A Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que cria o crime qualificado de furto ou roubo de petróleo, gás natural e outros combustíveis. A proposta será enviada ao Senado.
De autoria do deputado Juninho do Pneu (União/RJ), o Projeto de Lei 1482/2019 foi aprovado na terça-feira (2/9) com substitutivo do relator, deputado Ricardo Abrão (União/RJ). O texto do relator também cria novos crimes contra a ordem econômica relacionados à receptação desses produtos roubados.
No caso do furto, a pena será de reclusão de 4 a 10 anos, a mesma para casos em que são usados explosivos em qualquer outro tipo de furto.
A pena será aumentada de 1/3 se o crime for praticado por duas ou mais pessoas, com abuso de confiança, valendo-se de vínculo atual ou passado (ex-empregado, por exemplo) com a empresa prejudicada ou se o criminoso for ocupante de cargo, emprego ou função pública.
O aumento de 1/3 valerá ainda se a extração do produto depender da destruição ou rompimento de obstáculo para acessar o combustível.
O aumento da pena será de 2/3 quando do crime resultar a suspensão ou a paralisação das atividades do estabelecimento, incêndio, poluição efetiva ou potencial ao meio ambiente, desabastecimento, lesão corporal grave ou morte.
Roubo
Em relação ao roubo, cuja pena padrão já é de 4 a 10 anos e multa, o projeto prevê o aumento de 1/3 à metade para combustíveis. O aumento de 2/3 será para os mesmos casos citados no furto.
Em ambos os crimes (furto e roubo), a caracterização engloba a subtração de petróleo e derivados, gás natural e suas frações recuperáveis, álcool etílico hidratado carburante e demais combustíveis líquidos carburantes, biocombustíveis e óleos lubrificantes.
A subtração pode ser de estabelecimentos de produção ou de qualquer instalação de armazenamento e de transporte de combustíveis, incluindo dutos e unidades de transporte em qualquer modal.
Ordem econômica
Dois novos crimes contra a ordem econômica são incluídos na Lei 8.176/91 mirando os receptadores desses produtos quando souberem ser produto de crime ou presumir que o sejam.
Assim, estão sujeitos a reclusão de 3 a 8 anos e multa, quem receber, transportar, armazenar ou vender esses combustíveis. Para efeito legal, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência, será equiparado à atividade comercial.
O crime é punível ainda que o autor do roubo ou furto seja desconhecido ou isento de pena.
Com pena de reclusão de 1 a 4 anos e multa, também será crime contra a ordem econômica adquirir, receber ou manter em estoque esses combustíveis em proveito próprio ou alheio quando houver condições de o acusado ter presumido que foram obtidos por meio criminoso, seja por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço ou pela condição de quem os oferece.
O crime também será punível ainda que o autor do outro crime que originou o combustível ofertado (furto, roubo, etc.) seja desconhecido ou isento de pena.
No entanto, se o agente for réu primário, o juiz pode diminuir a pena de 1/3 a 2/3 ou deixar de aplicar a multa em razão das circunstâncias e das consequências do crime.
Cargo público
Quanto ao empregado ou servidor público, o projeto prevê como efeito da condenação a perda do cargo, da função ou do emprego público, com a inabilitação para o seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.
Será autorizada ainda a venda antecipada do bem apreendido para preservação do valor sempre que estiver sujeito a qualquer grau de deterioração ou depreciação ou quando houver dificuldade para sua manutenção.
Riscos de contaminação
O relator, deputado Ricardo Abrão, afirmou que a prática oferece riscos como contaminação ambiental, de corpos d’água, desabastecimento de centros urbanos, interrupção do fornecimento de combustíveis e até mortes. “Práticas ilícitas nessa seara são capazes de distorcer o mercado e criar graves riscos à incolumidade pública”, disse.
Segundo Abrão, o furto de combustíveis é uma operação extremamente perigosa devido às altas pressões envolvidas e às propriedades químicas dos produtos (inflamáveis, tóxicos e explosivos).
“Essas subtrações são realizadas de forma amadora, o que eleva o potencial de risco da ação, expondo as comunidades próximas a possíveis explosões e mortes, o meio ambiente aos impactos decorrentes de vazamentos e a sociedade consumidora ao desabastecimento”, declarou.
