Impasse perto do fim

Congresso avança em acordo para destravar marco do mercado de carbono

Após quase um ano de negociações e reclamações dos dois lados, Senado e Câmara finalmente avançaram para um acordo em relação ao texto projeto de lei que cria o mercado brasileiro e regulado de carbono. 

09.07.2024 - Senadora Leila Barros e senador Rodrigo Pacheco, durante sessão deliberativa no Senado Federal
09.07.2024 - Senadora Leila Barros e senador Rodrigo Pacheco, durante sessão deliberativa no Senado Federal | Waldemir Barreto/Agência Senado

BRASIL – Após quase um ano de negociações e reclamações dos dois lados, Senado e Câmara finalmente avançaram para um acordo em relação ao texto projeto de lei que cria o mercado brasileiro e regulado de carbono

Segundo previsão do líder do governo no Senado, Otto Alencar (PSD/BA), após o fechamento do acordo, o projeto será apreciado em plenário até o fim de novembro, possivelmente antes do encerramento da COP 29, que será realizada no Azerbaijão.

A previsão mais otimista é que a proposta entre na pauta do plenário do Senado na semana que vem. Posteriormente, o projeto retorna à Câmara dos Deputados.

Nesta quinta (24/10), a tramitação do PL 412/2022 foi oficialmente encerrada no Senado Federal. E a discussão será feita por meio de um texto da Câmara, que dá aos deputados a palavra final, antes do envio à sanção. 

O acordo entre os congressistas envolvidos com o tema começou a ganhar corpo em uma reunião na quarta (23/10).

Além do líder governista, participaram da agenda o senador Efraim Filho (União/PB), aliado de Davi Alcolumbre (União/AP); e os relatores da matéria, o deputado Aliel Machado (PV/PR) e a senadora Leila Barros (PSB/DF).

O governo federal também participa das articulações, que envolvem o Ministério da Fazenda e Meio Ambiente.

Créditos de carbono de comunidades tradicionais

De acordo com Efraim, as pendências hoje se resumem a “ajustes pontuais”, a exemplo de padrões jurisdicionais, diretrizes dos mercados regulado e voluntário, natureza jurídica do fruto civil e a inclusão ou não de uma “proteção” a indígenas e quilombolas.

Aliel Machado, por sua vez, explicou que ele e o governo federal possuem visões divergentes sobre os direitos das comunidades tradicionais no regramento do futuro sistema brasileiro de comercialização de emissões.

O deputado quer fixar no marco regulatório regra que destina “percentual mínimo” de lucros obtidos com a venda de créditos às populações cujos territórios são explorados nos respectivos projetos. O governo, por sua vez, deseja que isso fique para depois, para ser regulamentado por decreto.

“O governo defende não ter um percentual mínimo de proteção, e nós defendemos que tem que ter um percentual mínimo de proteção. O desenvolvimento de projetos nessas áreas precisa garantir o mínimo de recursos que precisam ficar para essas comunidades”, afirmou Aliel.

“Acontece que, por regulamentação, [o quadro] pode ser alterado a qualquer momento, dependendo do governo de plantão. Defendemos que isso tem que estar na lei”, disse.

Na busca por uma redação consensual, o texto vai passar pela Secretaria de Relações Institucionais (SRI), do ministro Alexandre Padilha (PT), a fim de evitar vetos presidenciais. O Planalto sinalizou que vai se comprometer com um acordo acerto do Legislativo.

“Dá para votar [durante o mês de novembro]. Quando se tem consenso no texto, vota-se rápido. Em 24 horas você vota na Câmara e no Senado”, comentou Aliel. “São questões pontuais agora, as divergências já foram bem maiores”, concluiu.

“Crédito de carbono é sobre aquilo que foi absorvido”

O relator do PL do mercado de carbono na Câmara declarou que não pretende ceder em relação aos limites da venda futura.

Na visão dele, a ideia é que o texto seja preservado nesse sentido, isto é, a possibilidade de os governos estaduais comercializarem créditos de uma determinada área até que o proprietário da terra manifeste a intenção de desenvolver o seu próprio projeto.

“Isso vale tanto para as comunidades quanto para o proprietário privado. (…) Existem, por exemplo, áreas pequenas. Pequenas propriedades onde não vale a pena desenvolver um projeto único. Portanto, é injusto você retirar do governo essa possibilidade [de venda futura]. Então, estamos garantindo aqui que todos sejam contemplados.”

“Os governos serão contemplados, para desenvolver os seus projetos de proteção ambiental, mas não estamos abrindo mão aqui de proteger a propriedade privada, tanto das comunidades indígenas, dos quilombolas, dos assentamentos, quanto dos proprietários que têm as suas terras.”

Indústrias buscam evitar viés arrecadatório no mercado regulado de carbono, afirma Aliel Machado (PV/PR), relator do PL 416/22 na Câmara (Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados)
Relator do mercado de carbono na na Câmara, Aliel Machado (Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados)

Inversão da tramitação dá mais poder à Câmara

Há um ano, o Senado Federal aprovou o PL 412/2022, sob relatoria de Leila Barros e construído sobre um texto enviado pelo governo federal. Na Câmara – e com aval de Arthur Lira (PP/AL) – o texto do Senado foi rejeitado, por mais que o conteúdo tenha sido aproveitado no relatório de Aliel Machado. 

As casas legislativas estavam nesse impasse desde fevereiro, inclusive sob ameaças de judicialização. 

A Câmara dos Deputados argumentava que ao enviar um texto diretamente para o Senado Federal, o governo extrapolou o papel da articulação. Pela Constituição Federal, a tramitação de propostas do Executivo devem ser iniciadas na Câmara dos Deputados, tese rejeitada pelo Senado.
Pelo quarto ano consecutivo, o Brasil tenta aprovar um marco legal para o mercado regulado de carbono a tempo da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, onde líderes globais discutem políticas e acordos para limitar o aquecimento do planeta.

Chegar com a notícia da criação do seu mercado regulado é uma forma de sinalizar comprometimento com a descarbonização de sua economia, buscar investimentos e se posicionar como autoridade nas negociações em torno de um mecanismo global de precificação de emissões.

A ideia do projeto é criar um limite de emissões de gases do efeito estufa para as empresas. Quem ultrapassar compensa suas emissões com a compra de títulos. Quem ficar abaixo ganha cotas a serem vendidas no mercado.