RIO — A expansão da matriz elétrica brasileira é projetada para alcançar um crescimento de 35% na capacidade instalada até 2034, elevando a necessidade de minerais críticos para essa transição em 54% no mesmo período, de acordo com dados apresentados pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), na quinta (20/3).
“A expansão da energia elétrica de 2024 para 2034 é de 84 gigawatts, sendo que 56 gigawatts são provenientes de energia solar e eólica”, afirma a analista de pesquisa energética da EPE, Marina Klostermann.
O levantamento está no Caderno de Minerais Críticos e Estratégicos para a Transição Energética produzido pela EPE, que também aponta que a maior parte desse crescimento será impulsionado pelas energias renováveis, que demandam muito mais minerais do que outras fontes, como hidrelétricas e térmicas a gás.
“Quando a gente compara o parque eólico terrestre, uma usina eólica onshore típica requer em torno de nove vezes mais recursos minerais do que uma usina típica a gás”, estima a analista de pesquisa energética da EPE, Natalia Moraes.
Moraes explica que, o cobre e o alumínio são considerados “minerais transversais”, pois estão presentes em várias das tecnologias.
“Já o lítio, o níquel, o cobalto, o manganês, o grafite, são pertinentes à densidade da energia da bateria, muito utilizados para esse fim. As terras raras também são essenciais, no caso, para ímãs permanentes, fundamentais para turbinas eólicas e os motores de veículos elétricos”.
Linhas de transmissão e eletrificação de veículos
O estudo também evidencia que a necessidade de minerais para as linhas de transmissão crescerá 19%, acompanhando um aumento projetado de mais de 30 mil quilômetros na rede elétrica, o que demandará mais de um milhão de toneladas de alumínio e aço.
“O protagonismo das energias renováveis vai precisar de uma nova linha de transmissão para integrar essas novas fontes. O uso de data center também é um item importante porque requer novas conexões, sem contar também a importância da resiliência climática, que é a ponta necessária de novas linhas”, ressalta Klostermann.
Outro ponto de atenção é a eletrificação de veículos. Segundo a analista, a participação dos veículos eletrificados no mercado brasileiro passará de 7% em 2024 para 17% em 2034, em parte impulsionadas por políticas públicas como o Mover, de estímulo a veículos de menor emissão de carbono, em especial híbridos.
“Essa eletrificação será impulsionada por incentivos estaduais, mas ainda existem barreiras, como custos elevados e infraestrutura limitada”, observa Klostermann.
A demanda por minerais para as baterias também crescerá, com a grafita se destacando, seguida por lítio, fósforo, níquel e terras raras.
“O aumento na composição mineral é notável, com 15 vezes mais grafita e fósforo, 14 vezes mais lítio e seis vezes mais terras raras. Essas mudanças vão trazer bastante alteração nas cadeias de suprimento do setor energético”, detalha.
Brasil pode se destacar na cadeia mundial de minerais críticos
Para o Brasil, esse cenário apresenta tanto desafios quanto oportunidades.
Segundo o presidente da EPE, Thiago Prado, o Caderno de Minerais Críticos e Estratégicos identifica oportunidades estratégicas, como o powershoring e o friendshoring, que podem atrair investimentos para industrialização e diversificação da cadeia de suprimentos.
Ele defende que o Brasil aproveite seu potencial no setor mineral, mas indica desafios, como altos investimentos necessários, concorrência internacional e a alta concentração das cadeias de beneficiamento na China.
“Esse caderno traz essa visão integrada, mostrando como o planejamento energético precisa considerar a disponibilidade de minerais e como a mineração pode se beneficiar da energia limpa e sustentável. Se essa relação não for analisada estrategicamente, corremos o risco de atrasar ou encarecer a transição energética”, diz Prado
Rodrigo Cota, diretor do departamento de transformação e tecnologia mineral do Ministério de Minas e Energia, observa que o Brasil possui grandes reservas, mas uma produção mineral ainda pequena.
“O Brasil tem a 2ª maior reserva de grafite e agora a 2ª maior reserva de terras raras, após revisão recente do USGS americano. Temos também a 3ª maior reserva de níquel. No entanto, nossa produção desses minerais é muito pequena. Para termos uma indústria de transformação robusta, precisamos transformar reservas em produção mineral em escala”.
Ele ressalta a necessidade de atrair investimentos tanto de empresas brasileiras quanto estrangeiras para viabilizar a exploração mineral, além de viabilizar fontes de financiamento.
“Estamos muito atentos à necessidade de financiamento desses projetos, que antes captavam equity e agora vão precisar recorrer a financiamento. O BNDES é o nosso grande parceiro para a provisão desses recursos, mas como todo banco financiador, necessita de garantias”, explica.
“Estamos fazendo um trabalho junto a outras agências financeiras e governos de países interessados em demandar os minerais brasileiros, para a gente construir um instrumento não só de financiamento, mas também de garantias para esses projetos”.
O diretor de geologia e recursos minerais do Serviço Geológico do Brasil, Valdir Silveira, defende a necessidade de expandir o conhecimento geológico do país.
“O Brasil tem 8 milhões de quilômetros quadrados de território e mais de 5,7 milhões de quilômetros na área marinha, mas apenas cerca de 50% do território está mapeado geologicamente de forma detalhada”, disse.
Silveira apontou que, mesmo com esse conhecimento limitado, o Brasil já está entre os cinco maiores produtores de commodities minerais do mundo.
“Temos a 7ª maior reserva de lítio, a 2ª maior de terras raras, a 2ª maior de grafite, a 3ª maior de níquel, a 7ª maior de urânio e a 8ª maior de cobre. Se avançarmos no conhecimento geológico, podemos nos tornar o maior player mundial de terras raras e urânio”, afirmou.
Ele aponta ainda a necessidade de integrar os dados do Serviço Geológico do Brasil com os das empresas que atuam no setor.
“Estamos trabalhando para consolidar uma base de dados nacional robusta, que reúna informações públicas e privadas, permitindo um avanço mais rápido no conhecimento do potencial mineral do país”, explicou Silveira.