Anualmente, são furtados aproximadamente 14,2 milhões de litros de combustíveis dos oleodutos da Transpetro, operadora de dutos da Petrobras, segundo dados do Ministério Público citados por Abrão.
O autor do projeto, deputado Juninho do Pneu, afirmou que a proposta busca coibir uma prática “tão dolosa” para o país. “O projeto visa, além da segurança de quem vive próximo aos dutos, evitar desastre ambientais e sobrepreço no valor dos combustíveis”, disse.
Iniciativas paradas no Congresso
A tipificação do crime de furto e receptação de petróleo e derivados está parada no Congresso.
Além do PL de Juninho do Pneu, a proposta de autoria da então senadora e atual ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet (MDB/MS) estacionou. O texto chegou a ser aprovado em 2017 no Senado, mas a tramitação não avança na Câmara desde 2020.
O projeto estabelece uma gradação na punição que vai sendo aumentada conforme a gravidade do crime. A pena varia de um a cinco anos de reclusão e multa, podendo chegar a até 30 anos de cadeia, caso o delito provoque morte.
Flávio Bolsonaro (PL/RJ), no Senado, e Hélio Lopes (PL/RJ), na Câmara, também apresentaram projetos sobre o tema. No caso de Lopes, ele propõe tratar a prática como crime hediondo. A proposta de Flávio Bolsonaro difere da de Tebet na dosimetria da pena e na determinação dos agravantes. O senador fluminense prevê pena maior, mas não estabelece agravamento para casos específicos.
Sem uma tipificação específica, julgamentos recentes de criminosos que furtaram óleo ou combustíveis resultaram em condenações por associação criminosa e furto qualificado por crimes cometidos no Rio de Janeiro e no Distrito Federal.
É o caso dos suspeitos presos em operação do Ministério Público e Polícia Civil do Rio de Janeiro, realizada na quarta-feira (2/7). Os agentes cumpriram dois mandados de prisão preventiva e de busca e apreensão em endereços no Rio de Janeiro e em Minas Gerais. O alvo de um terceiro mandado de prisão é considerado foragido.
O grupo é acusado de furtar petróleo bruto de duto da Transpetro, em agosto do ano passado, na região de Rio das Flores (RJ), utilizando veículos alugados em nome de terceiros.
“Pena adequada à gravidade”
Segundo o gerente executivo de proteção de dutos da Transpetro, Júlio Barreto, independente de qual projeto de lei prospere, o importante é tipificar o crime para que haja uma pena adequada à gravidade do crime cometido.
“A expectativa é de que isso [a tramitação dos PLs] venha a avançar, sim. Até porque mudam os legisladores e a gente vai continuar esse trabalho de sensibilização e de contato com esses parlamentares, mostrando a importância dessas medidas”, disse Barreto.
O gerente da Transpetro reforçou, ainda, que seja qual for a composição do Congresso, o crime e o risco para a sociedade são os mesmos.
Os crimes cometidos envolvendo furto a dutos da companhia vem de uma curva decrescente desde 2020, quando foram registrados 201 casos. No ano seguinte, foram 102. Em 2022, foram 58 ocorrências; 28 em 2023 e 25 no ano passado.
A Transpetro implementou tecnologias para detectar as ações clandestinas por meio do Centro Nacional de Controle e Logística (CNCL). Também tem um canal direto com a população que vive no entorno dos ativos e recebe denúncias por telefone 24 horas por dia na central 168.
A companhia orienta entrar em contato com o disque denúncia ao constatar:
- Atividades noturnas nas faixas de dutos
- Cheiro forte de combustível na área
- Carros e pessoas com mangueiras e equipamentos
- Obras e construções próximas à faixa
- Pessoas trabalhando na faixa sem o uniforme da Transpetro
- Caminhões de combustíveis perto dos dutos
- Tratores e veículos pesados nas proximidades
Rota do crime e regiões mais afetadas
Por se tratar da região com a maior malha de dutos da empresa, os estados de São Paulo e Rio de Janeiro são os mais afetados. Os criminosos optam por faixas de dutos menos movimentados e instalam válvulas ligando o duto a caminhões.
Por se tratar de produto inflamável e contaminante, a depender da geografia onde o furto ocorre e de vazamentos que podem ocorrer após a prática do crime, a remediação dos danos ao solo e cursos d’água pode levar meses.
Com informações da Agência Câmara.