Demorou mas saiu

Lula sanciona sem vetos lei que cria mercado brasileiro de carbono

Lei cria modelo de cap-and-trade para regulação de emissões de todos os setores da economia, com exceção do agro

Lula da Silva, durante a cerimônia Nova Indústria Brasil – Missão 1: Cadeias agroindustriais sustentáveis e digitais, em 3/12/2024 (Foto Ricardo Stuckert/PR)
Presidente Lula (PT) durante a cerimônia Nova Indústria Brasil – Missão 1: Cadeias agroindustriais sustentáveis e digitais | Foto Ricardo Stuckert/PR

BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou nesta quinta (12/12) a lei 15.042/2024, que institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), sem vetos e respeitando os acordos fechados no Congresso Nacional.

A legislação cria o mercado brasileiro de carbono, que passará a ser regulado por meio de um sistema de cap-and-trade, em que fontes emissoras deverão respeitar limites de emissão ou compensar por meio da aquisição de créditos de carbono.

O sistema abrange atividades, fontes e instalações em todo o território nacional, com exceção da produção primária agropecuária.

Estava prevista uma cerimônia no Palácio do Planalto, mas cancelada em razão da internação do presidente Lula, em São Paulo, para tratar uma hemorragia no crânio. Ele já passou por duas cirurgias e está internado no hospital Sírio Libanês.

Segundo os médicos, Lula está acordado, em repouso relativo, e poderá despachar do hospital nos próximos dias. “Ele está normal, o exame neurológico é normal. Ele está muito bem [e] cognitivamente íntegro”, afirmou o neurologista Rogério Tuma, integrante da junta responsável pelos cuidados do presidente, na manhã de hoje.

Alterações visam a conter acúmulo de obrigações

Sem os vetos, foram mantidas alterações feitas a pedido de agentes do setor de energia. Foi imposto um limite às políticas de redução de emissões existentes e às que estão sendo criadas, com ajustes nas alocações (e seus custos) a partir da regulação do SBCE.

A redação final aprovada pelo Senado “veda qualquer tributação de emissão de gases do efeito estufa” de instalações reguladas no SBCE. No Congresso, foram excluídos detalhamentos que tratavam de despesas regulatórias ou extrafiscais.

Estarão sujeitos à regulação os operadores responsáveis por instalações e fontes que emitam acima de 10.000 tCO2e por ano para fins de monitoramento e relato, e acima de 25.000 tCO2e por ano para fins de conciliação de obrigações.

Foi uma tentativa de evitar que diferentes políticas sejam empilhadas, onerando a geração de energia. Ontem também foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) o parecer do senado para a reforma tributária, que mantém a aplicação de até 0,25% de Imposto Seletivo sobre a produção de petróleo e gás e até 1% sobre o carvão mineral.

Foi incluído um redutor, para reduzir a cobrança mediante medidas de mitigação de danos ambientais. Ainda assim, tanto geradores como setores do governo argumentam que a oneração de combustíveis vai desaguar em tarifas de energia elétrica, dado que não há uma perspectiva de chegar a uma matriz elétrica 100% renovável.

A articulação foi feita por agentes reunidos no Pensar Energia, think tank setorial.

A ideia original era compensar o empilhamento tributário provocado por medidas ambientais, desde programas como o RenovaBio até a criação do imposto seletivo sobre óleo e gás, sob argumento de que a elevação de custos recairá nas tarifas de energia de geradores termoelétricos e preços de combustíveis.

O Pensar Energia levou aos parlamentares uma estimativa de custo anual de R$ 11,35 bilhões para neutralizar as emissões de 55,6 milhões de toneladas de CO₂ equivalente (tCO₂e) na cadeia de energia; e de R$ 3,87 bilhões para neutralizar as emissões de 18,97 milhões de tCO₂e.

Conduzido pelo economista José Roberto Afonso, o estudo considera crédito equivalente a uma tonelada de carbono a R$ 205,11 – US$ 38,70, com câmbio dólar a R$ 5,30.

Plano Nacional de Alocação

Com a sanção, o mercado brasileiro de carbono passará por uma longa fase de regulamentação, que vai durar anos. A começar pela definição das metas setoriais, orientadas pelos compromissos do Acordo de Paris.

A governança do SBCE será composta pelo Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM), um órgão gestor e um Comitê Técnico Consultivo Permanente.

O CIM, como órgão deliberativo, estabelecerá as diretrizes gerais do SBCE, aprovará o Plano Nacional de Alocação e o plano anual de aplicação dos recursos do sistema.

O órgão gestor, por sua vez, será responsável por regular o mercado de ativos do SBCE, definir as atividades reguladas, implementar o Plano Nacional de Alocação, emitir as Cotas Brasileiras de Emissões (CBE) e realizar os leilões dos créditos.

Os ativos que serão negociados no SBCE são as CBEs e os Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVEs).

As CBEs representam o direito de emissão de uma tonelada de dióxido de carbono equivalente (tCO2e) e serão distribuídas pelo órgão gestor aos operadores regulados, de forma gratuita ou onerosa.

Os CRVEs, por outro lado, representam a efetiva redução ou remoção de uma tCO2e, seguindo metodologias credenciadas e registradas no SBCE.

O Plano Nacional de Alocação definirá, para cada período de compromisso, o limite máximo de emissões, a quantidade de CBEs a ser alocada, as formas de alocação, o percentual máximo de CRVEs admitido na conciliação de obrigações e outros dispositivos relevantes para a implementação do SBCE.

O plano deverá ter uma abordagem gradual entre os períodos de compromisso, ser aprovado com antecedência mínima de 12 meses e considerar a necessidade de garantir CBEs para novos operadores.

O órgão gestor do SBCE definirá os critérios para credenciamento de metodologias para geração de CRVEs, visando assegurar a credibilidade dos ativos, garantir a integridade ambiental e evitar a dupla contagem.

As metodologias serão compatíveis com as definições em tratados multilaterais e com os requisitos definidos pelo órgão gestor. O credenciamento de metodologias aplicáveis a territórios ocupados por povos indígenas e comunidades tradicionais dependerá da observância de salvaguardas socioambientais.

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