Nova fronteira

ONGs processam governo contra exploração na Foz do Amazonas

Sonda ODN II, da Foresea, contratada pela Petrobras para a Bacia da Foz do Amazonas (Foto Divulgação Petrobras)
Sonda ODN II, da Foresea, contratada pela Petrobras para a Bacia da Foz do Amazonas (Foto Divulgação Petrobras)

BRASÍLIA — Oito organizações de ambientalistas, indígenas, quilombolas e pescadores artesanais entraram na quarta-feira (22/10) com uma ação civil pública (ACP) na Justiça Federal do Pará contra o Ibama, a Petrobras e a União, pedindo anulação do licenciamento do Bloco FZAM-59, na Foz do Amazonas.

A licença emitida na segunda (20/10) permite à Petrobras iniciar a perfuração de um poço de petróleo na costa do Amapá. A judicialização era prevista, como mostrou a eixos.

Na ação, protocolada na 9ª Vara da cidade de Belém, o grupo pede liminar suspendendo imediatamente as atividades de perfuração, sob risco de danos irreversíveis ao meio ambiente. Ao receber a licença, Petrobras afirmou que iniciaria os trabalhos imediatamente, com duração prevista de cinco meses.

A ACP é assinada por Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas), Confrem (Comissão Nacional para o Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos Extrativistas Costeiros e Marinhos), Greenpeace Brasil, Instituto Arayara, Observatório do Clima e WWF-Brasil.

Estudo para casos de vazamento

A ação questiona três pontos pedindo a anulação na licença de operação: a ausência de consulta adequada aos povos indígenas, a modelagem de dispersão de óleo apresentada pela Petrobras ao Ibama e os impactos climáticos da ampliação de novas fronteiras exploratórias.

A ação afirma que a modelagem de dispersão de óleo apresentada pela Petrobras é insuficiente por desconsiderar a força de correntes de subsuperfície e outras características da região que poderiam levar a um impacto não previsto em caso de vazamento.

Esses modelos são usados para elaborar planos de emergência e o temor dos ambientalistas, com bases em estudos próprios, é que as correntes na região levem a um afundamento do óleo, contaminando o leito marino.

De fato, foi um ponto questionado no licenciamento. Pareceres do Ibama reconhecem que o modelo foi aprimorado ao longo do tempo, mas os estudos mais recentes não foram integralmente considerados.

Uma das condicionantes da licença é apresentação de “uma nova modelagem de dispersão de óleo utilizando a nova Base Hidrodinâmica elaborada para a Margem Equatorial”, em um relatório anual.

A ação tem por base as conclusões técnicas do próprio Ibama. Antes de chegar a solução para emissão da licença, técnicos do órgão rejeitaram o recurso da Petrobras — um segundo parecer sustentou a emissão da licença pelo presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, mediante a definição das condicionantes.

Os estudos apresentados pela Petrobras, atualizados a partir de um modelo anterior feito pela BP, indicaram que há zero risco de de um vazamento chegar a costa brasileira — o óleo seria levado pelas marés em direção ao Caribe.

Os ambientalistas, contudo, questionam a premissa do modelo: “ressalte-se que, em uma iniciativa paralela, o Projeto Costa Norte (PCN), realizou um estudo de modelagem hidrodinâmica e de dispersão de óleo da Margem Equatorial com uma metodologia distinta das até então empregadas, obtendo resultados que apontaram o grande risco de contaminação de óleo na costa”.

A necessidade de um novo estudo consta na recomendação do Ministério Público Federal (MPF) do Pará, contrária à emissão da licença. O órgão também acionou a Justiça Federal.

“O licenciamento atropelou povos indígenas e comunidades tradicionais”, segundo as organizações, que argumentam à Justiça que houve falhas nos chamados componente indígena e componente quilombola do licenciamento.

A convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, prevê consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais possivelmente afetadas por projetos, etapa que precisa ser feita em paralelo ao licenciamento.

O grupo também lança mão de dados de agências internacionais que pedem o fim da expansão de projetos de combustíveis fósseis, caso o mundo queira limitar o aquecimento do planeta a 1,5ºC.

“O Brasil, às vésperas de sediar uma conferência do clima da ONU na Amazônia, tripudia sobre o Acordo de Paris e sobre a COP30 ao abrir essa mesma Amazônia para uma expansão maciça da produção de petróleo, o principal causador da crise do clima”, criticam, lembrando que há outros oito blocos em licenciamento e 19 arrematados no leilão da ANP em junho.

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