O Instituto Arayara protocolou, nesta quarta (6/12), três ações civis públicas com o objetivo de suspender a oferta de blocos nas bacias do Paraná (.pdf), Amazonas (.pdf) e Sergipe-Alagoas (.pdf), que serão ofertadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) em dezembro.
O argumento dos ambientalistas é que os blocos estão sobrepostos a unidades de conservação.
As novas ações se somam à outra, apresentada há duas semanas pela organização, que mira blocos na Bacia Potiguar (.pdf), no litoral do Rio Grande do Norte. Neste caso, a ação argumenta que há falhas nas análises técnica de viabilidade ambiental.
É também a bacia em que a Petrobras decidiu retomar a exploração, após um hiato de quase dez anos. O Ibama emitiu a licença em outubro.
Até o momento, 53 blocos são contestados, no total. O número deve aumentar, com mais ações que vão questionar a oferta de áreas que colocam em risco comunidades quilombolas.
“Mesmo que não haja uma decisão judicial, a gente espera que, com essas ações, os investidores e as empresas interessadas em adquirir esses blocos não o façam, porque existe muito risco jurídico para explorar, para investir num bloco que pode ficar anos sob litígio”, explica Nicole Figueiredo, diretora-executiva da Arayara.
Contra a expansão da fronteira exploratória de óleo e gás no país, o Arayara tem um longo histórico de contestações e atuação contra a produção de combustíveis fósseis.
O leilão será realizado pela ANP em 13 de dezembro, primeiro neste terceiro governo Lula, em que o presidente afirma que é de interesse do país expandir as fronteiras de óleo e gás, a despeito da pressão contrária de ambientalistas dentro e fora do governo.
No mesmo dia em que ingressaram com as ações, representantes do instituto se reuniram com o diretor-geral da agência, Rodolfo Saboia, para apresentar um estudo que faz o diagnóstico do risco socioambiental do 4º ciclo da oferta permanente.
“A gente tem cobrado bastante coerência por parte do governo brasileiro que, por um lado, traz um discurso de desenvolvimento sustentável e de uma necessidade de uma transição energética e, no dia seguinte, no final da COP, oferta 603 blocos para exploração de petróleo em áreas de novas fronteiras, que não precisariam ser expandidas”, afirma Nicole Figueiredo.
Na Bacia Potiguar, ação questiona análise de viabilidade ambiental
No caso da Bacia Potiguar, o Instituto questiona a oferta de 11 blocos. Afirma que a ANP utilizou um parecer técnico de 2018 para subsidiar o leilão, mas o documento não contempla as áreas em questão, localizadas no que seria uma área de influência de Fernando de Noronha e do arquipélago Atol das Rocas.
A avaliação ambiental de bacias sedimentares é um requisito estabelecido pela resolução 17/2017 do CNPE para as ofertas permanentes de campos e blocos.
A norma estabelece que, na ausência de estudos multidisciplinares, vale uma manifestação conjunta do Ministério de Minas e Energia e do Ministério do Meio Ambiente. Foi o que a ANP fez.
A agência utilizou uma manifestação conjunta de 2020 para embasar a oferta. A mesma utilizada na 17ª rodada de licitações, em 2021.
O documento faz referência a um parecer de 2019 da Diretoria de Licenciamento Ambiental do Ibama, que por sua vez remete a outro, de 2018 e que, de fato, analisa alguns blocos na Bacia Potiguar – mas não os 11 que constam no 4º ciclo de oferta permanente.
- A saber: POT-M-1040; POT-M-1042; POT-M-768; POT-M-770; POT-M-772; POT-M-774; POT-M-776; POT-M-861; POT-M-867; POT-M-954 e POT-M-956.
“Assim, logo de início o que se vê é que é muito embora haja a concordância do MME e MMA para oferecer os blocos objeto da presente ação civil pública, nenhum deles é analisado no parecer técnico que é utilizado como justificativa técnica”, argumenta o Instituto Arayara.
A ação foi protocolada inicialmente na 21ª Vara Federal de Pernambuco, mas acabou remetida para a seção do Rio Grande do Norte.
ANP: não houve falta de análise de viabilidade ambiental
A ANP afirma que segue as diretrizes da resolução 17/2017 do CNPE, que prevê a possibilidade de apresentação de manifestação conjunta do MME e MMA para a oferta de áreas cujos estudos ainda não tenham sido concluídos.
O parecer técnico do Grupo de Trabalho Interinstitucional de Atividades de Exploração e Produção de Óleo e Gás (GTPEG), de 2018, “não apresentou objeções à oferta dessas áreas”, afirma a ANP, citando o setor em águas profundas que reúne todas as áreas da região.
O GTPEG é um grupo que reúne técnicos da área ambiental que fazem a interlocução com MME nas análises dos projetos de óleo e gás. Foi criado por Marina Silva (Rede) nos primeiros governos Lula e restituído em outubro – havia acabado no governo de Jair Bolsonaro (PL), em 2019.
Em 2018, o grupo “não apresentou objeções à oferta dessas áreas, desde que observadas as contribuições apontadas na fase de licenciamento ambiental federal”, diz a ANP. “Dessa forma, a rodada atende perfeitamente aos comandos legais”.
Na nova composição, passou a ter sete membros da pasta, mais que o dobro da composição original, além do Ibama e ICMBio. O Política por Inteiro faz um comparativo entre o grupo original e o atual.
A agência ressalta que a inclusão dos blocos nas rodadas de licitações “não significa aprovação tácita para o licenciamento ambiental”.
Isso porque as análises prévias do governo não se sobrepõem ao licenciamento ambiental, providenciado pelas empresas junto ao Ibama, quando o projeto é marítimo.
“Todas as atividades que as concessionárias venham a executar nas áreas demandarão detalhado processo de licenciamento ambiental, o qual será conduzido pelo órgão ambiental competente”, conclui a ANP.
Ecossistemas sensíveis
Outro argumento apresentado pelo Arayara é baseado nas características da região de Fernando de Noronha e do arquipélago Atol das Rocas, com ecossistemas sensíveis e importantes para a biodiversidade brasileira.
A ACP afirma que, em setembro de 2021, a Assembleia Legislativa de Pernambuco realizou audiência pública para discutir a inclusão da Bacia Potiguar na 17ª rodada.
Cita um momento em que o então coordenador geral da Superintendência de Tecnologia e Meio Ambiente da ANP, Nilce Olivier Costa, se disse surpreso “que geólogos da ANP tenham colocado uma área de possível exploração e produção sobre um cone vulcânico”. Veja o vídeo
E conclui classificando como “absoluto contrassenso com a realidade de emergência climática” a expansão da exploração de petróleo e gás.
“A instituição não questiona o certame como um todo”, explica o diretor da Arayara, Juliano Araújo. “Nós questionamos erros técnicos da agência ou não cumprimento legal e que, obviamente, impactará setores da economia, como a pesca, o turismo e a biodiversidade”.
Para ele, a exploração da área não é viável por diversos motivos que perpassam questões econômicas e ambientais: “Iniciou-se a atividade de prospecção e perfuração. O estado só vai ter retorno econômico do primeiro barril de petróleo daqui a oito, dez anos.
Vamos pensar o mundo daqui a dez anos, considerando que a crise climática que se estabelece hoje no Brasil e no mundo continue se repetindo ano após ano (…) Quando esses blocos estiverem na sua fase de produção você vai estar num momento em que a demanda vai ser outra”.