Diálogos da Transição

Opep do Lítio? América Latina se movimenta por mineral crítico para a transição

Bolívia, Argentina, Chile, México e, por fora, o Brasil vêm se movimentando para deslanchar a exploração e produção do lítio na AL

Opep do Lítio? América Latina se movimenta por mineral crítico para a transição. Na imagem, Alberto Fernández e Gabriel Boric na Cúpula das Américas – Argentina e Chile, com Bolívia e México estudam parcerias latino-americanas para produção de lítio (Foto: Casa Rosada)
Alberto Fernández e Gabriel Boric na Cúpula das Américas – Argentina e Chile, com Bolívia e México estudam parcerias latino-americanas para produção de lítio (Foto: Casa Rosada)

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APRESENTADA POR

Editada por Gabriel Chiappini
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A série de debates dos Diálogos da Transição volta em agosto.
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BolíviaArgentinaChile, México e, por fora, o Brasil vêm se movimentando para deslanchar a exploração e produção do lítio na América Latina.

Com exceção do Brasil, os demais países — governados por partidos de esquerda — cogitam uma parceria aos moldes da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) para o mineral.

O lítio é uma matéria-prima essencial para a transição energética. Presente nas baterias de íon de lítio de veículos elétricos e nos sistemas de armazenamento de energia, que servem de base para o despacho de renováveis, o minério deve ver sua demanda crescer vertiginosamente, em mais de 40 vezes até 2040, segundo projeção da Agência Internacional de Energia (IEA).

É nesse cenário que os olhos do mundo se voltam para a América Latina, em especial, para o chamado Triângulo do Lítio, formado por Bolívia, Argentina e Chile, que juntos concentram cerca de 65% das reservas mundiais do minério.

Brasil e México também entram no radar, apesar de possuírem reservas menores conhecidas até agora. Em toneladas:

  • Bolívia: 21 milhões
  • Argentina:19,3 milhões
  • Chile: 9,6 milhões
  • México: 1,7 milhão
  • Brasil: 0,5 milhão

No total, as reservas mundiais de lítio totalizam cerca de 86 milhões de toneladas, segundo dados do Serviço Geológico dos Estados Unidos, de 2021.

Acordos bilaterais Em junho, representantes do Triângulo do Lítio participaram da primeira reunião de trabalho do Foro Permanente de Diálogo Técnico sobre Inovação, Desenvolvimento Tecnológico e Agregação de Valor ao Litio, organizado pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).

Essa semana, os ministros Hidrocarbonetos e Energia (MHE) da Bolívia, Franklin Molina Ortiz, e da Ciência, Tecnologia e Inovação da Argentina, Daniel Filmus, se reuniram para, segundo Molina, traçar “um roteiro para avançar em direção a objetivos específicos que contemplam transferência para desenvolver a indústria do lítio”, a partir de termos de cooperação assinados em abril.

Chile e Argentina também realizaram a primeira reunião do Grupo de Trabalho Binacional sobre Lítio e Salares, para discutir as diretrizes para a cooperação futura entre os dois países.

Quem é quem

Bolívia

A exploração e a produção do mineral são totalmente controladas pelo estado, por meio da estatal Yacimientos de Litio Bolivianos (YLB). As 21 milhões de toneladas de lítio estão em reservas concentradas apenas no Salar de Uyuni (Potosi).

A industrialização do lítio é a grande aposta do país para o desenvolvimento econômico. A Bolívia espera que, em 2025, o valor de vendas de produtos nacionais derivados de baterias de lítio e lítio alcance US$ 3 bilhões. Em 2019, esse montante foi de pouco mais de US$ 5 milhões.

Ontem, (6/7) a YLB fechou um convênio com a Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) para que a petroleira com sua expertise possa ajudar a companhia no processo de industrialização do mineral.

  • A YLB está construindo uma planta industrial em Uyuni, que poderá produzir quinze mil toneladas de carbonato de lítio por ano. A inauguração está prevista para o final deste ano, e a produção a partir de 2023. “Há firme decisão de avançar na cadeia produtiva agregando valor aos nossos recursos naturais”, afirma o comunicado da estatal YLB.
  • Para isso, a companhia abriu uma chamada pública para empresas internacionais que possuam tecnologia adequada para operar no processo de exploração. Foram classificadas quatro empresas da China, uma da Rússia e outra dos Estados Unidos.

Lembra? Elon Musk, sempre ele, foi mais uma vez notícia internacional quando em 2020 defendeu casualmente que os EUA, à época de Donald Trump, dessem golpes mundo afora para garantir acesso ao mineral.

“Vamos dar um golpe em quem quisermos! Lide com isso”, twittou o bilionário, ao ser acusado de ter envolvimento na queda do presidente boliviano, Evo Morales — hoje de volta ao poder.

Outro dia, o dono da Tesla esteve por aqui, com Jair Bolsonaro (PL), prometendo a expansão dos serviços de satélite no país. A Tesla é uma das principais interessadas no lítio, uma vez que é a maior fabricante de carros elétricos do mundo.

