BRASÍLIA — O Observatório do Clima (OC) protocolou no início da semana três manifestações em cortes do Pará e do Amazonas, cobrando R$ 247,3 milhões de grandes desmatadores da Amazônia pelo dano causado ao clima. É o maior pedido de indenização do gênero já feito no país.
Os réus já estão sendo processados pelo Ibama pelo desmatamento ilegal de cerca de 14 mil hectares de floresta em propriedades rurais nos dois estados entre 2004 e 2017.
Segundo o OC, são desmatadores recorrentes que acumulam multas do órgão ambiental e, no conjunto dos processos, precisam ressarcir a União em cerca de R$ 357 milhões por diversos crimes.
“Agora, além do dano ambiental causado pelo desmatamento e pelas queimadas praticados pelos réus, a União precisa cobrar também pelos gases de efeito estufa emitidos na conversão dessas áreas para pastagem e lavoura”, diz a rede formada por 37 entidades da sociedade civil.
O OC pediu para entrar nos processos como amicus curiae da Advocacia-Geral da União, que representa o Estado brasileiro nos processos. O grupo vai apoiar o governo federal entregando dados complementares para subsidiar os pedidos de indenização feitos pela União em cada uma das ações.
Um cálculo realizado pela equipe do Seeg (Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima) mostra que o desmatamento, a queima dos resíduos da floresta e o impedimento da regeneração das áreas desmatadas emitiram um total de 10,4 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO₂e).
O volume equivale ao que é emitido em um ano pela Armênia e supera as emissões da Costa Rica, por exemplo, segundo dados do ClimateWatch.
Ao converter essas emissões em valor monetário, usando como referência o preço pago ao Brasil pelo Fundo Amazônia por reduzir o desmatamento (US$ 5 por tonelada), a equipe do OC chegou ao valor total de R$ 247,3 milhões a ser exigido nas ações.
A única ação desse tipo impetrada no país antes destas, em 2021 pelo Ministério Público Federal do Amazonas em parceria com o Ipam, havia exigido R$ 44 milhões em dano climático.
Desmatamento é principal fonte de GEE no Brasil
O desmatamento é a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa do país. Em 2020, último ano para o qual há dados disponíveis, o Seeg estimou que a devastação das florestas, principalmente na Amazônia e no Cerrado, respondeu por 46% das emissões brasileiras.
Somente a destruição da Amazônia emite mais que a Espanha e o Reino Unido somados.
Nas petições, o OC argumenta que, ao desmatar ilegalmente a floresta, os réus tornaram-se perpetradores diretos das mudanças do clima, que afetam um número cada vez maior de pessoas, em sua maioria pobres, a exemplo das 129 mortes registradas no fim de maio na Grande Recife.
“O dano ambiental é gênero, do qual o dano climático é espécie. Não se trata, então, apenas de desmatamento; se trata de desmatamento ilegal com a consequência concreta de aumentar a liberação de [gases de efeito estufa] e gerar desequilíbrio ecológico que se perpetuará por gerações”, afirmam as petições.
“Há funcionários do Estado brasileiro que, à revelia do seu presidente, que apoia explicitamente a destruição, buscam fazer a coisa certa e responsabilizar os criminosos que destroem o patrimônio dos brasileiros e põem toda a humanidade em perigo. São esses servidores públicos que nós apoiaremos nos tribunais”, diz Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
Propostas emergenciais para “sucessor de Bolsonaro”
Setenta e três Organizações não Governamentais, em parceria com a sociedade civil apresentaram, em maio, um conjunto de propostas emergenciais para enfrentamento às mudanças climáticas, que devem ser implementadas nos primeiros cem dias de governo para reduzir as emissões de gases do efeito estufa até 2045.
O primeiro conjunto, composto por 62 medidas sugeridas, foi entregue aos principais pré-candidatos ao Planalto, com exceção do atual presidente, Jair Bolsonaro (PL).
A proposta em si é uma forma de protesto, o entendimento é que o governo atual não tem quaisquer compromissos com o tema.
As organizações pedem revogação de decretos e reinstalação de conselhos, além de medidas para retomada da fiscalização e aplicação da lei.
Com essas primeiras ações já seria possível, segundo o texto, atuar em temas emergenciais, como o garimpo em terras indígenas, corte de subsídios à energia fóssil ou ainda desfazer a “pedalada climática” na meta brasileira do Acordo de Paris, a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, em inglês).