O desastre provocado pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho promete causar impacto no debate sobre alterações na legislação de licenciamento ambiental no Congresso. Desde o rompimento da barragem no Córrego do Feijão, na tarde da sexta-feira 25 de janeiro, deputados e senadores da base aliada e da oposição aproveitaram o espaço das redes sociais para registrar uma série de promessas que vão na direção de endurecer as punições para empresas responsáveis por acidentes dessa magnitude e no fortalecimento dos órgãos de fiscalização.
As dezenas de postagens, feitas por parlamentares de todos os matizes, mostram que o debate acerca da Lei Geral do Licenciamento Ambiental (PL 3729/2004), em tramitação na Câmara, será mais duro do que esperava a base governista. O PL é a prioridade da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), como é conhecida formalmente a bancada ruralista – principal grupo de apoio do presidente no Congresso nesse começo de mandato.
A bancada espera que o governo retome o debate sobre o texto ainda no primeiro semestre, como afirmou à epbr em outubro passado a então deputada e presidente da FPA Tereza Cristina, hoje ministra da Agricultura.
Nas últimas semanas, o Político, por +epbr, serviço exclusivo de dados e informação da epbr, mostrou que a Lei Geral do Licenciamento Ambiental entrou no radar do Ministério de Minas e Energia, que pretende acompanhar a tramitação do texto de perto. A Lei Geral também foi tema de reunião da FPA com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. O encontro aconteceu em 23 de janeiro, dois dias antes do desastre de Brumadinho.
Parlamentares que acompanham o debate sobre licenciamento ambiental afirmam que o desastre de Brumadinho deve arrefecer o ímpeto daqueles que pretendem alterar regras de licenciamento neste momento. A expectativa é que a pressão da opinião pública contribua para impedir alterações na legislação.
“O governo quer mexer nisso para fragilizar a regulamentação, mas eu acho difícil avançar com uma pauta dessa seguir depois de um desastre dessa magnitude”, disse à epbr um deputado. “Como alguém vai defender um negócio desse em um momento em que registramos 300 mortes?”
Líder da Frente Parlamentar Ambientalista, Alessandro Molon (PSB/RJ) afirmou à reportagem que a bancada vai lutar no sentido contrário, buscando reforçar a rigidez da legislação.
“A nossa luta será para tornar a legislação sobre barragens mais rigorosa e impedir qualquer afrouxamento da legislação ambiental”, afirmou Molon.
Na legislação sobre barragens, o deputado cita duas iniciativas que devem ser abraçadas pela frente ambientalista: a proibição de construção de barragens de rejeito à montante em encostas e um texto que preveja prazos mais rigorosos para descomissionamento dessas barragens.
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Tramitação da Lei Geral do Licenciamento Ambiental
Com a virada do ano e o começo da atual legislatura o PL 3729/2004 foi arquivado na Câmara. Mas o texto pode ser desengavetado no prazo de 180 a partir da primeira sessão legislativa ordinária, ou seja, a última terça-feira, 05 de fevereiro. O PL tem 15 autores e foi apensado a outros 21 projetos. O desarquivamento por ser solicitado por autores de qualquer um dos 22 projetos de lei que tramitam em conjunto.
O PL 3729/2004 foi proposto originalmente pela bancada do PT. Mas a redação passou por diversas alterações nos últimos 15 anos. A última versão conta com a oposição de ambientalistas, grande parte dos partidos de esquerda e parte dos parlamentares de centro.
Texto alternativo chegou à CCJ do Senado esta semana
O arquivamento do texto na Câmara não interrompeu o debate. Ontem chegou à Comissão de Constituição e Justiça do Senado uma proposta semelhante de autoria do senador Acir Gurcacz (PDT/RO). Numerada como PLS 168/2018, a redação propõe a criação da “avaliação ambiental estratégica (AAE)” e busca regulamentar “normas gerais para o licenciamento de atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes de causar degradação ambiental”.
Gurcacz é ligado ao agronegócio e foi presidente da Comissão de Agricultura do Senado. Embora o seu partido se posicione na oposição, o senador afirmou em entrevista recente ter uma “expectativa muito grande” sobre o governo Bolsonaro e frisou que estará junto ao governo “com relação a tudo que for importante para a população brasileira”.