Argentina

País é o quarto maior produtor mundial de lítio com 7,4% de participação de mercado em 2019, depois da Austrália (52,2%), Chile (22,4%) e China (12,5%).

“Não queremos apenas ser países exportadores de carbonato de lítio, que só tenhamos a matéria-prima, mas (ser) capazes de atingir (…) a produção até chegar às baterias”, disse Filmus.

São duas minas de lítio em operação, seis em construção e 50 projetos de exploração, sendo 28 deles em estágio avançado, de acordo com dados do governo do país.

No marco regulatório argentino, as minas de lítio podem ser adquiridas por qualquer agente privado, nacional ou estrangeiro, via concessões.

Nos últimos meses:

  • O governo de Alberto Fernández anunciou US$ 500 milhões para a instalação da primeira planta de desenvolvimento tecnológico para células baterias de lítio.
  • O grupo francês Eramet anunciou US$ 400 milhões para retomar a construção de uma fábrica, em conjunto com a siderúrgica chinesa Tsingshan. A planta terá capacidade para processar 24 mil toneladas/ano, com operação prevista para 2024.
  • A chinesa Zijin Mining Group planeja aportar US$ 380 milhões para a construção de uma planta de carbonato de lítio em Catamarca.
  • E a Livent, dos Estados Unidos, diz que vai investir mais de US$ 1 bilhão para expansão da produção no Salar del Hombre Muerto, em Salta. Pretende atingir até o final de 2025 uma capacidade anual de produção de 60 mil toneladas de carbonato de lítio e nove mil toneladas de cloreto de lítio.

Chile

Potência mineral da região, o Chile pretende criar uma estatal para o lítio, porém não aos moldes da Bolívia.

“A Companhia Nacional de Lítio será criada como uma associação público-privada, mas onde o Estado terá uma representação majoritári”, explicou a Ministra de Minas, Marcela Hernandoa senadores do país.

O Chile tem 18 salinas com potencial para extração de lítio. O governo de Gabriel Boric defende a criação de uma indústria com a participação de comunidades, para desenvolvimento social e com requisitos de sustentabilidade.

Entre outras ações, Boric promete criar um instituto de pesquisa e desenvolvimento em lítio e salinas, para investigar novos métodos de extração.

  • A Sociedad Química y Minera de Chile está atualmente desenvolvendo sua expansão no Salar del Carmen, e de uma planta de carbonato de lítio com capacidade de 180 mil toneladas por ano.
  • A Albemarle, por sua vez, está executando a fase 3 da expansão de sua planta de carbonato, com o qual espera aumentar sua capacidade anual em 88 mil toneladas por ano.

Cobrimos por aqui

México

Em abril, o Congresso Nacional mexicano aprovou mudanças na lei de mineração e nacionalizou as reservas de lítio. Com isso, ficou vetada a participação de empresas privadas, sejam nacionais ou estrangeiras na exploração do minério.

O presidente Andrés Manuel López Obrador afirmou, em um dos seus discursos diários, que mantém contato com suas contrapartes da Argentina, Bolívia e Chile para analisar a criação de uma associação em torno do lítio.

Diz Obrador que, nas conversas com os líderes latino-americanos, se fala sobre o “objetivo de criar uma associação para nos ajudar mutuamente”.

“No caso do Chile e da Argentina, são empresas privadas, mas o governo está interessado em ajudar a explorar o lítio, com esse sistema particular de exploração mineral”, afirmou.

O México possui 36 concessões na indústria de lítio, controladas por dez empresas de capital estrangeiro. Apesar disso, atualmente não há extração do minério.

  • Aliás, Obrador ordenou uma revisão das concessões de lítio, incluindo as do projeto de US$ 420 milhões da chinesa Ganfeng Lithium, o único grande projeto mais avançado de lítio do México, que está programado para a iniciar a produção no segundo semestre de 2024. BN

E Brasil

Por aqui, o governo Bolsonaro editou um decreto que flexibiliza as exportações de lítio. Segundo estimativa do Ministério de Minas e Energia (MME), cerca de R$ 15 bilhões poderiam ser investidos na produção do minério até 2030. Hoje, apenas a Companhia Brasileira de Lítio (CBL) e a AMG Brasil atuam na área.

A co-CEO da canadense Sigma Lithium Resources Corporation, Ana Cabral-Gardner, acredita que o decreto pode destravar investimentos nos próximos anos, o que pode colocar o Brasil em uma “posição imbatível para alimentar a América do Norte e a Europa”.

  • “Devido a essa regulamentação anacrônica, que classificou o lítio como de interesse nuclear, ele caiu em um loop regulatório que não tornou o produto competitivo”, disse Cabral-Gardner à Reuters.
  • A mineradora canadense espera iniciar a produção em sua mina brasileira de lítio em dezembro, visando uma produção anual de 37 mil toneladas de carbonato de lítio.

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