Diálogos da Transição

A caminho de 3,1°C, mundo precisa alinhar política econômica e ação climática – urgente

Grandes economias globais devem adotar novos caminhos de desenvolvimento, defende TF Clima

Sobrevoo no Parque Nacional de Brasília, atingido por incêndio de grandes proporções, em 15 de setembro de 2024 (Foto Ricardo Stuckert/PR)
Sobrevoo no Parque Nacional de Brasília, atingido por incêndio de grandes proporções, em 15 de setembro de 2024 (Foto Ricardo Stuckert/PR)

NESTA EDIÇÃO. As políticas atuais estão colocando o planeta em direção a um aquecimento de até 3,1 °C, o dobro da meta do Acordo de Paris.
 
Os custos da inação climática serão superiores aos custos da ação, alertam especialistas. Em um relatório encomendado pela presidência do G20, grupo recomenda mais ambição em estratégias industriais verdes.
 
E pedem reorientação de subsídios destinados aos fósseis para tecnologias renováveis.


EDIÇÃO APRESENTADA POR

“Todos os membros do G20 devem adotar estratégias industriais verdes ambiciosas para impulsionar o crescimento econômico sustentável e inclusivo” é a primeira recomendação de um relatório lançado na quarta (23/10) pelo Grupo de Especialistas da Força-Tarefa do Clima (TF Clima), em Washington DC (EUA). 
 
documento (.pdf) foi elaborado a pedido da Presidência Brasileira do G20 e chegou um dia antes de o Programa para o Meio Ambiente da ONU divulgar seu Gap Report alertando que a continuidade das políticas atuais levará a um aumento catastrófico da temperatura de até 3,1 °C neste século.
 
A TF Clima é enfática: as maiores economias globais devem adotar novos caminhos de desenvolvimento que conciliem o crescimento econômico com a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. 

  • Tecnicamente, a meta de 1,5°C ainda é possível, mas depende de um esforço enorme. (Veja mais abaixo)

Isso requer uma nova governança global, políticas financeiras orientadas em torno das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) e apoio econômico – de verdade – para países com alto custo de capital.

“O objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais exige uma ação urgente por parte do G20″, diz a economista italiana Mariana Mazzucato, que participou da TF Clima.

“Os países do G20 devem avançar com estratégias industriais verdes ambiciosas alinhadas com suas NDCs e trabalhar para redirecionar o financiamento – incluindo os imensos recursos em bancos de desenvolvimento multilaterais e nacionais – para garantir que todos os países tenham espaço fiscal para agir”, completa.

O relatório deve subsidiar discussões da Cúpula de Líderes do G20 marcada para 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro – mesmo período da COP29, em Baku, no Azerbaijão.

Um dos pontos defendidos é que o bloco reforce, em sua declaração final e na COP29,  os apelos para uma arquitetura financeira global capaz de apoiar os países de baixa renda na criação de espaço fiscal e atração de investimentos verdes.



Os doze especialistas fazem doze recomendações. Elas estão divididas em blocos: estratégias industriais e finanças verdes.
 
Para tornar a produção industrial mais amigável ao clima, o relatório recomenda que o desenho das estratégias seja específico para cada país: “em vez de escolher setores, elas devem ser orientadas em torno de metas climáticas claras e ousadas, extraídas de NDCs, para catalisar investimento intersetorial, inovação e transformação”.
 
Outro ponto é a reorientação dos subsídios existentes, incluindo os benefícios aos combustíveis fósseis, “para longe de atividades intensivas em carbono e em direção a atividades sustentáveis”.
 
Uma potencial reforma da Organização Mundial do Comércio também entrou na lista: “Esta organização poderia fornecer uma plataforma para diálogo sobre como projetar e coordenar estratégias industriais verdes de uma forma que esteja em linha com as metas climáticas globais, ao mesmo tempo em que seja equitativa e não distorcida”.
 
Já na parte do financiamento, o foco é na arquitetura financeira global e o papel dos bancos – que decidem o que financiar e a que taxa de juros. Além de cobrar a responsabilidade de países que hoje são ricos ao custo de exploração e uso dos combustíveis fósseis que estão causando a crise climática.

É preciso cortar 42% das emissões anuais de gases de efeito estufa até 2030 e 57% até 2035 na próxima rodada de NDCs – que deve ocorrer na COP30, do Brasil – ou a meta de 1,5°C do Acordo de Paris desaparecerá em poucos anos.
 
Esta é a conclusão da análise anual do PNUMA sobre o alinhamento das políticas nacionais com os objetivos climáticos.
 