O PLS 168/2018 foi despachada pela Mesa Diretora do Senado também para a Comissão de Meio Ambiente, onde terá decisão terminativa. Ou seja, se aprovado nas duas comissões, o projeto seguirá direto para a Câmara, sem votação no plenário do Senado.
As comissões temáticas do Senado começam a trabalhar na próxima semana, quando devem ser escolhidos os presidentes de cada uma delas. A partir de então caberá aos presidentes das duas comissões indicar relatores para o texto.
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Senador apresenta PL para tornar desastres crimes hediondos
Desde o desastre de Brumadinho, porém, uma série de projetos foram prometidos por parlamentares buscando tornar mais rigorosas a fiscalização e punição contra crimes ambientais. Um dos parlamentares mais ativos em pautas de cunho ambiental, o líder da bancada do Rede no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede/AP), prometeu apresentar um projeto de lei para tornar hediondos os crimes ambientais de grandes dimensões, como definiu o ocorrido em Brumadinho. O projeto será apoiado pela bancada do Rede, que neste ano cresceu de 1 para 4 senadores.
Outro senador da legenda, Fabiano Contarato, eleito pelo Rede no Espírito Santo, estado que também sofreu com o impacto do desastre de Mariana sobre o Rio Doce, disparou contra as propostas de flexibilização do licenciamento ambiental debatidas no Congresso.
“Quatro propostas de flexibilização do licenciamento ambiental, pelo menos, tramitaram no Congresso Nacional, motivadas por lobbies. Enquanto, isso, nada se fez para garantir segurança a funcionários e à população”, publicou Contarato no Facebook, prometendo acompanhar a apuração em Brumadinho.
A proposta de Randolfe deve contar com o apoio de senadores de outras legendas. Alvaro Dias (Pode/PR), líder da bancada do Podemos, também pediu que crime ambiental dessa magnitude se tornem crime hediondo. “Responsabilização civil e criminal é a exigência. Omissão das autoridades será prevaricação!”, postou no Twitter.
Também eleito pelo Rede, Capitão Styvenson Valentim (RN), que migrou para o Podemos em 4 de fevereiro, criticou a dificuldade dos órgãos competentes em fazer cumprir a lei e pediu que responsáveis sejam punidos cível e criminalmente.
Parlamentares pedem licenciamento ambiental rigoroso e responsabilização criminal a autores de laudos e diretores de empresas
Nos primeiros três dias após o desastre, parlamentares eleitos fizeram ao menos 25 postagens no Facebook e Twitter pedindo regras mais rígidas para processos de licenciamento ambiental no Brasil, segundo o serviço de monitoramento de redes do Político, por +epbr.
Eleito deputado federal pelo Rio, Marcelo Freixo (PSOL/RJ) afirmou que “é criminoso que, logo após a tragédia em Mariana, quatro projetos tenham sido apresentados no Congresso Nacional para flexibilizar o licenciamento (ambiental)”. Ele afirmou que a bancada do partido estará empenhada no fortalecimento da legislação ambiental.
Postagens sobre regras de licenciamento ambiental também vieram de partidos de centro, como MDB, PSD e PSDB. Mas parlamentares do partido de Bolsonaro, o PSL, também escreveram sobre o assunto. O deputado Julian Lemos (PSL/PB) criticou a postura de deputados estaduais de Minas que votaram contra um projeto com regras mais rígidas de licenciamento.
Também na base do governo, o policial federal eleito deputado pelo PSL, Ubiratan Sanderson (PSL/RS) afirmou que deveria ser decretada prisão cautelar da diretoria da Vale. E a ativista online Carla Zambelli (PSL/SP) disse no facebook que é ridícula a pena máxima a que os responsáveis pelo desastre podem pegar caso sejam condenados. “Apoiaremos penas mais severas também para homicídio culposo”, afirmou.
Na oposição, parlamentares escolheram entre os alvos preferenciais as falas do presidente Jair Bolsonaro contra o que considera uma indústria da multa do Ibama. As críticas às falas de Bolsonaro vieram de diversos partidos, mas sobretudo do PT e do Rede.
