BRASIL – Após quase um ano de negociações e reclamações dos dois lados, Senado e Câmara finalmente avançaram para um acordo em relação ao texto projeto de lei que cria o mercado brasileiro e regulado de carbono.
Segundo previsão do líder do governo no Senado, Otto Alencar (PSD/BA), após o fechamento do acordo, o projeto será apreciado em plenário até o fim de novembro, possivelmente antes do encerramento da COP 29, que será realizada no Azerbaijão.
A previsão mais otimista é que a proposta entre na pauta do plenário do Senado na semana que vem. Posteriormente, o projeto retorna à Câmara dos Deputados.
Nesta quinta (24/10), a tramitação do PL 412/2022 foi oficialmente encerrada no Senado Federal. E a discussão será feita por meio de um texto da Câmara, que dá aos deputados a palavra final, antes do envio à sanção.
O acordo entre os congressistas envolvidos com o tema começou a ganhar corpo em uma reunião na quarta (23/10).
Além do líder governista, participaram da agenda o senador Efraim Filho (União/PB), aliado de Davi Alcolumbre (União/AP); e os relatores da matéria, o deputado Aliel Machado (PV/PR) e a senadora Leila Barros (PSB/DF).
O governo federal também participa das articulações, que envolvem o Ministério da Fazenda e Meio Ambiente.
Créditos de carbono de comunidades tradicionais
De acordo com Efraim, as pendências hoje se resumem a “ajustes pontuais”, a exemplo de padrões jurisdicionais, diretrizes dos mercados regulado e voluntário, natureza jurídica do fruto civil e a inclusão ou não de uma “proteção” a indígenas e quilombolas.
Aliel Machado, por sua vez, explicou que ele e o governo federal possuem visões divergentes sobre os direitos das comunidades tradicionais no regramento do futuro sistema brasileiro de comercialização de emissões.
O deputado quer fixar no marco regulatório regra que destina “percentual mínimo” de lucros obtidos com a venda de créditos às populações cujos territórios são explorados nos respectivos projetos. O governo, por sua vez, deseja que isso fique para depois, para ser regulamentado por decreto.
“O governo defende não ter um percentual mínimo de proteção, e nós defendemos que tem que ter um percentual mínimo de proteção. O desenvolvimento de projetos nessas áreas precisa garantir o mínimo de recursos que precisam ficar para essas comunidades”, afirmou Aliel.
“Acontece que, por regulamentação, [o quadro] pode ser alterado a qualquer momento, dependendo do governo de plantão. Defendemos que isso tem que estar na lei”, disse.
Na busca por uma redação consensual, o texto vai passar pela Secretaria de Relações Institucionais (SRI), do ministro Alexandre Padilha (PT), a fim de evitar vetos presidenciais. O Planalto sinalizou que vai se comprometer com um acordo acerto do Legislativo.
“Dá para votar [durante o mês de novembro]. Quando se tem consenso no texto, vota-se rápido. Em 24 horas você vota na Câmara e no Senado”, comentou Aliel. “São questões pontuais agora, as divergências já foram bem maiores”, concluiu.
“Crédito de carbono é sobre aquilo que foi absorvido”
O relator do PL do mercado de carbono na Câmara declarou que não pretende ceder em relação aos limites da venda futura.
Na visão dele, a ideia é que o texto seja preservado nesse sentido, isto é, a possibilidade de os governos estaduais comercializarem créditos de uma determinada área até que o proprietário da terra manifeste a intenção de desenvolver o seu próprio projeto.
“Isso vale tanto para as comunidades quanto para o proprietário privado. (…) Existem, por exemplo, áreas pequenas. Pequenas propriedades onde não vale a pena desenvolver um projeto único. Portanto, é injusto você retirar do governo essa possibilidade [de venda futura]. Então, estamos garantindo aqui que todos sejam contemplados.”
“Os governos serão contemplados, para desenvolver os seus projetos de proteção ambiental, mas não estamos abrindo mão aqui de proteger a propriedade privada, tanto das comunidades indígenas, dos quilombolas, dos assentamentos, quanto dos proprietários que têm as suas terras.”
Inversão da tramitação dá mais poder à Câmara
Há um ano, o Senado Federal aprovou o PL 412/2022, sob relatoria de Leila Barros e construído sobre um texto enviado pelo governo federal. Na Câmara – e com aval de Arthur Lira (PP/AL) – o texto do Senado foi rejeitado, por mais que o conteúdo tenha sido aproveitado no relatório de Aliel Machado.
As casas legislativas estavam nesse impasse desde fevereiro, inclusive sob ameaças de judicialização.
A Câmara dos Deputados argumentava que ao enviar um texto diretamente para o Senado Federal, o governo extrapolou o papel da articulação. Pela Constituição Federal, a tramitação de propostas do Executivo devem ser iniciadas na Câmara dos Deputados, tese rejeitada pelo Senado.
Pelo quarto ano consecutivo, o Brasil tenta aprovar um marco legal para o mercado regulado de carbono a tempo da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, onde líderes globais discutem políticas e acordos para limitar o aquecimento do planeta.
Chegar com a notícia da criação do seu mercado regulado é uma forma de sinalizar comprometimento com a descarbonização de sua economia, buscar investimentos e se posicionar como autoridade nas negociações em torno de um mecanismo global de precificação de emissões.
A ideia do projeto é criar um limite de emissões de gases do efeito estufa para as empresas. Quem ultrapassar compensa suas emissões com a compra de títulos. Quem ficar abaixo ganha cotas a serem vendidas no mercado.