Reforma do setor elétrico

Proposta amplia desconto da tarifa social de energia em todas as faixas de consumo

Proposta do MME prevê isenção total no consumo de até 80 kWh/mês para famílias de baixa renda, com custo adicional de R$ 3,6 bi à CDE

Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em apresentação sobre a reforma do setor elétrico e a nova tarifa social, em Brasília, em 16 de abril de 2025 (Foto Ricardo Botelho/MME)
Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), em apresentação em Brasília, em 16 de abril de 2025 (Foto Ricardo Botelho/MME)

BRASÍLIA — A proposta de criação da nova tarifa social de energia elétrica (TSEE), apresentada ontem (16/4) pelo Ministério de Minas e Energia (MME), simplifica e eleva o desconto na conta de luz dado para todos as famílias de baixa renda elegíveis, independente da faixa de consumo.

O projeto foi enviado para a Casa Civil e prevê mudanças nos rateios que financiam a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), uma espécie de conta corrente sustentada pelos consumidores de energia, por meio de encargos.

A ampliação da tarifa social terá um custo adicional de R$ 3,6 bilhões pelas contas do MME. Considerando a despesa de R$ 6,4 bilhões em 2024, o total ano passado seria de R$ 10 bilhões, caso a nova política estivesse em vigor. 

A CDE custou aos consumidores brasileiros R$ 48 bilhões em 2024, portanto, apenas 13% foram usados na política para baixa renda. 

Os subsídios para fontes incentivadas (solar, eólica, biomassa e pequenas hidrelétricas) lidera com R$ 13 bilhões (27%); duas rubricas para combustíveis, somados com carvão para geração de energia, custaram R$ 14 bilhões (29%); e a geração distribuída (majoritariamente solar), outros R$ 12 bilhões (26%). 

O restante foi para irrigação e aquicultura, universalização do acesso à energia e subsídios às distribuidoras de pequeno porte, cerca de R$ 3 bilhões no total, menos de 1% da CDE. Os dados são da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Segundo a Aneel, os R$ 48 bilhões representaram, em média, 13,8% das tarifas residenciais. O valor da tarifa varia de acordo com a distribuidora. Em dezembro, o desconto médio foi de R$32,25 para a baixa renda. 

As tarifas médias no Brasil estão na casa dos R$ 0,71, o que corresponderia a um desconto de R$ 56,80 para os 80 kWh. Técnicos do governo consideram que a ponderação de custos é mais adequada considerando R$ 1 por kWh.

O desafio é pagar essa conta adicional de R$ 3,6 bilhões, que sobe para cerca de R$ 4,5 bilhões, com outra medida proposta: isentar famílias com renda per capta de até um salário-mínimo e meio do pagamento dos encargos transferidos para a CDE

O ministério está propondo reduzir os subsídios para consumidores que compram energia no mercado livre das fontes inventivas, conforme os contratos atuais vencerem. Eles passaram a pagar a conta do fio, tarifas que financiam a infraestrutura de transmissão e distribuição. 

O MME estima que R$ 10 bilhões deixarão de ser subsidiados na CDE no longo prazo, mas admite que há um descasamento e a conta poderá ficar mais cara nos primeiros anos, porque os benefícios sociais ampliados passariam a valer antes da redução das despesas.

Outra medida é a limitação do enquadramento de consumidores como autoprodutores de energia, modalidade que tem descontos nos encargos. Também valerá para frente, mantendo o benefício de empresas que já se beneficiam da prática.

Na esteira das mudanças, o MME está propondo um calendário para a abertura total do mercado de energia nos próximos anos, quando consumidores residenciais de qualquer perfil também poderão escolher de quem comprar a energia, não apenas com a distribuidora da sua região.

O projeto ainda será discutido internamente no governo federal, antes de ser enviado ao Congresso Nacional, a quem caberá dar a palavra final sobre a reforma.

Qual a proposta para a nova tarifa social de energia elétrica?

A proposta do MME é a CDE financiar até 80 kWh para os consumidores enquadrados na tarifa social. Os critérios são os mesmos, com a diferença que hoje há uma distinção entre consumidores de baixa renda; e indígenas e quilombolas. 

