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Brasil pode dar salto verde na indústria até 2050 — o problema é o meio do caminho

Estudo mostra que indústria verde é possível no Brasil; mas projeções para setor apontam crescimento perdendo ritmo no curto prazo

Área industrial da planta de renováveis e produção de plástico verde da Braskem (Foto: Bitenka e Leonardo Reis/Divulgação)
Área industrial da planta de renováveis e produção de plástico verde da Braskem (Foto: Bitenka e Leonardo Reis/Divulgação)

NESTA EDIÇÃO. Estudo indica que Brasil tem potencial de cortar até 60% das emissões de energia e indústria e virar sumidouro de carbono até 2050. 

Mas setor está desacelerando e esbarra em juros altos, incertezas geopolíticas e falta de sinais sobre minerais críticos.


As emissões de energia e indústria no Brasil podem cair de cerca de 510 milhões de toneladas CO2 por ano em 2023 para cerca de 460 MtCO2 por ano em 2050, ou despencar para 200 MtCO2 por ano, a depender das decisões políticas, econômicas e tecnológicas que adotar a partir de agora, mostra um estudo da Schneider Electric.
 
Desenvolvido em parceria com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), o estudo (.pdf) foi lançado em novembro, para subsidiar debates da COP30. 
 
E traz dois cenários, Terra Firme e Salto Verde, explorando caminhos que o país poderia seguir em sua trajetória de substituição de combustíveis fósseis
 
Em ambos os cenários, há uma modernização radical da economia brasileira até 2050, levando, em primeiro lugar, a melhorias significativas nos padrões de vida, seguido pela expansão do setor industrial
 
Os maiores potenciais estão na siderurgia verde (produção 2,7 a 4 vezes maior até 2050), indústrias químicas (produção 40 a 50% maior) e setores de mineração (aumento de 50%) e manufatura.
 
Matriz majoritariamente renovável, potencial em hidrogênio verde, abundância de recursos naturais e papel central na preservação de ecossistema são as principais vantagens do Brasil nessa corrida global.
 
No cenário “Salto Verde”, o relatório aponta que a modernização acelerada da infraestrutura elétrica e o avanço das energias renováveis permitem reduzir em até 60% as emissões até 2050, levando o país à neutralidade sem a necessidade de tecnologias de captura de carbono. 
 
Nele, a participação da eletricidade no consumo final salta de 18% para 58% — impondo a expansão da infraestrutura de geração e transmissão do país.
 
A eletrificação da mobilidade e a modernização do setor produtivo juntas também poderiam liberar até 33 milhões de hectares atualmente utilizados para biocombustíveis, cuja restauração florestal tem potencial de remover até 200 MtCO2 anualmente. 
 
Essa projeção levaria o Brasil a se tornar um sumidouro líquido de carbono até meados do século.



Apesar do futuro promissor, o presente tem se mostrado desafiador para a indústria.
 
Nesta quarta (10/12) a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou seu relatório com projeções para a economia brasileira em 2026, indicando que o setor tende a perder ritmo em relação a 2025, crescendo 1,1%.
 
A expectativa é que o PIB brasileiro cresça 1,8% em 2026, puxado pelo setor de serviços, cuja expectativa é de alta de 1,9%, enquanto a agropecuária deve se manter estável. 
 
Juros altos e o enfraquecimento do mercado de trabalho são apontados como os principais fatores da desaceleração da economia. 
 
Segundo o presidente da CNI, Ricardo Alban, essas projeções já consideram políticas recentes direcionadas à transição energética, como Combustível do Futuro, incentivos ao hidrogênio e aos data centers.
 
Ainda assim, sozinhas, elas não foram capazes de mitigar os efeitos da alta taxa de juros sobre os negócios, refletindo desafios que também estão presentes em outras economias.
 
“Essas projeções consideram a economia como um todo. E os impactos a gente consegue vislumbrar hoje. Porque assim como nós vimos que muitas decisões ficaram postergadas na COP30, nós temos hoje muitos países revisitando, não só os Estados Unidos, mas outros países com relação à velocidade da transição energética. Mas dentro de uma situação mediana que nós estimamos, foi considerada a evolução hoje desses processos”, disse o presidente da CNI a jornalistas nesta quarta.
 
