NESTA EDIÇÃO. Declaração de ministros de Energia do G20 reafirma papel da geração nuclear na transição global.
No Brasil, de matriz elétrica 90% renovável, indústria enxerga espaço para substituir térmicas fósseis na base, garantindo estabilidade ao sistema sem emitir carbono.
E ainda: Nuclep desenvolve submarino com reator nuclear.
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A declaração de ministros de Energia que marcou a conclusão do grupo de trabalho sobre transições energéticas do G20 trouxe uma sinalização positiva para a indústria nuclear, ao incluí-la como um caminho para preencher lacunas entre a demanda crescente por eletricidade e a necessidade de reduzir emissões.
Depois de dois anos sem consensos no GT, as vinte maiores economias globais concordaram que a descarbonização da matriz global precisará contar com diferentes alternativas livres de CO2, inclusive os reatores nucleares.
“Tomamos nota de que os países que optam pelo uso seguro e pacífico de energia nuclear civil, com base em seu contexto doméstico, reafirmam seu papel na contribuição para a redução das emissões de GEE, para o alcance do ODS 7 e para garantir a segurança energética”, diz o documento que marcou vitórias da diplomacia brasileira nas negociações.
Estados Unidos, França e Japão são alguns países que já integraram a nuclear em suas estratégias net zero. No Brasil, a indústria tem defendido sua complementaridade à matriz elétrica já renovável, como um fator de segurança energética.
“Quando falamos de transição energética, é um volume de energia muito grande. Imagine trocar tudo que advém do petróleo? É impossível para uma fonte. Além disso, é preciso ter fontes estáveis, que funcionem mais de 92% do tempo. Só nuclear entrega isso”, comenta Celso Cunha, presidente da Abdan (Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares).
Em entrevista à agência eixos na semana passada, em Foz do Iguaçu (PR), onde ocorriam as negociações do G20 de energia, Cunha defendeu que a integração da fonte como base, substituindo termelétricas a combustíveis fósseis, como gás e carvão, que hoje fazem esse papel.
“O Brasil não tem um problema de energia. Temos hidrelétricas, sol, vento. Mas cada uma tem uma propriedade. Solar e eólica são intermitentes. Quando saem, são 17 a 19 GW, o que complica a operação de um sistema que nasceu calçado nas hidrelétricas”.
US$ 125 bi em investimentos anuais
Para o presidente da Abdan, a nuclear já provou que é segura e os massivos investimentos em inovação estão possibilitando a expansão da tecnologia ao redor do mundo.
Pelo lado da demanda, há um interesse crescente vindo de setores que precisam de energia limpa e estável. O exemplo mais recente vem da Microsoft, que assinou um acordo com a Constellation, no final de setembro, para fornecimento de energia para data centers nos Estados Unidos a partir da usina nuclear de Three Mile Island, na Pensilvânia.
O acordo terá duração de 20 anos e vai levar ao religamento da usina, que teve as atividades interrompidas em 2019.
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Estudo da McKinsey estima que serão necessários de 400 a 800 GW adicionais de energia nuclear até 2050 — o que pode representar de 10% a 20% da futura demanda global de eletricidade. Atualmente, a fonte já responde por 10% da geração mundial, o que significa que sua expansão precisará acompanhar o ritmo de crescimento da demanda.
Entre 2024 e 2026, espera-se uma capacidade adicional de 29 GW de energia nuclear entrando em operação em todo o mundo, sendo mais da metade na China e na Índia. Já a geração deve ter um crescimento de cerca de 3% ao ano, em média, até 2026, se aproximando de 3 mil TWh.
“A quantidade de usinas nucleares no mundo está crescendo porque sem nuclear não tem transição energética. Fala-se em US$ 125 bilhões de investimento anual entre 2033 e 2050”, completa Cunha.
Reator na propulsão submarina
Além do fornecimento de eletricidade, a energia nuclear também é uma alternativa para descarbonizar a frota marítima, substituindo a propulsão a combustíveis fósseis em navios e submarinos.
