Diálogos da Transição

Mundo depende da bioenergia de emergentes para o net zero

Sem bioenergia de emergentes, conta da descarbonização não fecha, diz co-líder da força-tarefa de biocombustíveis da IEA

Glaucia Mendes
Souza, pesquisadora e professora titular do
Departamento de Bioquímica da Universidade de São Paulo (USP) e
coordenadora do Programa de Bioenergia (BIOEN) da Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp)
Glaucia Mendes Souza, pesquisadora e professora titular do Departamento de Bioquímica da Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do Programa de Bioenergia (BIOEN) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp)

NESTA EDIÇÃO. Sem bioenergia de emergentes, conta da descarbonização não fecha, diz co-líder da força-tarefa de biocombustíveis da Agência Internacional de Energia.
 
Estudo apresentado na reunião ministerial do G20 de Transições Energéticas aponta alto potencial de redução de emissões do etanol e biodiesel em países do Sul Global.
 
É preciso, porém, modernizar metodologias que analisam a intensidade de carbono no uso da terra.


EDIÇÃO APRESENTADA POR

Aumentar ou introduzir percentuais de etanol na gasolina, e biodiesel no diesel, em onze mercados emergentes poderia proporcionar um corte de quase 300 milhões de toneladas de CO2/ano – das 800 milhões de tCO2 que precisam ser mitigadas no setor de transportes, calcula a Task Force 39, uma força-tarefa da Agência Internacional de Energia (IEA) dedicada ao papel dos biocombustíveis na transição.
 
Isso seria possível com misturas de variam de 5,5% a 40%

Apresentado no início de agosto aos ministros de Energia do G20, o estudo será lançado oficialmente na próxima semana, durante a conferência internacional BBEST – IEA Bioenergy 2024.

Foram avaliados cenários na Argentina, Brasil, Colômbia, Guatemala, África do Sul, Etiópia, China, Índia, Malásia, Tailândia e Indonésia, que, juntos, poderão responder por um aumento de até 117% nas emissões globais se mantidas suas taxas de crescimento econômico e se não houver substituição do consumo de combustíveis fósseis.

“Esses países estão crescendo e não são países que têm infraestrutura para ir pela rota de eletrificação. Essa rota vai ser boa para alguns países que não têm opções e têm infraestrutura para fazer eletrificação”, explica a professora Glaucia Souza, coordenadora do programa de Pesquisa em Bioenergia Fapesp e co-líder da Task Force 39.  

Em entrevista à agência eixos, Souza conta que os cientistas calcularam quanto é possível produzir de biocombustíveis sem criar pressão sobre florestas ou competir com alimentos. Foram consideradas, por exemplo, áreas de pastagens que podem ser recuperadas com cultivo de cana, soja, milho, entre outras matérias-primas que, em até três anos, passariam a capturar carbono no solo.

“Não queremos expandir sobre ecossistemas naturais. Eles têm condições climáticas, terra, know-how já de plantio. Estamos otimistas que é possível, mas é possível com vontade política”, comenta a professora da USP.

Além de reduzir emissões quando substituem fósseis, capturar carbono no solo e serem soluções prontas – muitos desses países já adotam biocombustíveis, seria apenas uma questão de aumentar a participação – é possível tornar o combustível final mais barato.

“Analisamos a viabilidade econômica porque isso é um ponto importante. Nós sabemos o que acontece quando alguém tenta aumentar muito o preço da gasolina. Daqui a pouco está todo mundo insatisfeito. [Na nossa análise, o combustível] fica 10% mais barato”.

Ainda de acordo com Souza, mesmo nações do Sudeste Aisático, próximas da China e, portanto, com acesso aos veículos elétricos, estão olhando para os biocombustíveis de primeira geração como alternativa imediata.



Biodiesel e etanol já são amplamente utilizados, mas há um novo combustível chegando no mercado e demandando articulação dos potenciais produtores para garantir certificações que considerem suas características regionais.
 
“Estamos no momento de certificação do SAF (combustível sustentável para aviação), e é preciso colocar o Brasil, a maneira como o Brasil faz biocombustível, em comparação com a maneira que todos os outros países vão fazer seus biocombustíveis, para alinhar, harmonizar isso”, diz a líder da força-tarefa.
 
“Serão pagos prêmios para quem demonstrar que está reduzindo emissões. E aí fica uma discussão enorme dos critérios, porque são muitos critérios que você tem que considerar”, completa.
 
Ela cita como exemplo o etanol de milho de segunda safra, algo específico do Brasil, e as pesquisas de melhoramento genético da cana que estão revolucionando a forma como se produz biocombustível.
 
