Entidades ambientalistas, contrárias à sanção, consideram que os vetos atingiram pontos de maior preocupação, mas há brechas e os artigos rejeitados podem ser retomados. As mudanças ainda desagradaram os estados, que buscavam maior autonomia nos processos de licenciamento.
A Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema) considera que o veto de dispositivos que transferiam a responsabilidade de estabelecer critérios e procedimentos de licenciamento a estados e municípios “pode representar um retrocesso na descentralização da política ambiental”.
O projeto final também não deve resolver plenamente os problemas que o licenciamento enfrenta hoje, segundo Talden Farias, professor de Direito Ambiental das Universidades Federais de Pernambuco e da Paraíba. “É um remédio pobre, não trata de questões climáticas, de integração de dados”, avalia.
A ONG SOS Mata Atlântica comemorou o veto ao artigo 66, que poderia flexibilizar a aplicação da lei do bioma.
“Não poderíamos agora, às vésperas da COP30, perder essa legislação”, declarou Malu Ribeiro, diretora de políticas públicas da organização. Para a especialista em conservação do WWF-Brasil Ana Carolina Crisostomo, os vetos atendem “ao clamor da sociedade”.
Mas a decisão não agrada a todos os críticos do projeto. A própria WWF fez um abaixo-assinado com mais de 1 milhão de assinaturas pedindo o veto integral.
A Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) também defendeu a rejeição total, assim como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. No Congresso, a Frente Parlamentar Mista Ambiental fala em “freio parcial à boiada”.
Procuradas, entidades do setor produtivo como a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) não haviam comentado o assunto até a publicação deste texto. Mesmo dentro do governo, havia divisões: ministérios como o da Agricultura defendiam vetos bem pontuais.
Lula
O presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez uma postagem nas redes sociais: “Esses vetos asseguram que o licenciamento seja um instrumento de desenvolvimento com responsabilidade, mantendo critérios técnicos sólidos e o respeito à nossa Constituição. Ao mesmo tempo, estamos enviando ao Congresso Nacional, com urgência, um novo projeto de lei que propõe ajustes na redação de pontos essenciais. E uma MP que trata dos projetos estratégicos”.
Marina elogia vetos de Lula
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), elogiou no sábado (9/8) os 63 vetos feitos pelo presidente Lula ao projeto de lei que flexibiliza as regras de licenciamento ambiental.
Segundo ela, os vetos — entre quase 400 itens — foram defendidos por sua pasta.
“Foram os vetos que nós trabalhamos. O tempo todo eu dizia que iríamos fazer vetos que fossem estruturantes, para preservar a figura jurídica do licenciamento ambiental, a integridade do licenciamento ambiental. E com os vetos feitos, nós conseguimos”, disse Marina, que participou de evento sobre a COP com centenas de jovens no Sesc Pinheiros, na zona oeste de São Paulo.
Ao longo do evento, a ministra ouviu críticas sobre a sanção do projeto — manifestações nas últimas semanas pediam o veto total ao texto, apelidado pelos críticos de “PL da Devastação”.
Segundo Marina, a sanção do presidente com vetos garante a proteção dos direitos dos povos indígenas, segurança jurídica aos empreendimentos e, ao mesmo tempo, incorpora inovações apresentadas pelo Congresso. O Legislativo ainda decidirá se mantém ou derruba os vetos.
Entre os pontos barrados por Lula, estão a licença autodeclaratória para atividades de potencial médio de poluição e a retirada do regime de proteção da Mata Atlântica.
O governo manteve, porém, itens polêmicos, como a Licença Ambiental Especial (LAE), proposta pelo senador Davi Alcolumbre (União/AP). A LAE prevê procedimento célere para empreendimentos considerados estratégicos pelo Conselho de Governo.
Questionada, a ministra minimizou as críticas ao procedimento. Segundo ela, ainda que possa haver priorização a determinados projetos, o licenciamento continuará faseado, com licença prévia, licença de instalação e licença de operação. A versão original previa a emissão das licenças em uma só fase, o que foi vetado pelo Executivo.
“Esses instrumentos novos já existem na prática — as obras do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) já priorizam empreendimentos, e aí você mobiliza equipes para que ganhem mais celeridade, mas sem perda de qualidade”, argumenta ela.
“As novidades são duas. A primeira é o prazo de 12 meses para manifestação do órgão licenciador. A manifestação não é obrigação da licença porque, ao analisar o pedido, pode-se concluir que o projeto não é viável”, disse a ministra.
“A outra novidade é que a decisão passa pelo conselho (de governo). Hoje, essa priorização é feita bilateralmente, com o ministro da pasta dialogando com o centro de governo”, acrescentou.
Perguntada sobre a crítica de que a Licença Ambiental Especial pode acelerar a prospecção de petróleo pela Petrobras na Margem Equatorial da Foz do Rio Amazonas, defendida por Alcolumbre, a ministra respondeu que procura não “fulanizar” a discussão.
“O conselho não foi regulamentado, terá de ser regulamentado”, disse. Segundo ela, o interesse estratégico precisará ser justificado tecnicamente dentro do conselho. “Não pode só chegar e dizer que ‘meu projeto é prioritário porque quero fazer o meu projeto e achei melhor encaminhar por aqui’. E vai passar pelo crivo de todos os ministérios”, afirmou.
Sem citar Alcolumbre, a ministra ainda completou: “Pode até ser que a intenção do proponente, e não estou entrando em juízo de valor, possa ter sido associada a algum empreendimento específico. Mas a forma como o governo apresentou a alteração no projeto de lei, que espelhou na medida provisória (Lula editou uma MP para propor no texto para a Licença Ambiental Especial), é algo não fulanizado. Fulanizado, leia-se, Margem Equatorial, leia-se 319 (a BR, que liga Manaus a Porto Velho, e cuja licença para a pavimentação de um trecho foi parar na Justiça)”.
Com informações do jornal O Estado de S. Paulo.