No Brasil, a Nuclep (Nuclebrás Equipamentos Pesados) está desenvolvendo um submarino com propulsão nuclear, cuja tecnologia pode ser aproveitada, no futuro, também para pequenos reatores modulares (SMR, em inglês).
“Todos os submarinos que navegam em águas brasileiras tiveram os cascos construídos na Nuclep. Neste momento, estamos construindo o Bloco 40, que é o bloco onde ficará alojado o reator nuclear dos futuros submarinos de propulsão nuclear da Marinha do Brasil”, conta Carlos Seixas, presidente da Nuclep, à agência eixos.
A fase é de protótipo, de escala 1:1, que ainda passará por testes. Só então a estatal passará para a produção da embarcação.
Seixas explica que este tipo de projeto é estratégico do ponto de vista de domínio da tecnologia, já que só cinco países no mundo (China, Estados Unidos, França, Grã Bretanha e Rússia) possuem submarinos nucleares – todos membros do Conselho de Segurança da ONU.
“Se o Brasil conseguir entrar para este seletíssimo grupo, vamos dar um salto estratégico gigante. Propulsão nuclear ninguém dá, ninguém vende e, se possível, dificulta sua vida”, comenta.
“Vamos dar um salto estratégico ao termos um equipamento que vai poder proteger as águas jurisdicionais brasileiras, nossa Amazônia Azul, como também vamos dar um salto gigante na área de energia nuclear, porque seremos capazes de confeccionar o nosso próprio reator”, completa o presidente da Nuclep.
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Curtas
Térmica a carvão. O Ministério de Minas e Energia abriu consulta pública sobre o contrato de energia de reserva para comercialização da energia produzida pelo Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, localizado em Capivari de Baixo (SC). O complexo é composto por quatro usinas com potência total instalada de 740 MW. Junto com a usina Candiota 3, no Rio Grande do Sul, essas UTEs são as que mais emitem carbono por cada MWh gerado.
Foco no desmatamento. O secretário de Economia Verde do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Rodrigo Rollemberg, afirmou, na quarta (9/10), que as metas brasileiras de descarbonização devem focar no desmatamento e evitar custos para a indústria. “A nossa indústria é responsável por 10% apenas das emissões, 6% do processo industrial e 4% da utilização de energia”, disse o secretário.
SAF de biogás para a Europa. A Geo Biogas & Carbon anunciou uma parceria com a Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável (GIZ) para uma primeira planta no Brasil para produção de combustível de aviação sustentável (SAF, na sigla em inglês) a partir de biogás, em conjunto com a Copersucar. O objetivo é desenvolver a produção em escala comercial que atenda o mercado europeu.
Eólica para exportação. A política industrial brasileira deve discutir a eliminação de travas para que o país exporte equipamentos e serviços para geração eólica, defende a presidente da Abeeólica, Elbia Gannoum. Alta tributação, dificuldades logísticas e questões relacionadas aos modelos de financiamento para projetos de exportação são as principais barreiras para que os fornecedores instalados no Brasil consigam vender equipamentos a outros países.
Cimento com CCS. A thyssenkrupp e o Grupo TITAN assinaram na quarta (9/10) um contrato de engenharia para projeto de captura e armazenamento de carbono (CCS, em inglês) em uma fábrica de cimento na capital grega Atenas. Chamado Ifestos, o projeto é um dos maiores empreendimentos de CCS da Europa e visa a produção de cimento e concreto com zero emissão.
Exclusivo para mulheres pretas. A produtora independente de petróleo BRAVA Energia está com inscrições abertas para o Programa Jovem Aprendiz, com vagas voltadas exclusivamente para mulheres que se autodeclaram pretas. As inscrições vão até 27 de outubro. Ao todo são 13 vagas distribuídas no Rio de Janeiro (RJ), Catu (BA), Candeias (BA), Mossoró (RN), Macau (RN) e Icapuí (CE), nas áreas de suprimentos, jurídico, financeiro, operações, TI, administrativo e pessoas.