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Eólicas offshore precisam de um marco regulatório; "sem isso, os investidores não vão vir"

Embaixador da Dinamarca no Brasil, Nicolai Prytz, fala de oportunidades de investimentos no Brasil e que políticas ambientais serão critério para entrada do Brasil na OCDE

Embaixador da Dinamarca no Brasil, Nicolai Prytz (foto: Geraldo Bubniak/AEN)
Embaixador da Dinamarca no Brasil, Nicolai Prytz (foto: Geraldo Bubniak/AEN)

O embaixador da Dinamarca no Brasil, Nicolai Prytz, defendeu, em entrevista à agência epbr, a construção de um marco regulatório das eólicas offshore que dialogue com os interessados e traga maior certeza aos investidores.

Dinamarca e Brasil assinaram no fim do ano passado um memorando de entendimento para cooperação no desenvolvimento da eólica offshore e transição energética. O país nórdico é pioneiro na geração de energia proveniente do vento em alto mar.

“Seria prudente em algum momento consultar as empresas e investidores. O marco regulatório no final das contas tem que ser interessante para os investidores”, diz.

“Tem que conversar com os investidores lá fora para ver quais são as condições básicas. Tem que ser transparente, ter segurança jurídica, e tem que ter retorno”.

Marco para eólica offshore no Senado

O Ministério de Minas e Energia (MME) publicou um decreto no fim de janeiro. O Congresso Nacional também discute o tema – o principal PL foi proposto por Jean Paul Prates (PT/RN) e é relatado pelo líder do PL, Carlos Portinho (RJ), no Senado.

O decreto prevê um rito para contratação das áreas offshore para geração de energia, mas agentes do mercado entendem que ainda há lacunas na regulação. Sem falar, na possibilidade de o marco ser alterado pelos parlamentares.

“Estamos aqui para compartilhar nossas experiências”, Prytz. “Tem condições super interessantes no Brasil. Teve o decreto, mas tem que detalhar ainda mais (…) O que falta é marco regulatório, porque sem isso os investidores não vão vir. É o que está trabalhando o governo… sei que o MME está dando prioridade”.

Diversificação de fontes no planejamento energético

O acordo entre os países também prevê a troca de informações sobre planejamento energético.

Para ele, a aposta nas eólicas offshore seria essencial para diversificar a matriz elétrica brasileira que, apesar de limpa, ainda é muito concentrada na geração hidrelétrica, sensível à crise hídrica, como a observada no ano passado.

“O Brasil, o governo e as autoridades estão prontos para apostar em energia eólica offshore (…) Do lado brasileiro, a demanda não é necessariamente uma matriz energética mais limpa, eu acredito que vocês já têm isso. Acredito que o Brasil é um exemplo para todo o mundo, tendo o apenas o desafio da diversificação”, explica.

Recentemente, o governo começou a limitar o despacho termoelétrico, mais caro, mas tem poupado os reservatórios para atravessar o período seco de 2022.

“O Brasil vem diversificando pouco a pouco a matriz elétrica, mas o ano passado mostrou que ainda tem caminho para percorrer. Estava a ponto de uma nova crise energética”.

Investimentos dinamarqueses no Brasil

O embaixador ressalta que os investidores dinamarqueses estão de olho nas oportunidades que o Brasil oferece.

“Acredito que as empresas que podem desenvolver isso no Brasil existem, o capital existe. Mas tem que ter transparência e perspectiva de retorno. Sem isso ninguém vai vir”, diz Nicolai.

Ele destaca o potencial dos fundos de pensão da Dinamarca como fontes de recursos para financiamento dos projetos de eólicas offshore.

“Ninguém que mexe com fundo de pensões quer surpresa (…) Só posso falar pela Dinamarca. Mas tem fundos de pensão que adoram investir nesse tipo de projeto, mas não necessariamente no Brasil. Pode ser Taiwan, Vietnã, Coreia do Sul e Índia. Tem projetos interessantes por todo o mundo”, afirma.

Um possível investidor seria a Copenhagen Infrastructure Partners (CIP), gestora de fundos dinamarquesa focada em infraestrutura de energia renovável. A CIP tem como sócio o maior fundo dinamarquês de pensão, o PensionDanmark, que gere mais de 36 bilhões de euros em ativos.

Em novembro do ano passado, duas comitivas brasileiras se reuniram com representantes da CIP em Copenhagen, em agenda organizada pelo Embaixador do Brasil na Dinamarca, Rodrigo Azeredo. Uma comitiva com representantes do Rio Grande do Norte e outra com integrantes do governo do Ceará.

Hidrogênio verde combinado com eólicas offshore

Tanto Ceará como Rio Grande do Norte lançaram programas para atrair investimentos em projetos de produção de hidrogênio verde, com projetos que contam com o desenvolvimento de parques eólicos offshore.