O enquadramento é: 

  • Famílias inscritas no CadÚnico, com renda mensal de até meio salário mínimo per capita; ou
  • Pessoas com deficiência ou idosos (65 anos ou mais) que recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC); ou
  • Famílias indígenas e quilombolas, inscritas no CadÚnico; ou
  • Famílias inscritas no CadÚnico e atendidas em sistemas isolados por módulo de geração;

Em 2024, foram 17,4 milhões de famílias atendidas pela atual tarifa social. Os descontos, contudo, são aplicados por faixa de consumo. Quanto maior o consumo, menor é o desconto, dado que famílias que gastam mais energia tendem a ter um padrão de vida melhor, com mais acesso à eletrodomésticos, por exemplo. 

Independente da faixa de consumo da residência enquadrada como baixa renda, a família terá até 80 kWh de energia de graça

O MME estima que, das 17,4 milhões de famílias elegíveis para a tarifa social em 2024, um total de 4,6 milhões consumiram até 80 kWh e terão a conta zerada se a proposta entrar em vigor. 

A proposta mantém a progressividade: consumidores que gastam menos, portanto tendem a ser mais pobres, vão ter mais desconto em relação ao total de energia consumido por mês. Atualmente, a tabela da tarifa social é distribuída da seguinte forma:

  • De 0 a 30 kWh, desconto de 65%;
  • De 31 a 100 kWh, 40%;
  • De 101 a 220 kWh, 10%;

Indígenas e quilombolas têm uma tabela diferente:

  • De 0 a 50 kWh, desconto de 100%;
  • 51 a 100 kWh, 40%;
  • 101 a 220 kWh, 10%;

Hoje, quem gasta exatamente 80 kWh, tem um desconto de 65% na faixa de até 30 kWh; e de 40% na faixa de 31 a 100 kWh. Na prática, paga por 40,5 kWh dos 80 kWh consumidos. No novo modelo, seria zero.

Ao zerar a cobrança até 80 kWh, a proposta está elevando os descontos sobre todas as faixas de consumo. Por exemplo:

  • Com gastos de até 30 kWh, os 65% de desconto levam ao pagamento de uma conta de 10,5 kWh. Passaria a ser zero com a nova tarifa social.
  • Consumo de 100 kWh e o desconto de 65% até 30 kWh; e 40% no restante, levaria a uma conta de 32 kWh. Com os 80 kWh gratuitos, a conta cai de 100 kWh para 20 kWh.
  • No consumo de 220 kWh, pela regra atual, o desconto de 10% é aplicado na faixa a partir de 101 kWh, levando ao pagamento de 160,5 kWh no mês. Com a nova proposta, seriam pagos 140 kWh.

Por que zerar a cobrança sobre até 80 kWh?

O MME justificou que os 80 kWh por mês são suficientes para atender um conjunto de necessidades básicas de uma família de baixa renda ou o ‘consumo digno’, como diz a pasta. 

Em uma simulação feita no anúncio, os 80 kWh seriam suficientes para uma casa com seis lâmpadas de LED; um refrigerador; uma TV; um chuveiro elétrico; ferro de passar; e carregadores de celular e pequenos aparelhos eletrônicos. Totalizariam 78,6 kWh.

Além do fato de nenhuma família ter redução do benefício que atualmente tem direito, o ministério conta que haverá uma redução dos gatos, os furtos de energia, com o estímulo da regularização dado que até 80 kWh por mês serão gratuitos.

Se bem sucedida nesse aspecto, a medida tem o potencial para reduzir custos das distribuidoras com inadimplência.

O alcance da tarifa social ainda é precário, contudo. Segundo dados da Aneel, de setembro de 2024, cerca de 7,7 milhões de famílias elegíveis ainda não receberam o benefício, mesmo após um mecanismo de cadastramento automático, criado em 2021.

A agência cita que, entre os motivos, estão faturas de energia em nomes de terceiros, como outros proprietários ou antigos moradores; informações incorretas ou desatualizadas no Cadastro Único ou nas distribuidoras; e consumidores que recorrem aos gatos, furtando energia da rede.

Os estados com maior número de famílias não atendidas são a Bahia (1 milhão), São Paulo (891,4 mil), Pernambuco (678,9 mil), Minas Gerais (598,8 mil) e Pará (554,2 mil).

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