Segundo o Gap Report publicado hoje (24), aponta que, no cenário atual, o mundo está no caminho para um aumento de temperatura de 2,6°C a 3,1°C ao longo deste século. 
 
“Isso traria impactos debilitantes para as pessoas, o planeta e as economias”, alerta a agência da ONU.

O estudo da ONU mostra que há potencial técnico para cortes de emissões em 2030 de até 31 gigatoneladas de CO2 equivalente – o que é cerca de 52% das emissões em 2023 – e 41 Gt em 2035. Isso preencheria a lacuna para 1,5 °C em ambos os anos, a um custo abaixo de US$ 200 por tonelada de CO2 equivalente.
 
A corrida por instalações solares e eólicas poderia fornecer 27% do potencial total de redução em 2030 e 38% em 2035. A preservação de florestas poderia fornecer cerca de 20% do potencial em ambos os anos. Outras opções com impactos substanciais incluem medidas de eficiência, eletrificação e troca de combustível nos setores de edifícios, transporte e indústria. 


Mercado de carbono: agora vai? Após quase um ano de negociações e reclamações dos dois lados, Senado e Câmara finalmente avançaram para um acordo em relação ao texto projeto de lei que cria o mercado brasileiro e regulado de carbono. 

Segundo previsão do líder do governo no Senado, Otto Alencar (PSD/BA), após o fechamento do acordo, o projeto será apreciado em plenário até o fim de novembro, possivelmente antes do encerramento da COP29, que será realizada no Azerbaijão.

Plataforma de investimentos verdes. O governo brasileiro anunciou a seleção de projetos da Acelen, Vale, Fortescue, Atlas Agro e Meteoric – focados em biocombustíveis, hidrogênio verde e minerais críticos – para integrar a recém-lançada Plataforma de Investimentos em Transformação Climática e Ecológica do Brasil (BIP). A iniciativa visa atrair investimentos internacionais para projetos de transição energética e descarbonização.

Hidrogênio 1. Para o diretor do Instituto Nacional do Desenvolvimento da Química (IdQ), Milton Rego, os subsídios destinados ao hidrogênio de baixo carbono devem garantir que o país avance na descarbonização de sua própria indústria. Em entrevista à agência eixos, ele defende que o apoio deve ir além da produção do hidrogênio, e alcançar o consumo interno.

Hidrogênio 2. A EPE publicou estudo que avalia as condições do sistema de transmissão da região Nordeste para a conexão de grandes cargas, focando na produção de hidrogênio. Apesar do potencial da região, o estudo identificou sobrecargas em algumas linhas de transmissão (LTs) pré-existentes no Rio Grande do Norte. Veja detalhes

Chile 90% renovável até 2060. Análise da Aurora Energy Research sugere que o mercado de energia do Chile será composto por 90% de geração renovável até 2060, impulsionado pela rápida expansão da capacidade renovável e de armazenamento e pela meta do país de eliminar o carvão até 2040. O setor de energia chileno está projetado para crescer mais de 85 GW até 2060, com grandes contribuições da energia solar, que representará metade do mix de capacidade, seguida por baterias. 

Eólica offshore no RN. O Instituto Senai de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER) e a fabricante chinesa de turbinas eólicas Mingyang assinaram acordo de cooperação, nesta quinta-feira (24), para atividades relacionadas ao mercado de eólica offshore. Estão previstos estudos de prospecção e descomissionamento de aerogeradores instalados no mar, além de avaliações da cadeia de suprimentos e de rotas tecnológicas e logísticas.

Petrobras mede ventos. A petroleira anunciou nesta quinta (24) que investirá R$ 60 milhões para medições de ventos no mar. Serão lançadas cinco novas boias Bravo (Boia Remota de Avaliação de Ventos Offshore), para avaliação de recursos eólicos offshore. A primeira boia do novo grupo começará a operar em dezembro deste ano e as demais serão lançadas até o fim de 2025.

GD compartilhada. A Safira Energia iniciou suas operações em Mato Grosso do Sul, com a inauguração de uma usina solar no município de Cassilândia destinada a clientes de baixa tensão do Grupo B. Com potência de 2,4MW, a usina é capaz de gerar, em média, 540 MWh/mês e atender até 1.500 instalações. A energia será comercializada no modelo de GD remota na região de cobertura da Energisa MS.

Renováveis para aeronaves em solo. A Engie anunciou na quarta (23/10) um contrato com a GRU Airport para prover eletricidade e ar-condicionado aos aviões com energia renovável, enquanto eles estiverem estacionados em solo. A solução, que já está disponível em Brasília, substitui equipamentos movidos a combustível fóssil, contribuindo com a redução de cerca de 15 mil toneladas de CO2/ano.