O Rio Grande do Norte chegou a assinar um memorando de entendimento com a CIP para execução do projeto Alísios Potiguares, com 1,8 GW de produção de energia offshore e hidrogênio verde.

As reuniões também contaram com a presença de representantes das dinamarquesas Vestas — maior fabricante de aerogeradores do mundo — e Orsted — empresa líder mundial em energia eólica offshore.

A fabricante de aerogeradores já possui uma fábrica no Ceará e pretende instalar uma segunda unidade no estado.

Vestas e Orsted também integram o consórcio AquaVentus, que espera produzir hidrogênio verde alimentado por 10 GW de energia eólica offshore instalada no Mar do Norte. Com esse projeto, a Dinamarca espera exportar H2V.

“Esse tema [hidrogênio verde] tem muito interesse na Dinamarca. Eu sei que algumas empresas estão vendo o que está acontecendo no Brasil e o futuro do Brasil em hidrogênio verde”, conta Nicolai.

No início de fevereiro, Prytz esteve reunido com o governador do Rio Grande do Sul (RS), Eduardo Leite, que apresentou ações e projetos do estado para obtenção de hidrogênio verde (H2V).

Rotas para descarbonização do transporte marítimo

Recentemente, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e a Autoridade Marítima Dinamarquesa (DMA) assinaram um documento para cooperação no tema.

“Essa colaboração já existe e irá se intensificar ainda mais entre o Brasil e a Dinamarca”, diz.

O diretor-geral da Antaq, Eduardo Nery, se reunirá em breve com o embaixador da Dinamarca para o clima, Tomas Anker Christensen, que está em visita ao Brasil.

Em abril, será a vez de Nery ir à Dinamarca para aprofundar as discussões com foco na sustentabilidade no transporte marítimo.

“Nossa primeira-ministra apresentou em Glasgow que a Dinamarca tem ambição de que até 2050 todo o transporte marítimo seja sem energia fóssil”, destaca o embaixador.

A lei climática aprovada na Dinamarca espera reduzir as emissões do país em 70% até 2030, até alcançar a neutralidade em 2050.

Em janeiro, a dinamarquesa  A.P. Moller – Maersk — segunda maior empresa do setor — foi além, e anunciou que pretende zerar suas emissões até 2040.

Responsável por 90% de todo o comércio global, o transporte marítimo responde por cerca de 3% das emissões de gases de efeito estufa (GEE). Segundo o compromisso da Organização Marítima Internacional (IMO, na sigla em inglês), esse volume deverá cair pela metade até 2050.

Parque eólico offshore da Ørsted; Dinamarca instalou 1,703 GW de potência até o fim de 2020
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Financiamento climático e OCDE

Além das ambiciosas metas de descarbonização, durante a COP26, a Dinamarca se comprometeu em colaborar com US$ 1 bilhão anual no fundo de US$ 100 bilhões criado por países ricos para financiar a transição em países pobres.

Para Nicolai, esse passo da Dinamarca é um incentivo aos países ricos em se comprometerem com o financiamento climático.

“A Dinamarca se comprometeu com 1% dos 100 bilhões, isso corresponde a uma fatia maior que o nosso PIB na conta global”, ressalta.

O embaixador também avalia as novas ambições apresentadas pelo Brasil durante a conferência do clima, mas ressalta que é necessário ver resultados.

“O governo brasileiro assumiu compromissos na COP26. Mas a gente logicamente vai acompanhar”, afirma.

“Acompanhamos com muito detalhe o que está acontecendo, seja em projetos de lei de licenciamento ambiental, cortes no orçamento, a gente acompanha. Mas no final das contas só o que vale são os números”.

Controle do desmatamento é critério para acordos comerciais

Entretanto, quando o tema é desmatamento, ele lembra que “os números não são muito positivos”.

“Temos direito a ser um pouco céticos, mas vamos ser positivos”, pondera. “Tem muito receio entre alguns países exatamente pela questão de desmatamento tão alta”.

Para o embaixador, o acordo do Mercosul com a União Europeia e a candidatura brasileira para integrar a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) são fortes incentivos para que o Brasil reforce suas políticas de proteção ambiental, assim como de garantia de direitos humanos.

A Dinamarca, uma das apoiadoras pela entrada do Brasil na organização, utilizará os resultados dessas políticas como critério de avaliação.

“O Brasil tem que cumprir com várias condições. O fato que o Brasil é candidato não quer dizer que está dentro. A Dinamarca quer que aconteça, esteve sempre a favor do Brasil virar membro da OCDE, mas tem condições para entrar. Não é só uma formalidade de adaptação de regras na área de anticorrupção, propriedade intelectual, meio ambiente e desmatamento. Tem que cumprir também. Esse vai ser o foco nessa avaliação”.