São investimentos em pesquisa que refletem em uma produção mais eficiente, com menor consumo de energia e outros recursos e, consequentemente, menor impacto ambiental.
 
“Na USP, desenvolvemos uma cana, a partir de cruzamentos com ancestrais, que está chegando a 200 toneladas por hectare. A média mundial é de 70 toneladas por hectare. Estamos quase triplicando a produção”, conta.
 
“Se você quiser diminuir custos e emissões, a melhor maneira de fazer isso é no campo. Então, você diminui o uso de fertilizantes que são feitos do petróleo e o uso da energia, a usina deve ser autossuficiente em energia”, exemplifica.

O iLUC é uma metodologia que analisa o impacto da produção no uso da terra e tem servido de base para o mercado Europeu criar barreiras aos biocombustíveis de origem agrícola.
 
Algo que precisa ser revisado – e está na agenda do governo brasileiro.
 
Para a professora, o mais efetivo é fazer a contabilidade do carbono, mantendo a neutralidade tecnológica e concentrando os esforços em viabilizar produtos que realmente contribuam para a sustentabilidade global.
 
RenovaBio já faria isso, no Brasil, ao impedir a certificação de produtores cuja matéria-prima vem de área desmatada de 2018 em diante.
 
“As reuniões do grupo de trabalho do G20 de transições energéticas já divulgaram suas resoluções e recomendações. Agora vamos discutir o próximo passo. Está bem claro que está reconhecida a necessidade da gente ampliar a produção de biocombustíveis. Mas sem os mercados emergentes, essa conta para diminuir emissões não vai fechar”, analisa.


Hub de hidrogênio em Cubatão. A cidade litorânea de São Paulo pode se tornar o primeiro hub brasileiro de hidrogênio verde fora da região Nordeste. Parceria entre a Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável (GIZ) e o Ministério de Minas e Energia (MME) estuda o potencial do município
 
Transporte de hidrogênio. A ExxonMobil Brasil e a Universidade de São Paulo (USP) vão desenvolver tecnologias para transporte de hidrogênio. A petroleira está aportando R$ 24 milhões da cláusula de PD&I da ANP para desenvolver novas tecnologias para o setor. O projeto visa aumentar a qualidade de dutos de aço para transportar o gás de forma mais segura e eficiente.
 
Amônia verde em plataforma de investimentos. A Atlas Agro, empresa que desenvolve uma planta de hidrogênio verde para produção de fertilizantes em Minas Gerais, foi selecionada para fazer parte do Acelerador de Transição Industrial (ITA, na sigla em inglês). Criado no ano passado durante a COP28, o ITA é uma plataforma que reúne líderes globais, instituições financeiras e governos para direcionar investimentos para projetos que apresentem soluções de descarbonização na indústria pesada e no transporte.
 
Coprocessado na Vale. Petrobras e Vale assinaram nesta sexta (18/10) um acordo para fornecimento de diesel coprocessado com óleo vegetal, batizado pela petroleira de Diesel R, para uso nos veículos da mineradora. O produto está abastecendo uma locomotiva, que percorre o trajeto da estrada de ferro do Espírito Santo a Minas Gerais; além de um caminhão fora de estrada com capacidade para 214 toneladas.
 
P&D para armazenamento de energia. A chinesa SolaX Power anunciou esta semana um investimento de US$ 1,49 bilhão na construção de uma unidade de pesquisa e fábrica de ponta na na província de Zhejiang, com foco no armazenamento de energia e sistemas inteligentes. Com faturamento anual de US$ 800 milhões e presente em 80 países, a companhia destinará mais de um bilhão de dólares a ativos fixos, a SolaX afirma que essas instalações vão acelerar sua inovação, com reflexos também no mercado brasileiro, com produtos desenvolvidos especificamente para o país.

O futuro do hidrogênio entre otimismo e ceticismo Apesar do otimismo inicial, o entusiasmo que envolveu o hidrogênio no início da década começa a encontrar uma resistência pragmática, principalmente entre os agentes da indústria de energia e óleo e gás, escreve o jornalista Gabriel Chiappini
 
A biorrevolução como caminho para a construção de uma sociedade mais sustentável Quando pensamos em futuro, não há outro caminho a não ser o mais verde possível, escreve Antonio Queiroz, VP da Braskem
 
O Brasil é protagonista do setor energético? Precisamos transformar a utilização da energia em um serviço de excelente qualidade e não somente um ativo, escreve Mikio Kawai Jr., CEO do Grupo Safira
 
MP 1266: alívio tributário para beneficiários do drawback Medida trouxe um alívio para as empresas afetadas pelos desastres que ocorreram por volta do final do mês de abril no Rio Grande do Sul, analisa a tributarista Thianne de Azevedo Silva Martins