metodologia específica. Nós não temos ainda como medir a taxa de emissões do setor”, disse Leila à agência epbr após a aprovação do texto na CMA.

“Entendemos que não precisávamos, nesse momento, criar um cavalo de batalha em uma situação que poderia ser muito bem pacificada através do diálogo e foi isso que nós buscamos o tempo todo”, completou.

Na prática, significa que a “produção primária agropecuária e as emissões indiretas pela produção de insumos ou matérias-primas” não serão consideradas entre atividades obrigadas a cumprir um teto de emissões.

Mas as empresas poderão optar por contabilizar as emissões e remoções líquidas ocorridas em áreas rurais para emissão de créditos no mercado voluntário.

“Entendemos que mais importante do que regular atividades agropecuárias é incentivar a difusão de técnicas de agricultura de baixo carbono que, ao mesmo tempo, aumentem a renda do produtor rural, tornem mais resilientes os sistemas rurais aos efeitos adversos da mudança do clima e proporcionem redução e sequestro de emissões”, diz o relatório de Leila.

Entenda:

Próximos passos: aprovação antes da COP?

Na Câmara dos Deputados, já se articula o relator. Entre os cotados estão o deputado Sergio Souza (MDB/PR), ex-presidente da FPA, e Aliel Machado (PV/PR), relator do PL 2148/2015, onde está apensado o PL 528/2021 – que também propõe a criação de um mercado de carbono. O texto já tramita em regime de urgência.

A expectativa do governo é aprovar o marco até novembro, antes da COP28, a conferência climática da ONU que este ano ocorre em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, já como um sinal de mudança de visão na gestão brasileira em relação às questões climáticas e ambientais.

“O próprio presidente da Câmara [Arthur Lira (PP/AL)] disse recentemente que a prioridade é a pauta verde. O Brasil tem tudo para se apresentar na COP, no final do ano, com o projeto de lei do mercado de carbono regulado, com as eólicas offshore, com o Combustível do Futuro, com o PL do Hidrogênio”, defende o secretário de Economia Verde do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Rodrigo Rollemberg.

“Se o Brasil tiver capacidade de fazer isso, é uma pauta que unifica o país. Isso vai atrair muitos investimentos externos, porque o mundo precisa fazer a transição energética”, completa.

A votação do mercado de carbono foi acompanhada por integrantes da Fazenda e MDIC, além do ministro Alexandre Padilha, da Secretaria de Relações Institucionais.

Apesar da urgência – e do otimismo – do governo, os próprios parlamentares reconhecem a dificuldade de correr com a matéria.

Líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT/BA), disse durante a votação que o esforço será para aprovar até o mês que vem, mas é provável que ao chegar à Câmara o texto receba muitas contribuições, dificultando a aprovação em um mês.

O SBCE

O Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) é inspirado no modelo cap and trade adotado internacionalmente.

Atividades, fontes e instalações que emitam acima de 25 mil toneladas de CO2 equivalente por ano serão sujeitas a um limite de emissões que será definido posteriormente.

Já as empresas que emitirem entre 10 mil toneladas de CO2e e 25 mil tCO2e terão que apresentar plano de monitoramento de suas emissões e reportar ao órgão gestor do SBCE.

“[No cap and trade] é imposto um limite máximo de emissões e é possível comercializar direitos de emissão, internacionalmente conhecidos como allowance e definidos como Cotas Brasileiras de Emissões (CBE) no projeto de lei”, explica Antonio Augusto Reis, sócio da área de Direito Ambiental e mudanças climáticas do Mattos Filho.

“É um passo importante para a criação de um mercado regulado brasileiro que vem sendo discutido há muito tempo e mais intensamente desde 2021”, observa.