Corrida fiscal

Resgate fiscal com petróleo depende de ágio e fatia pendente de Tupi

Para pagar emendas, governo apressa leilão das áreas não contratadas no pré-sal com receita garantida distante de meta de arrecadação

Alexandre Silveira (à esquerda), ministro de Minas e Energia, e Fernando Haddad (à direita), da Fazenda, participam de coletiva de imprensa sobre a gasolina (Foto Tauan Alencar/MME)
Ministros da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e do MME, Alexandre Silveira (PSD), participam de coletiva (Foto Tauan Alencar/MME)

BRASÍLIA — O governo precisará alcançar um ágio de 45% com a venda de participação em áreas não contratadas do pré-sal para atingir a expectativa de arrecadação incluída no orçamento de 2025, de R$ 14,78 bilhões.  O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) fixou um lance mínimo que totaliza R$ 10,2 bilhões pelos três ativos em oferta. 

A publicação do edital da licitação está prevista para esta quarta-feira (8/10), para venda de participações em jazidas de óleo e gás dos campos de Atapu, Mero e Tupi, pelos maiores lances, que serão revelados em dezembro. 

A diferença de R$ 4,5 bilhões entre os lances mínimos e a previsão de arrecadação de R$ 14,78 bilhões poderá ser alcançada, ou até mesmo ultrapassada, na concorrência. No boletim fiscal de julho, o ganho extra — reiterado no bimestre seguinte — bancou boa parte do descontingenciamento de R$ 20 bilhões nas contas públicas. 

O governo tem pressa para compor as receitas previstas para este ano. Primeiro vai vender, receber (até dezembro), deixando a efetivação dos contratos para março de 2027, após a consolidação da fatia que será, de fato, repassada às empresas.      

Isso porque nem sequer foi aprovado o que realmente será vendido em Tupi, um total de 0,833% ou 51% a mais do que a participação incluída no edital, de 0,551%. Todas as contas foram feitas com a parcela maior gigante da Bacia de Santos, o primeiro megaprojeto no pré-sal. É o antigo campo de Lula.

O reajuste da parcela de Tupi, de 0,551% para 0,833% foi dado como certo desde as projeções de arrecadação entregues pela Pré-sal Petróleo SA (PPSA) e pelo Ministério de Minas e Energia (MME) à equipe econômica, em julho. Já existe acordo entre sócios, por exemplo.

Essa informação foi confirmada à agência eixos pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que acompanha o tema, sob relatoria do ministro Bruno Dantas. 

“No momento, não há decisão do Tribunal [TCU] e não há um prazo para que isso ocorra. Também não há obrigação de que os gestores aguardem qualquer manifestação do TCU para a continuidade dos procedimentos licitatórios”, explicou a corte de contas.  

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) começou a análise da redeterminação de Tupi em 2 de outubro, com o sorteio do processo para o diretor Daniel Maia.    

As projeções de receita foram feitas com Brent a US$ 50, considerada “conservadora” nos trâmites internos, chegando aos R$ 14,78 bilhões.

O CNPE também definiu um pagamento contingente (earn-out) aos preços de referência do Brent, uma tabela que prevê valores a cada um dólar de valorização do barril, além de US$ 55 (preço-base). 

Não há, por sua vez, previsão de desconto contingente, um abatimento dos pagamentos ou indenização por preço abaixo dos US$ 55. 

Novas redeterminações dos campos estão previstas para Atapu e Mero, segundo técnicos envolvidos no assunto. Pela regra definida pelo CNPE, contudo, o repasse não será integral — a fórmula aprovada não prevê uma proporcional um para um dos percentuais na forma de earn-out.

Internamente, o MME justifica que a modelagem busca um equilíbrio entre a participação governamental e a atratividade pelos ativos, buscando um patamar constante de arrecadação proporcional à produção.    

Leilão das emendas 

O leilão é uma liquidação antecipada das receitas da União no pré-sal. Para fins orçamentários, o governo Lula criou um modelo de ‘alienação’: vai vender o ativo (participação nos reservatórios) e não o óleo futuro com pagamento à vista, o que teria implicações na vinculação de despesas com o Fundo Social.

Essas extensões foram a motivação inicial para o leilão, um entendimento do MME que é mais vantajoso liquidar o ativo à vista do que separar os reservatórios e oferecer em um leilão convencional de partilha — todas as áreas estão no polígono do pré-sal. 

Para isso, foi necessário alterar a lei do pré-sal e, em conjunto com a Fazenda, surgiu o modelo de alienação de participações. 

Partiu da equipe de Fernando Haddad (PT) a ideia de repetir o modelo “excepcionalmente” com a alienação de participações em áreas contratadas, como mostrou a eixos. Com isso, os R$ 31 bilhões foram incluídos no orçamento de 2026.

O leilão faz parte do pacote fiscal do petróleo, alardeado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), como solução para destravar o pagamento de emendas parlamentares — e ajudar o Planalto na articulação com o Congresso Nacional.  

O leilão é um teste. Os sócios atuais são candidatos naturais, até pelo ineditismo do modelo e a complexidade contratual de uma sub-rogação de direitos da PPSA, por meio da alienação nos campos. A Petrobras é operadora de todos os ativos. 

Mas o governo espera atrair concorrentes, dado o baixo risco operacional e geológico (é óleo descoberto, em produção). Também abriu o leilão para fundos de investimentos, que podem se organizar em consórcios, sem a presença de uma petroleira. Para 2026, o governo incluiu R$ 31 bilhões de receita em mais um leilão do tipo. 

  • Em Mero, a Petrobras detém 38,6%, em parceria com a Shell (19,3%), TotalEnergies (19,3%), CNPC (9,65%) e CNOOC (9,65%).
  • Em Tupi, estão Petrobras (65%), Shell (25%) e Petrogal (10%).
  • E em Atapu, Petrobras (89,26%), Shell (4,26%), TotalEnergies (3,8%) e Petrogal (1,7%). 

A agência eixos procurou a Fazenda, MME e o Ministério do Planejamento (MPO), todos integrantes do CNPE e envolvidos na questão. Foi questionado se a fórmula de pagamentos contingentes por redeterminação não implicaria em perda de receita da União no longo prazo.

E qual a justificativa para fixar o gatilho de pagamentos contingentes em US$ 55 por barril de petróleo Brent (earn-out a partir de US$ 56) e não US$ 50, como usado na projeção de arrecadação de R$ 14,78 bilhões (earn-out a partir de US$ 51). Fazenda e MPO encaminharam os questionamentos ao MME, que não respondeu; o espaço seguirá aberto. 

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