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Diálogos da Transição
Apresentada por
COSAN
Editada por Nayara Machado
[email protected]
A segurança climática pode se tornar um direito fundamental no Brasil, ao lado do direito à vida, à liberdade e à igualdade. Na semana passada, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou a admissibilidade da PEC 37/21 que obriga o Estado brasileiro a agir para que não sejamos impactados pelas alterações do clima.
A PEC também altera a Constituição Federal para definir a segurança climática como princípio da ordem econômica — norteada pela soberania nacional, livre concorrência e redução de desigualdades regionais, entre outros princípios.
A proposta será analisada por uma comissão especial — e, naturalmente, tem um caminho longo pela frente, que dependerá do apoio do Executivo Federal. A admissibilidade não representa, necessariamente, apoio ao projeto.
Se aprovada, o Estado terá o dever de proteger brasileiros e estrangeiros residentes no país de situações como secas prolongadas, alterações no ciclo de chuvas, enchentes e desastres como os do último ano em Pernambuco, Petrópolis, São Paulo e sul da Bahia, para citar exemplos recentes.
Além de poder ser responsabilizado por ações e decisões que ameaçam a segurança climática.
Chegaria em um momento oportuno. Entre 2010 a 2020, o número de mortes causadas por inundações, secas e tempestades foi 15 vezes maior em todo o mundo, de acordo com o Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC, sigla em inglês).
Litígios climáticos
Paralelamente, os litígios climáticos também estão aumentando. Pelo mundo, processos contra governos e empresas cobrando indenizações ou mudanças em metas e estratégias com foco no clima já acontecem há alguns anos.
Um levantamento da United Nations Environment Programme (Unep) estima que, em 2020, as litigâncias climáticas somavam cerca de 1.550 ações judiciais em trâmite em 38 países.
Só os Estados Unidos concentram mais de 1.200 — um aumento de 75% em relação a 2017.
No Brasil, o governo de Jair Bolsonaro é processado desde 2020 pela suspensão do Fundo Amazônia (ADO 59), paralisado no início de 2019.
E no final de agosto do ano passado, uma decisão da 9ª vara federal de Porto Alegre, no RS, abriu o primeiro precedente para que a questão climática faça parte do licenciamento de empreendimentos intensivos em carbono.
“O que nós queremos é a responsabilidade do Estado brasileiro com ações concretas”, explica a deputada Joenia Wapichana (Rede/RR), relatora da PEC.
Brasil na liderança
Autor da proposta, o deputado Rodrigo Agostinho (PSB/SP) aponta que, ao incluir este tema expressamente em sua Constituição, o Brasil se colocaria como líder global e referência no tema. Ele, contudo, não foi reeleito.
Na justificativa da PEC, cita tribunais ao redor do mundo que já reconhecem o direito como fundamental de maneira implícita, como a Holanda no caso Urgenda v. Governo da Holanda, e a Colômbia, no caso Jovens e Futuras Gerações v. Ministério de Meio Ambiente.
A admissibilidade da PEC foi aprovada por por 26 votos a 10. Única a encaminhar contra, a deputada Bia Kicis (PL/DF) questionou a capacidade de o país sozinho conseguir garantir a segurança climática.
“O próprio instituto que trata das questões relacionadas ao meio ambiente diz que a questão climática é, por si só, insegura, que ela é sujeita a várias questões e que é preciso uma tomada de ações globais em conjunto”. Agência Câmara
Cobrimos por aqui:
- Caos climático galopa enquanto ação empaca
- Eleitor está mesmo preocupado com o clima?
- Políticas climáticas adotadas até 2020 levam a aquecimento de 3,2ºC
Responsabilidade climática
A intenção da proposta, no entanto, não é responsabilizar o governo brasileiro por todo e qualquer desastre climático, mas sim por suas ações que contrariam a garantia do direito fundamental à segurança — como fechar os olhos para o desmatamento ilegal ou congelar fundos climáticos.
Em julho, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu um passo neste sentido, ao decidir que o Acordo de Paris — compromisso de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 °C — tem status de emenda à Constituição, ao ser equiparado a um tratado de direitos humanos.
