MP dos data centers

Plano do governo para atrair data centers está restrito a ZPEs, após crise do IOF

Sem dinheiro para desoneração expressiva, governo avalia concentrar Redata em áreas de livre comércio já instaladas para atrair investimentos de big techs

Vista aérea vertical de embarcações atracadas no cais do Porto do Pecém, com água esverdeada ao redor (Foto: Divulgação)
Embarcações atracadas no cais do Porto do Pecém (Foto Divulgação)

BRASÍLIA — A finalização da medida provisória do governo para atrair empresas de data centers e facilitar a instalação de estruturas de processamento de dados atrasou diante da crise fiscal.

O eixos pro, serviço de cobertura para empresas (teste grátis), apurou, ainda, que a proposta de criação do Redata para oferecer desoneração de impostos federais (PIS, Cofins e IPI) sobre a importação de equipamentos deve ser mais tímida que o previsto.

Falta dinheiro no caixa para dar benefícios fiscais expressivos a big techs como Amazon, Google e Microsoft instalarem estruturas de serviços em diversos estados.

Com isso, a MP dos data centers pode ser voltar os ajustes necessário visando à instalação em Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs), que operam como áreas de livre comércio dentro país para o envio internacional de produtos.

A restrição tende a impactar a previsão do governo de atrair R$ 2 trilhões em investimentos nos próximos anos. Isto porque, a extensão do benefício fiscal para data centers fora de ZPEs ficaria para uma segunda fase do plano do governo.

A proposta é elaborada pelos ministérios da Fazenda, Minas e Energia (MME); Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC); e Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI).

Mudança jurídica é necessária para exportação de serviços digitais

O Brasil possui 14 ZPEs formalizadas, sendo nove no Nordeste. Todas oferecem isenção de PIS, Cofins e IPI para produtos destinados à exportação. Mas será preciso alterar o marco legal das ZPEs para estender o benefício fiscal para incluir serviços de computação em nuvem.

A legislação atual desonera apenas os serviços necessários para a operação de fábricas instaladas nas zonas de processamento. Os benefício das ZPE são voltados exclusivamente para exportação.

Impasse político

O Palácio do Planalto ficou desconfortável com a ida do ministro Fernando Haddad (PT), da Fazenda, a Palo Alto, na Califórnia (EUA), em maio. Na ocasião, o ministro deu detalhes do Redata. Isso irritou o Planalto. O plano era do anúncio ser feito pelo presidente Lula (PT). A ordem foi para esperar.

O envio do marco legal do Redata ao Congresso Nacional previsto para maio está, agora, sem previsão oficial. Nesta quarta-feira (4/6), o presidente em exercício Geraldo Alckmin (PSB) afirmou que a MP pode sair “nos próximos dias ou semanas”.

O calendário de junho, marcado pelo feriadão de Corpus Christi, vai parar o Congresso por uma semana. Depois, Câmara e Senado devem dedicar o calendário apertado antes do recesso previsto para meados de julho para debater projetos como a desoneração do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil e a alteração nas alíquotas do IOF.

Após a elaboração da minuta, caberá ao Planalto avaliar como o governo vai garantir apoio de deputados e senadores a uma ampliação na desoneração de impostos no momento em que busca novas fontes de arrecadação, como o IOF, para cumprir a meta fiscal.

Data centers limpos

Durante a participação no evento em Los Angeles, o ministro da Fazenda afirmou que a carga tributária atual do setor é estimada em até 60%, sendo que os investimentos iniciais podem representar até 85% dos custos totais de instalação. O Redata, segundo ele, exigirá contrapartidas como processamento local e uso de fontes limpas.

A proposta do governo tem como diretriz central a sustentabilidade ambiental. De acordo com Haddad, o objetivo é transformar o Brasil em um hub estratégico para infraestrutura digital com base em energia limpa e infraestrutura segura na América Latina.

“Queremos que a economia digital no Brasil seja simultaneamente digital e verde. Então, é nisso que nós estamos trabalhando. Prover os data centers de energia limpa e processar os dados com segurança cibernética, com segurança jurídica”, afirmou.

Nesse sentido, o uso de energia renovável — solar e eólica, especialmente no Nordeste — é uma diretriz central da nova política, como explicou o secretário nacional de Transição Energética e Planejamento, Thiago Barral, em recente evento no Rio.

A iniciativa busca ainda estimular a utilização da infraestrutura nacional de geração de energia, que vive uma crise por excesso de oferta e queda na demanda, sobretudo nas fontes renováveis.

“Sabemos que dois fatores cruciais para o sucesso de uma política de atração de data centers são a rede elétrica — transmissão e distribuição —, e a energia renovável”, disse Barral, técnico envolvido no desenho da política. “O Brasil tem um pipeline quase inesgotável de oferta de geração renovável”.

Distribuidoras de gás natural do Nordeste — como Potigás, Bahiagás, Algás, entre outras — enviaram carta ao MME pedindo que gás natural e biometano também sejam considerados na política, e que o uso exclusivo de solar e eólica não seja obrigatório como pré-requisito para os subsídios.

O governo também negocia com o Congresso pontos regulatórios sensíveis, como questões de direitos autorais e concorrência, com o objetivo de consolidar um marco legal robusto para o setor.

Nuclear entra no radar como solução firme

Embora a prioridade inicial seja a energia renovável, o governo também estuda alternativas complementares, como o uso de pequenos reatores modulares (SMRs, na sigla em inglês) — tecnologia em desenvolvimento que pode fornecer energia firme e sem emissões de gases de efeito estufa.

Durante missão à China e à Rússia em maio, o ministro do MME, Alexandre Silveira (PSD), destacou que os pequenos reatores serão estratégicos para garantir energia limpa e estável à expansão dos centros de dados no Brasil.

O governo brasileiro negocia parcerias com a estatal russa Rosatom, incluindo cooperação na exploração de urânio e desenvolvimento de SMRs no país. Segundo Silveira, o próprio presidente Vladimir Putin teria autorizado a aceleração desses acordos.

O presidente Lula reforçou na viagem à Rússia o alinhamento, apontando os pequenos reatores como “uma novidade extraordinária para que a gente possa ter energia garantida para todo o sempre”, sobretudo diante da crescente instabilidade do sistema elétrico devido à forte presença de fontes intermitentes de geração como a eólica e a solar.

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