A Polícia Federal (PF) deflagrou, na manhã desta quinta-feira (21/12), a Operação Lágrimas de Sal, para investigar possíveis crimes cometidos durante os anos de exploração de sal-gema pela Braskem em Maceió (AL).
Aproximadamente 60 policiais federais cumprem 14 mandados judiciais de busca e apreensão, em endereços ligados aos investigados nas cidades de Maceió, no Rio de Janeiro e em Aracaju, capital de Sergipe. Os mandados foram expedidos pela Justiça Federal no estado de Alagoas.
Segundo o g1, os alvos das buscas incluem a direção, a área técnica e a gerência da Braskem:
- Diretor industrial da Braskem: Alvaro Cesar Oliveira de Almeida;
- Gerentes de produção: Marco Aurélio Cabral Campelo; Paulo Márcio Tibana; Galileu Moraes;
- Responsáveis técnicos: Paulo Roberto Cabral de Melo; Alex Cardoso da Silva.
Além da petroquímica, a PF investiga também consultorias que prestaram serviço para a empresa: Modecon (RJ) e Flodim (SE).
Em nota, a Braskem afirmou que está acompanhando a operação da PF nesta manhã e que está à disposição das autoridades “como sempre atuou”. “Todas as informações serão prestadas no transcorrer do processo’’, informou a empresa. Veja a íntegra no fim da reportagem.
Indícios de crimes
As investigações da PF apuraram indícios de que as atividades de mineração desenvolvidas no local não “seguiram os parâmetros de segurança previstos na literatura científica e nos respectivos planos de lavra, que visavam a garantir a estabilidade das minas e a segurança da população que residia na superfície”.
A exploração de sal-gema na capital alagoana ocorreu de 1976 a 2019, resultando em grave instabilidade no solo de bairros como Pinheiro, Mutange, Bebedouro e adjacências. A área se tornou inabitável, tendo em vista os riscos de desmoronamento de casas, ruas e fechamento do comércio, levando mais de 60 mil pessoas a terem que deixar os bairros.
De acordo com as apurações feitas até agora, foram identificados indícios de apresentação de “dados falsos e omissão de informações relevantes aos órgãos públicos responsáveis pela fiscalização da atividade, permitindo assim a continuidade dos trabalhos, mesmo quando já presentes problemas de estabilidade das cavidades de sal e sinais de subsidência do solo acima das minas”.
A PF diz que os investigados poderão responder, na medida de suas responsabilidades, pelos crimes de poluição qualificada, usurpação de recursos da União, apresentação de estudos ambientais falsos ou enganosos, inclusive por omissão, entre outros delitos.
O nome da Operação Lágrimas de Sal é referência ao sofrimento causado à população pela atividade de exploração de sal-gema.
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Crise em Maceió
A crise na Braskem se acirrou em novembro com o iminente colapso da mina 18, uma das 35 minas da companhia em Maceió, que levou à retirada de milhares de moradores do bairro Mutange.
A mina acabou se rompendo no dia 10 de dezembro, na Lagoa Mundaú, sem vítimas.
De acordo com a Defesa Civil de Maceió, o local entrou em processo de estabilização e não oferece mais risco de colapso.
Os problemas, no entanto, começaram há cinco anos, com o surgimento de rachaduras e abalos sísmicos em vários bairros da capital alagoana, que afetaram imóveis e obrigaram moradores a deixar suas casas.
Multas e briga política
A petroquímica já recebeu 20 autuações por causa da mina. As últimas duas multas, no valor de R$ 72 milhões, foram aplicadas este mês pelo governo de Alagoas.
Uma multa foi por degradação ambiental e a outra por omissão de informações. A companhia negou ter omitido informações.
A empresa também fechou um acordo com a prefeitura de Maceió, prevendo uma indenização de R$ 1,7 bilhões pelos estragos provocados na cidade.
O valor e os termos, no entanto, são questionados pelo governo de Alagoas e por políticos de oposição.
O governador de Alagoas, Paulo Dantas (MDB), solicitou ao governo federal a atuação da Advocacia Geral da União (AGU) no acordo que chamou de “ilegal”. Isso porque o contrato isenta a empresa de responsabilidade e de qualquer outro desembolso por danos relacionados à extração de sal-gema em Maceió.
Dantas é do grupo político liderado pelo senador Renan Calheiros (MDB), rival há décadas do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), que é aliado do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, o JHC (PL).
CPI no Senado
Na última semana, Calheiro conseguiu que o Senado instalasse uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar o desastre ambiental causado pela extração de sal-gema por parte da Braskem. Os trabalhos, no entanto, só começarão em fevereiro de 2024.
A CPI da Braskem tinha as assinaturas necessárias desde outubro, mas só saiu após pressão do autor do requerimento e apoio do presidente da Casa, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
A comissão será presidida pelo senador Omar Aziz (PSD/AM) e terá o senador Jorge Kajuru (PSB-GO) na vice-presidência.
Proposta de aquisição
O desastre ambiental em Maceió entrou em evidência no momento em que avançam as negociações para a venda da participação da Novonor (ex-Odebrecht) na Braskem.
A Adnoc, de Abu Dhabi, ofereceu R$ 10,5 bilhões pela participação de 38,3% que a Novonor tem no capital total da Braskem. A Petrobras tem outros 36,1%.
A potencial compradora, no entanto, não se abalou com a crise e vai fazer diligências na petroquímica em janeiro para dar continuidade ao processo de aquisição. Para facilitar a negociação, a Petrobras avalia ampliar sua participação antes da venda.
O que diz a Braskem
A Braskem afirmou em nota enviada à epbr que sempre que solicitada providenciou todos os documentos e relatórios à PF, com diligência e transparência. Veja a íntegra:
“Desde a abertura do inquérito conduzido pela Polícia Federal em 2019, integrantes e ex-integrantes da Braskem já foram chamados a prestar esclarecimentos e compareceram nas datas marcadas.
Sempre que solicitados, documentos e relatórios em poder ou de conhecimento da empresa também foram prontamente enviados. A empresa vem agindo com diligência e transparência, como sempre atuou.
Durante todo o período em que houve extração de sal-gema em Maceió, as técnicas disponíveis e apropriadas no momento foram empregadas, sempre acompanhadas e fiscalizadas pelos órgãos públicos competentes e com as licenças de operação correspondentes.
A Braskem está acompanhando a operação da PF conduzida nesta manhã (21 de dezembro) e informa que continua à disposição das autoridades. Entretanto, por se tratar de inquérito que corre em sigilo, a Braskem não pode se manifestar sobre detalhes das investigações em curso.”