O texto que garante o rateio do bônus do leilão dos excedentes da cessão onerosa vai encontrar resistência, sobretudo quando voltar para a Câmara dos Deputados. Liderança da bancada do Rio de Janeiro, o deputado Christino Áureo (PP/RJ) garante que o Rio vai mobilizar colegas de outros estados para rever o cálculo do repasse.
A discussão é em torno da PEC 98/2019, aprovada na Câmara e que deve ser votada entre terça e quarta da semana que vem em primeiro turno, no Senado. Por ser uma emenda à Constituição, o texto precisa ser aprovado em dois turnos de votação pelas duas casas O governo federal precisa da PEC para fazer o acerto com a Petrobras de US$ 9 bilhões e cumprir a promessa de incluir todos os estados e municípios do país no rateio do bônus de R$ 106 bilhão dos excedentes da cessão.
A questão, diz Áureo, é que o relator da PEC 98/2019 no Senado, Cid Gomes (PDT/CE), chegou a um texto que considera o Fundo de Participação dos Estados (FPE), privilegiando estados menores. O feito prático é um repasse de R$ 326 milhões para o governo do Rio de Janeiro e de R$ 332 milhões para os municípios do estado, que é o maior produtor de petróleo do país. O valor repassado ao Rio é menos da metade dos R$ 692 milhões que serão destinados ao Ceará, estado do relator da PEC no Senado.
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“Estamos mudando de matriz energética e outros estados brasileiros serão candidatos no futuro a serem grandes produtores de energia. Vou pegar outorga de áreas produtoras do Nordeste e distribuir para o Brasil por outro critério?”, questiona Áureo.
Essa semana, o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), defendeu que a divisão seja feita levando em conta a compensação dos estados relativa às perdas de arrecadação de ICMS sobre exportações prevista na Lei Kandir — o Auxílio Financeiro para o Fomento das Exportações (FEX).
E nesta sexta (30), o deputado Wladimir Garotinho (PSD/RJ) divulgou nota afirmando que a “PEC da cessão onerosa pode ser a sentença de morte do Rio” e também garantiu que está “buscando alternativas” para que a medida não seja apreciada no Senado.
O debate sobre o rateio do bônus da cessão está sendo feito no Senado no mesmo contexto de uma futura do Pacto Federativo. Umas das ideias é extinguir a Lei Kandir e permitir que os estados mais ricos voltem a arrecadar ICMS sobre as exportações, com ganhos no longo prazo, mas por meio do aumento das cargas tributárias estaduais.
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Áureo ainda está mobilizando seus pares para rediscutir o repasse, afirma que a tramitação no Senado não está garantida e afirma que o tema vai interessar as bancadas de outros estados.
“Não é fácil convencerem a passar uma PEC retirando recurso de estados com bancada significativa. [Além do] Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, estados potencialmente produtores, como Paraná, e agora Alagoas e Sergipe, esse pessoal, têm que pensar nisso também”, afirma.
A entrevista com o deputado foi publicada primeiro para os leitores do Político, serviço exclusivo para assinantes da agência epbr. Veja os principais trechos da entrevista:
Leia a entrevista na íntegra:
Há tempo para alterar o texto da PEC 98?
O assunto não está pacificado no Senado. O relatório do Cid Gomes foi aprovado na CCJ mas ainda tem dois turnos de votação no Senado.
Qual o argumento do Rio para questionar a divisão dos recursos?
Não queremos produzir o tipo de embate que foi feito na questão de divisão de royalties e participações [mudança aprovada no Congresso em 2013 acabou no STF], mas essa discussão, tecnicamente, nos favorece.
Indiscutivelmente, sob qualquer aspecto, esses recursos [bônus do leilão] têm uma natureza completamente diferente dos que são distribuidores através do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
Aqui não se trata de impostos, são recursos diretamente relacionados com a produção de óleo e gás. O fato gerador dessa outorga está longe de poder ser caracterizado na mesma cesta da base de calculo de fundo de correção da desigualdades, que é a lógica do FPE. A divisão é muito bem-vinda, mas tem que guardar uma lógica com a obtenção desse recurso.
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“Se no lugar de um recurso mineral do pré-sal fosse outro recurso mineral sendo explorada no Norte do país, eu imagino qual seria o tamanho da grita nacional se a maior parte viesse para o Rio.”
Mas como convencer os senadores?
O primeiro ponto é respeitar a tramitação no Senado e mostrar aos senadores que esse tipo de atitude em relação à distribuição dos recursos não contribui para sedimentar as questões do Pacto Federativo.
O critério deve ser proporcional à contribuição que essa região dá para a federação.
A estratégia é mostrar aos senadores que isso está perpetuando problemas, como o fato de o Rio comparecer sempre na figura daquele que está precisando de ajuda. Isso tem fundamento na forma como o Rio de Janeiro tem sido preterido nos critérios de divisão de recurso.
Na Câmara vamos tratar com os estados produtores, e não apenas com os produtores de petróleo.
Mas como atrair esse apoio de outros estados?
Quando se coloca isso na Constituição Federal, é uma sinalização de princípios. Isso não se trata só do quanto de recurso estamos discutindo agora, mas tem repercussão sobre os princípios constitucionais que estão sendo consagrados. Isso tem repercussão.
Estamos mudando de matriz energética e outros estados brasileiros serão candidatos no futuro a serem grandes produtores de energia. Vou pegar outorga de áreas produtoras do Nordeste e distribuir para o Brasil, por outro critério?
Ainda assim, não será fácil alterar novamente o projeto…
Estamos falando de uma PEC. Eles precisam colocar um volume de votos significativo para aprovar, as coisas precisam estar bem negociadas para uma PEC passar.
O Rio vai tentar evitar a aprovação em plenário?
Vamos trabalhar para que haja entendimento. Mas o esforço para passar uma PEC… Não vai ser vida fácil pra eles, não. Não é fácil convencerem a passar uma PEC retirando recurso de estados com bancada significativa.
[Além do] Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, estados potencialmente produtores, como Paraná, e agora Alagoas e Sergipe, esse pessoal, têm que pensar nisso também.
Tratorar sobre estados com bancada significativa não é positivo nem no governo. Este não é o momento de esgarçar essas relações, mas também não é o momento de ficar calado.
A bancada está alinhada com o governador?
Vou conversar com o governador na segunda-feira (2). Já estamos conversando na bancada e na terça vamos estabelecer essa linha de conversa no Senado.
Eu conversei hoje com o Rodrigo Maia [presidente da Câmara, do DEM/RJ], que tem que ficar numa posição mais neutra. Mas nós não.
E o governo federal já sabe da posição do Rio?
O governo federal sabe onde está o problema. Mas aposta primeiro na possibilidade de os estados dialogarem, uns proporem e outros aceitarem. Esse dialogo agora está dentro do Senado e da Câmara.
O valor de que estamos falando, os R$ 21 bilhões é um valor significativo, mas debatemos muito mais o princípio, para que isso não se torne comum na divisão de recursos extraordinários, do que pelo valor em si.
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