O deputado federal Reginaldo Lopes (PT/MG) pediu que responsáveis pelos laudos de liberação das barragens e os diretores da empresa sejam responsabilizados criminalmente pelo desastre. O deputado mineiro criticou a tramitação lenta do PL 3650/2015, de sua autoria, que altera normas para licenciamentos de projetos de mineração.
Em três dias desde o desastre, deputados federais de Minas Gerais fizeram 21 postagens pedindo a instalação de uma CPI para investigar o rompimento da barragem.
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CPIs no Senado e Câmara
Um pedido para a criação de uma CPI no Senado para investigar causas e responsabilidades no desastre de Brumadinho já conta com 31 assinaturas. Solicitada pelo senador Otto Alencar (PSD/BA) pode ter seu requerimento de instalação lido na próxima quita-feira, 7. São necessárias 27 assinaturas de apoio para a instalação de uma CPI no Senado.
O senador afirma que o foco da comissão de inquérito será a identificação dos responsáveis pelo desastre, falhas no trabalho de órgãos competentes, autores de laudos técnicos que permitiram o funcionamento da barragem. A comissão deve dar destaque aos processos de licenciamento ambiental no Brasil.
No requerimento de instalação, Alencar critica a falta de um plano de emergência “que funcionasse”, a concessão de “uma licença a jato” para o funcionamento da barragem do Córrego do Feijão e a simplificação do processo do último licenciamento pelo qual passou a instalação, com a mudança para o licenciamento em uma única fase.
“Cabe investigar para apurar as causas do ocorrido e corrigir falhas nos processos de licenciamentos, fiscalizatórias e legislativas, de modo a impedir que a mineração transforme o Brasil num país de lama”, encerra o texto. O senador Randolfe, autor de outra solicitação para instalação de CPI a partir do desastre de Brumadinho, afirmou na terça, 5, que retirará seu requerimento e trabalhará junto com Alencar para instalar uma única CPI.
Na Câmara, o ex-senador e agora deputado federal, José Medeiros (Pode/MT) prometeu a instalação de uma CPI semelhante. Mas foi Joice Hasselmann (PSL-SP) que fez a solicitação primeiro. Ambos são deputados atuantes da base do governo Bolsonaro.
Revisão da política de segurança de barragens
O senador Renan Calheiros (MDB/AL) foi outro que criticou a falta de efetividade na defesa do meio ambiente no Brasil e defendeu a revisão completa da política de segurança de barragens (PNSB).
Apenas a Vale tem 109 barragens de rejeitos no estado de Minas Gerais, totalizando ao em torno de 750 milhões de metros cúbicos de rejeitos. Veja aqui o mapa desenvolvido pela epbr com todas as barragens no estado de Minas.
Os ex-senadores Jorge Viana (PT/AC) e Ricardo Ferraço (PSDB/ES) também lamentaram que projetos de sua autoria focados em licenciamento de barragens não tenham sido aprovados no Senado.
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Câmara tem nove projetos apresentados para alterar política de segurança de barragens
Com menos de uma semana de trabalho do Legislativo, foram protocolados na Câmara oito PLs prevendo alterações na Política Nacional de Barragens (PNSB). De autoria do deputado Rogério Correia (PT/MG), o PL 188/2019 proíbe a construção de barragens por alteamento à montante, a técnica usada na construção da barragem rompida em Brumadinho e torna obrigatória a contratação de seguro contra rompimento dessas estruturas.
O texto do PL 336/2019, de Carmen Zanotto (PPS/SC) estabelece procedimentos mais rígidos em caso de acidentes nessas instalações, alterando exigências do Plano de Ações de Emergência e regras para sistemas de alerta para populações vizinhas às barragens.
Os outros são o PL 18/2019, proposto por Alessandro Molon e outros membros da bancada do PSB; PL 30/2019, de Cássio Andrade (PSB/BA); PL 109/2019, de Rodrigo Agostinho (PSB/SP); PL 184/2019, de Igor Timo (Pode/MG); PL 356/2019, PL 357/2019 e PL 359/2019 protocolados pela deputada Leandre (PV/PR).