RIO – A Arsesp, a reguladora do estado de São Paulo, pretende decidir este ano o que fazer com os efeitos da retirada do ICMS da base de cálculo de PIS/Cofins e os créditos tributários de quase dois bilhões de reais que a agência propõe devolver integralmente aos consumidores paulistas de gás natural.
Além disso, o regulador quer encerrar em 2024 uma controvérsia que levou à suspensão das regras para aquisição de gás natural pelas distribuidoras do estado.
Simplificar os procedimentos é um pleito das concessionárias paulistas: Comgás e Necta, controladas pela Compass, do grupo Cosan, e a Gás Natural SPS, da Naturgy.
Os assuntos estão na agenda regulatória 2024-2025, em consulta pública até 1º de fevereiro.
Devolução integral de R$ 2 bilhões
Arsesp, consumidores e as três distribuidoras se debruçaram ao longo de 2023 sobre a proposta que prevê a devolução integral de R$ 1,975 bilhão (em valores de 2022) aos consumidores durante as revisões tarifárias.
Em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) consolidou o entendimento e a modulação sobre a retirada do ICMS, imposto estadual, da base de cálculo do PIS/Cofins – o que elevava a arrecadação federal.
A decisão gera direitos de restituição dos impostos a partir de 2017 ou até mesmo anteriores, nos casos em que as empresas acionaram a Justiça.
As distribuidoras contestaram a proposta de devolução integral, abrindo uma divergência com a agência e consumidores paulistas.
A previsão é que Arsesp apresente no fim do mês o relatório da consulta encerrada há um ano. E defina, este ano, as regras para a eventual devolução.
É a questão enfrentada pelo Ministério da Fazenda, de Fernando Haddad, que editou em dezembro a MP 1202 para autorizar o governo a limitar e parcelar as compensações acima de R$ 10 milhões em até cinco anos – mesmo texto que alterou a desoneração da folha de pagamento, abrindo uma crise com o Congresso Nacional.
Para 2024, a agenda regulatória proposta pela Arsesp contempla, dentre outros itens:
- Os procedimentos para aquisição de gás, pelas concessionárias;
- A interligação das diferentes áreas de concessão em SP;
- O tratamento regulatório para devolução de créditos oriundos da aplicação de PIS/Cofins sobre ICMS nas faturas de gás canalizado;
- Metodologias para definição dos critérios de cálculo do custo médio ponderado de capital (WACC) no setor de gás canalizado (em consulta pública);
- Estudar o desenvolvimento da estrutura tarifária do gás canalizado
E para 2025:
- Identificar os possíveis modelos para operações de swap para gás natural e biometano, a fim de delinear a regulação necessária;
- Aperfeiçoar o Contrato de Uso do Sistema de Distribuição (Cusd) a ser firmado entre concessionárias, usuários livres, autoprodutores e autoimportadores.
A Arsesp também prevê concluir este ano a 5ª revisão tarifária da Comgás e da Necta. No caso da SPS (Naturgy), o prazo é maio de 2025.
Suspensão cautelar das regras para compra de gás natural
Na agenda 2024-2025, a Arsesp se comprometeu a revisar a deliberação 1.243/2021, suspensa desde junho do ano passado, de forma cautelar, para uma revisão definitiva. A decisão atendeu às distribuidoras.
A deliberação 1.243/2021 criou algumas exigências:
- As concessionárias devem adotar processos licitatórios – preferencialmente pregões eletrônicos – para aquisição de gás;
- Os contratos de suprimento não podem ultrapassar quatro anos, como regra, com possibilidade de prorrogação caso haja inviabilidade de licitação;
- E as distribuidoras devem planejar a substituição de seus atuais contratos de suprimento, de forma que a licitação alcance, no mínimo, 40% do volume até o fim de 2023; 60% do volume até o fim de 2024; 80% volume até o fim de 2025; e 100% do volume contratado por licitação após 2025.
O problema é que essa renovação dos contratos visava a uma janela de entrada de novos supridores, com concorrência na oferta do gás natural. O mercado não mudou e a Petrobras seguiu como principal fornecedora.
As concessionárias alegaram, por exemplo, que ao limitar em quatro anos o prazo máximo para os contratos de suprimento, a Arsesp impediria as distribuidoras de acessar condições de preços mais favoráveis nas negociações.
Em geral, quanto maior o prazo contratual, menor o preço – que é repassado aos consumidores.
E este foi o caso: Comgás, Naturgy e Necta acabaram fechando contratos de longo prazo com a Petrobras – que, nas negociações, ofereceu um preço equivalente a 13,9% do petróleo Brent para o gás contratado por quatro anos e 11,9% para os acordos de onze anos.
Para aprofundar:
- Como a contratação de gás pelas distribuidoras mexe com o mercado livre
- O gás mais barato da Petrobras e implicações para a abertura do mercado
Indústria vê com ressalvas
A Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro) se opôs à escolha das distribuidoras de seguir com a contratação no modelo das chamadas públicas, no lugar do pregão eletrônico.
Ao se referir à chamada da Comgás, a entidade argumentou junto à Arsesp, dentre outros pontos, que não há, no edital, indicação de cláusulas mínimas necessárias em uma dinâmica de comercialização; e que as regras da CP permitem à Comgás negociar com o proponente ajustes nas condições definidas – o que pode frustrar o caráter competitivo.
A Comgás rebateu: argumenta que a CP é amplamente utilizada por outras distribuidoras estaduais.
E defendeu que o pregão eletrônico tende a minar a possibilidade de redução de preços ou negociações de flexibilidades contratuais sobre as propostas recebidas, obrigando as concessionárias “a aceitar a oferta recebida em primeira instância, sem ter a chance de negociações”.
E destacou, por fim, que as informações da chamada pública são repassadas à Arsesp e que os contratos de suprimento são públicos.