Enquanto os líderes partidários não chegam a um acordo sobre o início dos trabalhos das comissões permanentes da Câmara dos Deputados, a indefinição atrasa a agenda de projetos do setor de energia, vistos como prioritários para o governo.
Ontem a novela que arrasta o início dos trabalhos na comissão teve um novo capítulo com as incertezas atingindo também a primeira reunião da comissão especial criada para discutir a proposta do governo de privatização da Eletrobras, a comissão da MP 814. Responsável por tocar os trabalhos da comissão até a indicação de um presidente, o deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP) atendeu a um pedido do colega Arlindo Chinaglia (PT-SP) para que a comissão só seja instalada quando as comissões permanentes da Câmara também iniciarem seus trabalhos. O PT é contrário à privatização da Eletrobras.
Além da privatização da Eletrobras, projetos como o da Cessão Onerosa (PL 8.939/2017) e a Nova Lei do Gás (PL 6.407/2013) estão parados na casa, à espera de votações em comissões como a de Minas e Energia, Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços e Constituição, Justiça e Cidadania.
A decisão de Marquezelli desagradou o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que se vê de mãos atadas frente ao impasse com as bancadas dos partidos enquanto dura a janela de transferência partidária. Pré-candidato ao Planalto, Maia tem feito declarações públicas defendendo que as comissões sejam instaladas antes do fim da janela, o que só vai ocorrer em 7 e abril. Mas o atraso na instalação é defendido por líderes partidários que temem que seus partidos percam também as vagas mais importantes nas comissões com a mudança de sigla de parlamentares.
Planalto deixa articulação com o Congresso para segundo plano
Desde a desistência do governo em votar a reforma da previdência, o Palácio do Planalto deixou em segundo plano as articulações com o Congresso. Ao contrário, enquanto a janela partidária permanece aberta, o governo aproveita para tocar calmamente sua última reforma ministerial para não precisar lidar no futuro próximo com ministros que não tenham apoio de suas bancadas no Congresso.
Enquanto isso, Temer optou por mudar o foco, e ao perceber que não teria os votos para a reforma antes da eleição de outubro, abraçou a agenda da segurança pública como sua principal bandeira na reta final do governo e pôs em prática a intervenção no estado do Rio de Janeiro. Com apenas 4,3% de avaliação positiva e o recorde de 73% de avaliação negativa e apenas 0,4% de intenção de votos nas pesquisas (segundo pesquisa CNT/MDA divulgada nesta terça, dia 6), Temer recorreu à segurança como uma agenda popular e que não depende tanto das relações com o Congresso.
O governo é consciente de que a baixa popularidade registrada nas pesquisas interfere mais diretamente nos votos de congressistas em anos eleitorais e sabe que votações impopulares no parlamento sofrem a ameaça de naufragar mesmo nas mãos de sua sabe aliada – como aconteceu com a reforma da previdência na última semana de trabalhos do Congresso de 2017 por um ato do presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB). Nesse cenário, o Planalto deve ficar atento também aos movimentos de parlamentares do DEM, que acalenta a possibilidade de lançar Rodrigo Maia à presidência.
Movimentos do DEM em pautas do setor de energia preocupam governo
O partido de Rodrigo Maia tem sido a sigla mais interessada nas matérias do setor de energia. O interesse faz parte da estratégia do DEM de apresentar uma agenda positiva própria para a economia, baseada em projetos que destravem investimentos. A estratégia do partido é identificar o DEM e Rodrigo Maia como os responsáveis diretos por pautas positivas concretas que falem ao empresariado na eleição presidencial de outubro. Mas nem todos os movimentos do DEM agradam ao governo.
Em dezembro, Rodrigo Maia aprovou um requerimento de seu correligionário, José Carlos Aleluia (DEM-BA) pedindo a do Projeto de Lei 6.407/2013, o PL da Nova Lei do Gás, para análise na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (CDEICS). Com isso, o projeto terá passar por mais uma comissão, atrasando sua tramitação.
Aleluia é também o relator da MP da privatização da Eletrobras. Ontem o deputado defendeu que privatização da estatal destine R$ 1 bilhão por ano para investimentos na revitalização do Rio São Francisco. O valor é bem superior ao pretendido originalmente pelo governo (R$ 350 milhões). As movimentações de Aleluia no projeto de privatização da Eletrobras preocupam o governo – sobretudo o Ministério de Minas e Energia – que via na proposta a chance de arrecadar para os cofres do Tesouro Nacional R$ 12,2 bilhões este ano.
Entenda o recesso parlamentar
Ao todo a Câmara tem 25 comissões permanentes compostas por indicações dos partidos de acordo com o tamanho de suas bancadas e dos blocos partidários formados no início da legislatura (no caso, no início do ano de 2015).
Virtualmente, a demora na instalação das comissões da Câmara encurta ainda mais o ano legislativo na casa – pelo menos no que tange à apreciação de projetos que dependem de votação nas comissões. Segundo a Constituição, o recesso do Congresso ocorre entre 22 de dezembro e 2 de fevereiro e novamente de 17 de julho a 1º de agosto. Mas por ser um ano eleitoral, os trabalhos regulares do congresso em 2018 devem ser interrompidos pelo chamado “recesso branco”, a licença que os presidentes do Senado e da Câmara dão aos parlamentares sem cobrar faltas, durante os meses de setembro e outubro. Com a possível mudança de governo após as eleições de outubro, tampouco são esperadas votações importantes no mês de novembro e na primeira quinzena de dezembro, antes do início do recesso de fim de ano.