RIO – Proximidade com a Europa e grande volume de investimentos de fundos soberanos colocam países do Norte da África e os Emirados Árabes, respectivamente, como grandes concorrentes do Brasil na exportação de hidrogênio verde, aponta Adriano Correia, sócio e líder do setor de energia da consultoria PwC Brasil.
“O Norte da África é um concorrente forte. Mapeamos também ali os Emirados Árabes como um potencial produtor. Tem muito investimento acontecendo lá”, conta Correia, em entrevista à agência epbr.
Na visão do analista, o Brasil precisa pensar em subsídios para a produção se quiser entrar nesta corrida pelo mercado de hidrogênio verde.
“Se realmente estivermos querendo entrar nessa rota de exportação, vamos ter que utilizar, sem dúvida, algum tipo de subsídio. É uma rota um pouco mais complexa em função das perdas que você tem no processo, no ponto de saída e no ponto de chegada”.
É justamente neste ponto que os países do Norte da África, como Marrocos, Argélia e Tunísia, levam vantagem quando se fala em exportação para a Europa. Todos esses países já possuem algum tipo de conexão de gasodutos com o continente ou já têm planos de construção de gasodutos dedicados para exportação a hidrogênio.
Isso permite a redução de perdas e custos no transporte de hidrogênio verde, diferentemente do Brasil, que teria que fazer a conversão para amônia, ou outras formas, para transporte em navios de longa distância, agregando custos ao produto final.
Outro país que se destaca é o Egito que, apesar de não possuir conexão via gasodutos, aposta no consumo local de hidrogênio verde para produção de aço e metanol verde, que podem ser exportados pelo Canal de Suez – hoje, uma das principais vias de escoamento da produção de petróleo, gás natural e derivados do mundo.
No Brasil, a maior parte dos projetos de produção de hidrogênio verde de larga escala miram, em um primeiro momento, a exportação.
Críticos entendem que dar subsídios para esta cadeia no Brasil seria financiar a descarbonização de países ricos na Europa. Contudo, Correia lembra que o Brasil também poderia desenvolver um mercado doméstico de derivados de hidrogênio, a exemplo do Egito.
“A exportação vai ter que ser via algum derivado, principalmente amônia. Você pode desenvolver outras cadeias aqui”, afirma.
169 GW na África
O estudo da PwC Navigating the hydrogen ecosystem, aponta que a Alemanha e a Itália, por exemplo, comprometeram-se conjuntamente na construção de um gasoduto através dos Alpes, como parte da criação de um corredor para importar hidrogênio do Norte de África. Também há um projeto de conexão do Marrocos com a Espanha.
O documento mapeia um total 71 projetos de hidrogênio renovável, com capacidade de 169 GW na África.
Além de gasodutos, a Europa está empenhada para construir terminais de amônia para permitir o fornecimento de hidrogênio pelo mar, inclusive vindo do Oriente Médio.
O estudo destaca o apoio financeiro importante que fundos soberanos, como o Mubadala dos Emirados Árabes Unidos (EAU), têm dado a projetos de energia e infraestrutura.
“Os países do Médio Oriente têm os recursos naturais, a solidez financeira e a experiência na indústria energética para se tornarem inovadores líderes na produção de hidrogénio renovável, sendo a Arábia Saudita, os EAU e Omã provavelmente os mais próximos de concretizar as exportações de hidrogénio renovável”, afirma o documento.
Subsídios para o pontapé inicial
Correia defende agilidade na aprovação de uma marco regulatório do hidrogênio com a presença de subsídios, para que os primeiros projetos no Brasil consigam contratos de fornecimento mais vantajosos no mercado internacional.
“Se não tivermos cuidado, talvez não consigamos aproveitar aqui os melhores contratos, os mais rentáveis. E talvez pegue um contrato spot, um contrato marginal. Acho que não é isso que queremos. Queremos ter protagonismo no tema, bons contratos”.
Ele lembra que, apesar das vantagens do Brasil em relação à geração de energia renovável barata, que garante um hidrogênio verde competitivo, o país está ficando para trás.
A parcela de energia renovável dos principais potenciais exportadores de hidrogênio verde do Norte da África é relativamente baixa, por exemplo, Marrocos 38%, Egito 20% e Tunísia 3%.
Além disso, o grau de instabilidade política em alguns países, incluindo no Oriente Médio, traz incertezas aos investimentos.
“Temos uma sorte tremenda que o custo lá é muito mais alto que o nosso. Eles não têm as mesmas características no sistema que temos hoje. Mas começamos a perceber que temos ficado para trás em termos de discussões, em termos de outros países se posicionando melhor do que a gente”, avalia.
“Precisamos, de fato, fazer esse assunto mover mais rapidamente”, completa Correia.
Além dos subsídios, o sócio da PwC destaca ser crucial que o governo brasileiro avance rapidamente com a regulamentação e participe ativamente de fóruns internacionais, como o G20, para promover as vantagens competitivas do Brasil, em especial o potencial da biomassa para produção hidrogênio de baixo carbono.
“Temos um um potencial enorme com a biomassa, se a gente conseguir, de fato, emplacar, eu acho que a gente vai ir muito bem, mas a gente sabe que existe lá uma pressão muito forte, muito grande, especialmente da Alemanha para viabilizar os eletrolisadores, para fechar só na rota via eletrólise”.