RIO — O papel do carvão na matriz energética dos países do Brics é um dos principais desafios para a transição para fontes renováveis de energia. Apesar dos esforços para diversificação e descarbonização, a dependência desse combustível fóssil ainda é uma realidade entre nações fundadoras do bloco, como China, Índia, e África do Sul.
É o que mostra um levantamento do Brics Policy Center, com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS), sobre as barreiras que o fórum de emergentes enfrenta para uma transição energética efetiva.
China, maior emissora de CO2
A China, maior emissora global de CO₂, tem no carvão sua principal fonte de energia, representando 61% de sua matriz.
Apesar disso, o país lidera a transição global para energias renováveis, com forte expansão da energia solar e eólica.
“Essa transformação gera desafios socioeconômicos, particularmente nas regiões dependentes do carvão e das indústrias relacionadas a ele”, aponta o estudo.
O compromisso chinês é atingir o pico de emissões antes de 2030 e a neutralidade de carbono até 2060, mas a transição precisará lidar com os impactos sociais e econômicos da redução do uso do carvão.
Índia e os apagões
A Índia é o segundo maior produtor de carvão do mundo e sua geração de eletricidade depende 70% dessa fonte.
O setor energético é o principal responsável pelas emissões indianas, que cresceram 11,5% desde 2016.
“Estima-se que, em 2030, 50% da eletricidade da Índia ainda venha do carvão”, afirma o estudo.
Apesar do avanço nas renováveis, a transição é dificultada por problemas estruturais como apagões frequentes, dependência de importação de combustíveis e a falta de financiamento adequado para projetos de energia limpa.
África do Sul: monopólio do carvão e crise energética
A África do Sul lidera as emissões de CO₂ na África e tem no carvão 73,8% de sua matriz energética.
O país enfrenta crises de abastecimento elétrico devido à precariedade da estatal Eskom, que controla 95% da produção de energia.
“O sistema sul-africano de energia não foi capaz de prover 13,4% da demanda de energia, o que leva a apagões frequentes e em áreas cada vez mais extensas”, ressalta o estudo.
Além disso, o país possui 800 minas de carvão abandonadas, criando impactos ambientais e sociais negativos.
Rússia com matriz dominada por hidrocarbonetos
Apesar de uma matriz energética fortemente baseada em combustíveis fósseis, na Rússia, representa 15,3% da energia do país, atrás do petróleo (19,3%) e do gás natural (55%).
O país é um dos maiores produtores e exportadores de gás natural, e inclui o energético como estratégia para sua transição energética.
“Para o país, o gás natural é uma fonte alternativa de energia, considerada ambientalmente mais sustentável”, destaca a pesquisa.
No entanto, a participação de fontes renováveis na matriz ainda é reduzida.
Brasil em vantagem
Diferente dos demais países do BRICS, o Brasil se destaca por possuir uma matriz energética significativamente mais limpa, com 49,1% de sua energia advinda de fontes renováveis, enquanto a média global é de apenas 14,7%.
O país ocupa a terceira posição mundial em capacidade instalada de energias renováveis, impulsionado principalmente por hidrelétricas, biomassa e energia eólica. Além disso, é um dos líderes na produção e uso de biocombustíveis, como o etanol e o biodiesel, reduzindo sua dependência de combustíveis fósseis.
Apesar dessa vantagem, o país enfrenta contradições em sua política energética. Embora tenha implementado iniciativas ambiciosas, como a Política Nacional de Transição Energética (PNTE), o Novo PAC e programas voltados para biocombustíveis e hidrogênio de baixa emissão de carbono, o Brasil ainda mantém incentivos significativos aos combustíveis fósseis.
O estudo lembra, que em 2021, por exemplo, a crise hídrica levou ao aumento da operação de usinas termelétricas, o que resultou em maior emissão de carbono relacionada à matriz.
Outro fator que diferencia o Brasil dos demais países do BRICS é a origem de suas emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Enquanto China, Índia, Rússia e África do Sul têm a queima de combustíveis fósseis como principal fonte de emissões, no Brasil, a maior parte dos GEE vem do desmatamento e das mudanças no uso da terra. Em 2022, o país lançou 1,12 bilhão de toneladas brutas de CO₂ equivalente pela destruição de biomas, representando 48% das emissões totais.