Inédita no mundo, a decisão ocorreu no julgamento da ADPF 708, movida em 2020 por partidos políticos e com o apoio de entidades da sociedade civil, questionando o governo federal por travar o financiamento de projetos do Fundo Clima em 2019.
Por 10 votos a 1, o STF obrigou o governo federal a manter os recursos para o funcionamento do fundo criado em 2009 para minimizar os impactos do aquecimento global. Somente o ministro Nunes Marques votou contra.
- Para aprofundar: Litigância climática no Brasil, por Rebeca Stefanini e Isabela Ojima
Em novembro tem COP…
Para Wapichana, o avanço da PEC 37/21 é uma notícia positiva para o Brasil levar à COP27.
A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27) ocorre no início de novembro no Egito em meio a crises financeiras e de dívida, de preços de energia, alimentar e, principalmente, climática.
Uma situação geopolítica que deve fazer com que a transição leve mais tempo do que o previsto, avalia o ministro egípcio das Relações Exteriores, Sameh Shoukry, que também é o presidente da COP27.
Como país anfitrião, o Egito planeja concentrar a reunião deste ano em como as nações em desenvolvimento podem obter financiamento para se adaptar ao aumento das temperaturas e financiar a transição para a energia verde.
Também está priorizando perdas e danos para compensar nações que pouco contribuíram com as emissões históricas de CO2, mas são as mais prejudicadas por seus efeitos. Bloomberg
UE tem três novas leis a caminho
Também em preparação para a COP27, a União Europeia quer fechar acordos sobre três novas leis para reduzir emissões, a tempo das negociações no Egito — em uma tentativa de aumentar sua influência política.
O bloco analisa a proibição da venda de novos carros movidos a combustível fóssil até 2035, expandir seus “sumidouros” naturais de CO2, como as florestas, e estabelecer metas nacionais vinculantes de redução de emissões. Reuters
E o Brasil?
Ao que tudo indica, chegará ao Egito com uma “ambição” climática que levaria o planeta ao aquecimento de mais de 3 ºC até o fim do século, desmatamento recorde (de novo) e política para biocombustíveis na corda bamba. Nem mesmo o marco regulatório para o mercado de carbono — cuja expectativa era ter saído na COP passada — conseguiu avançar no Congresso Nacional.
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Para a agenda
24/10 — Cebri e Consulado dos EUA no Rio de Janeiro promovem, nesta segunda, o webinar Emergência Climática e Justiça Ambiental: a Cooperação Brasil-EUA em diálogo, com a política climática e ambiental do governo Biden em foco. O evento será transmitido ao vivo pela plataforma Zoom, a partir das 18h.
25/10 — Os desafios da mulher no mercado de trabalho será uma das pautas do webinar Mulheres no setor de GLP, organizado pela parceria entre Sindigás, AIGLP e WINLPG. O bate-papo terá a presença da coordenadora da WINLPG Brasil, Gloria Castro; da gerente de Desenvolvimento, Inovação e Projetos da Abastible, Paula Frigerio; da sócia-fundadora da Petres Energia e co-criadora do projeto Sim, elas existem!, Renata Isfer; e da diretora executiva do IBP, Fernanda Delgado. Transmissão na terça, às 11h, pelo canal da agência epbr no Youtube. As inscrições estão abertas neste link.
25/10 — Das 14h30 às 16h30, o IBP realiza o webinar Impacto Econômico da Violência Contra a Mulher no Setor de Óleo e Gás. Com moderação da diretora executiva do IBP, Fernanda Delgado, os especialistas discutirão a discriminação de gênero no setor de óleo e gás e suas consequências. O evento ocorre presencialmente na sede do IBP. Os interessados poderão também acompanhar pelo Youtube.
31/10 e 4/11 — A 34ª Reunião das Partes do Protocolo de Montreal sobre Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio (MOP 34) ocorre na próxima semana, no Canadá. Durante o encontro, representantes dos 189 países que já aderiram ao pacto (que completa 35 anos em 2022) analisarão a reposição do fundo multilateral para implementar o protocolo no triênio 2024-2026, além de debater os rumos da eficiência energética no mundo.
A delegação brasileira, representada pelo Ministério das Relações Exteriores, Ministério do Meio Ambiente e Ibama, participa no dia 31, quando serão analisados os termos da Emenda de Kigali.