Terras raras e minerais críticos, no entanto, que têm potencial de impulsionar os resultados da indústria extrativa, ficaram de fora, por falta de sinais políticos claros.
 
“A mineração de terras raras, a agregação de valor, não foi considerada porque nós não temos ainda todos os caminhos”, comentou.
 
Por outro lado, o presidente da CNI aponta que as empresas estão engajadas em investimentos para responder aos desafios da emergência climática, transformação digital e neoindustrialização.
 
Ele cita como exemplos o Fundo Clima, que entre 2023 e outubro de 2025 autorizou mais de R$ 7 bilhões para a indústria, o equivalente a cerca de 40% dos recursos do período, e a construção da SB-COP, iniciativa do setor privado para participar ativamente dos debates sobre transição e descarbonização.
 
“Essa missão começou na COP30. Em poucos meses, articulamos 24 confederações empresariais nacionais e supranacionais que representam cerca de 40 milhões de empresas em mais de 60 países. Isso mostra que o setor privado está pronto para agir, cooperar e liderar a transição dele”, defende.


Acordo Mercosul-UE. A União Europeia enxerga o acordo comercial com o Mercosul como uma peça-chave para garantir o acesso a minerais críticos indispensáveis à transição energética, às tecnologias digitais e à autonomia estratégica do bloco.

  • Representantes do Parlamento e da Comissão Europeia destacaram em webinar, na semana passada, que o tratado abre uma janela para reposicionar a relação entre as duas regiões, com o Brasil no centro da estratégia de fornecimento de matérias-primas estratégicas.

Neutralidade climática. A presidência do Conselho Europeu e os representantes do Parlamento chegaram a um acordo provisório sobre a alteração da Lei Europeia do Clima, para introduzir a meta climática intermediária de redução de 90% nas emissões líquidas até 2040. De acordo com comunicado oficial enviado nesta quarta-feira (10/12), o acordo define certas áreas de “flexibilidade”.
 
Regras mais frouxas. Sob pressão interna e externa, a União Europeia decidiu relaxar suas novas regras de sustentabilidade corporativas. Apenas as maiores empresas estarão sujeitas a auditorias em suas cadeias, o que libera cerca de 80% das companhias. A obrigação de apresentar plano de transição climática também caiu. Reset
 
Etanol com CCS. O BNDES aprovou R$ 384,3 milhões para projeto da FS de captura e armazenamento de carbono (CCS) a partir da produção de etanol de milho em Lucas do Rio Verde (MT). A unidade vai comprimir, injetar e armazenar CO2 nos reservatórios da Bacia dos Parecis, próximos à indústria.
 
Orçamento da CDE em consulta. A Aneel abriu, nesta quarta (10/12), uma consulta pública sobre o orçamento da Conta de Desenvolvimento Energético para 2026, inicialmente previsto em R$ 52,7 bilhões. O valor é 7% maior que os R$ 49,2 bilhões de 2025.
 
Tarifa horária. A agência reguladora também abriu uma consulta pública sobre a aplicação automática da tarifa horária para os consumidores de baixa tensão com consumo mensal igual ou superior a 1 MWh. A proposta prevê implementação até o fim de 2026. 
 
Sessão vazia. Em sessão esvaziada nesta quarta-feira (10/12), a Comissão de Minas e Energia da Câmara avaliou apenas três dos oito itens da pauta. Foram aprovados os relatórios do projeto de lei que cria um substituto para o programa Luz para Todos e do PL que exclui a energia nuclear do encargo da Reserva Global de Reversão (RGR), destinado a financiar melhorias do sistema elétrico.
 
Petroleiros em greve. Os petroleiros do Sistema Petrobras aprovaram o início de uma greve a partir de segunda-feira (15/12), após a FUP considerar insuficiente a segunda contraproposta para o Acordo Coletivo de Trabalho de 2025. Segundo os sindicatos, a companhia não incluiu três dos pontos principais exigidos.
 
Apagão em SP. A Enel São Paulo afirmou que suas equipes estão atuando para restabelecer o fornecimento de energia elétrica a cerca de 972 mil imóveis, que representam 12,9% das unidades atendidas pela empresa. A região foi afetada por fortes rajadas de vento desde a madrugada, com a entrada de um ciclone extratropical pelo Sul do país.

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