NESTA EDIÇÃO. Depois da biodiversidade e clima, acordo sobre plásticos expõe esgotamento do multilateralismo.
Negociadores tentam garantir um tratado internacional para reduzir a poluição por plástico até 1º de dezembro, mas um rascunho que circulou nesta sexta (29) mostra que as divergências são muitas.
A começar pelas definições: são oito possibilidades para plástico e cinco para o significado de poluição plástica.
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Estudo da OCDE publicado no início de outubro afirma que uma ação política global ambiciosa em todo o ciclo de vida do plástico pode dissociar o crescimento econômico do uso de plástico, quadruplicar a taxa média global de reciclagem (de 9,5% em 2020 para 42% em 2040) e reduzir em 96% o vazamento de resíduos plásticos para o meio ambiente até 2040.
Atuar no ciclo de vida significa mudar o modelo de produção, reduzir a demanda, incentivar a circularidade, melhorar a reciclagem e interromper vazamentos – isto é, despachar o lixo plástico para países pobres onde a regulação é mais frágil.
É o que se tenta construir esta semana, em Busan, na Coreia do Sul, com um tratado juridicamente vinculativo para reduzir a poluição por plásticos.
Segundo a ONU, todos os anos, cerca de 460 milhões de toneladas são produzidas e só 10% desse volume é reciclado.
Mas, assim como observamos ao longo das últimas semanas na COP16 da biodiversidade e na COP29 do clima, chegar a um acordo em um mundo fragmentado por interesses econômicos diversos tem sido tarefa exaustiva e levado a resultados frustrantes.
Caso tenha perdido:
Rascunho do acordo (.pdf) que circulou nesta sexta (29/11) mostra que a apenas dois dias para os negociadores chegarem a um desfecho, ainda há importantes diferenças a serem resolvidas até chegar a um texto com poder de induzir alguma mudança real.
A começar pelas definições: são oito opções para “o que é plástico”, cinco para “poluição por plásticos” e “resíduos plásticos” e quatro para “produtos plásticos”.
Pontos de atenção
Produção é um dos principais pontos de discórdia, relata a AFP. Diversos países se uniram em torno de uma proposta liderada pelo Panamá para adesão a uma meta de redução após a assinatura do tratado.
Mas o rascunho traz uma alternativa que elimina o artigo 6, destinado ao suprimento ou produção sustentável (o título do artigo também está indefinido, entre colchetes), acolhendo uma sugestão da Arábia Saudita.
“Agora a batalha será baseada na defesa desse artigo. Não estamos aqui para negociar um tratado de greenwashing e reciclagem”, disse à agência francesa o representante Especial para as Alterações Climáticas do Panamá, Juan Carlos Monterrey Gomez.
Vale dizer: divergências internas dentro da delegação brasileira fizeram o país desistir de enviar uma proposta de eliminação de plásticos problemáticos.
De acordo com a Pública, a decisão veio do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, que pretende aprofundar os impactos econômicos de possíveis banimentos relacionados aos plásticos de uso único (os descartáveis) e do PVC, usado em encanamentos pela construção civil, antes de apresentar uma posição.
Dinheiro também é importante e motivo de disputa. Apesar de aparentar convergência em relação à proposta de vincular a implementação das ações do tratado à mobilização de recursos para que se possa cumprir as metas, a criação de um fundo de princípio “poluidor-pagador” ainda não está fechada.
Esse fundo é indicado por organizações ambientais como essencial para responsabilizar os produtores e incentivar a busca por novas alternativas, ao mesmo tempo em que se busca financiar iniciativas de despoluição em países onde esses resíduos já estão causando problemas.
Metas só depois? Por enquanto, o artigo que trata da produção está deixando a definição de metas para uma fase posterior, o que também preocupa ambientalistas.
A WWF avalia que o rascunho não contém medidas específicas, como proibições globais de produtos plásticos de alto risco e produtos químicos preocupantes, o que representaria um fracasso para o tratado.
Já o Greenpeace diz que qualquer tratado final deve incluir uma meta para reduzir a produção de novos plásticos.
Cobrimos por aqui
Curtas
Fundo verde. O Senado Federal marcou para 4 de dezembro a votação Programa da Aceleração da Transição Energética (Paten), após o relator Laércio Oliveira (PP/SE) desistir das propostas para reduzir a concentração da Petrobras na oferta de gás natural. O calendário foi definido ontem (28/11), em reunião de líderes com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD/MG). Ele próprio vinha cobrando celeridade na tramitação do Paten.
Logística para eólica offshore. O Porto do Açu, no Rio de Janeiro, assinou, na quinta (28/11), um memorando de entendimento (MoU) com a empresa belga Sarens, para estudar parcerias em soluções logísticas no transporte de componentes da cadeia de energia eólica offshore. O plano é ser um hub de apoio à indústria, além de um polo de fabricação e montagem da cadeia de valor.
Hub de hidrogênio na Bolívia. A estatal YPFB revelou, na última semana, que estuda o desenvolvimento de quatro projetos de hidrogênio verde na Bolívia, nas regiões de Entre Ríos, Río Grande, Warnes e Villa Montes. Segundo o diretor de avaliação e controle de projetos da companhia, os resultados são esperados para o terceiro trimestre de 2025.
Terras raras em MG. A mineradora Cabo Verde Mineração, por meio de sua controladora COPEM, anunciou na quinta (28/11) a descoberta de elementos terras raras (ETR) em suas áreas de exploração nos municípios de Cabo Verde, Muzambinho e Botelhos, localizados no Sul de Minas Gerais. A companhia espera investir R$ 70 milhões em uma planta de beneficiamento.
Indonésia de olho na nuclear. A Indonésia está em negociações com os Estados Unidos e a Rússia sobre a aquisição de tecnologia para desenvolver usinas nucleares. A maior economia do Sudeste Asiático planeja operar os reatores já em 2036 para reduzir sua dependência de combustíveis fósseis, segundo Vivi Yulaswati, vice-ministra do Ministério do Planejamento do Desenvolvimento Nacional. (Reuters)
Navios no mercado de carbono. O Reino Unido abriu uma consulta sobre mudanças em seu sistema de comércio de emissões (ETS) para incluir o transporte marítimo a partir de 2026. Atualmente, o esquema abrange usinas de energia, fábricas e companhias aéreas que representam cerca de um terço das emissões da Grã-Bretanha. (Reuters)
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