Naufragado o plano da reforma da previdência ainda no final de 2017 pelas mãos do Congresso, o governo de Michel Temer escolheu o setor elétrico como alvo de sua esperança para fechar seu último ano com uma agenda de reformas capaz de animar a indústria, embalar a recuperação da economia e reforçar o caixa da União. Mas enquanto os planos do governo começam ainda a ser apresentados na Câmara dos Deputados – onde as principais comissões da área econômica realizaram até agora apenas uma reunião de trabalho -, as pautas do setor elétrico tornaram-se também a vidraça da oposição e contam com a desconfiança de parte do mercado e da própria base do governo no Congresso.
Às pressas, Moreira Franco foi chamado para o Ministério de Minas e Energia depois que o antigo nome na pasta, Fernando Bezerra Coelho Filho, desistiu da filiação ao MDB no último dia da janela partidária. Agora, o novo ministro tem o desafio de capitanear a privatização da Eletrobras e de articular projetos tão essenciais para uma agenda positiva quanto a Lei do Gás e a aprovação da cessão onerosa. Nesta sexta-feira, o governo publicou o decreto que incluiu a Eletrobras no Programa Nacional de Desestatização (PND), mas deixou uma ressalva que é preciso primeiro aprovar o Projeto de Lei nº 9.463, de 2018, relatado pelo deputado José Carlos Aleluia (DEM/BA).
Enquanto faz as primeiras reuniões de aproximação com parlamentares que ainda permanecem na base do governo, o ministro foi escolhido como principal alvo da oposição no começo do ano legislativo. Esta semana a bancada do Psol na Câmara protocolou na Justiça Federal uma ação civil pública contra a nomeação de Moreira para a pasta. Os congressistas afirmam que a nomeação foi uma tentativa de Temer para manter o foro privilegiado de Moreira num movimento de recurso ao Judiciário semelhante ao que impediu a posse de Lula como ministro da Casa Civil no último ano do governo Dilma. Moreira foi acusado em delações da Odebrecht na Lava Jato como receptor de recursos ilícitos em licitações de aeroportos quando era ministro da Secretaria de Aviação Civil, também no governo Dilma.
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Oposição aprova 98 requerimentos de audiências públicas na comissão da MP 814
O foco da oposição é evitar a privatização da Eletrobras e suas subsidiárias. Além da Justiça, parlamentares afirmam que vão recorrer a todos os recursos para atrasar as reuniões da comissão especial montada no Congresso para tratar do tema. Nas últimas 48 horas, a comissão aprovou 98 requerimentos de audiência pública para debater a privatização. A maioria absoluta dos documentos foi protocolada por parlamentares da oposição e membros da base do governo que são contrários à privatização, como abancada do MDB de Minas Gerais, interessada em manter Furnas sob os olhos da política do estado.
Mas não é só na oposição que Moreira vai encontrar dificuldades. Para o mercado, a troca do ministro de Minas e Energia foi vista por muitos como uma indevida interferência política capaz de atrapalhar o bem recebido plano de privatização da Eletrobras. Sem mandato no Legislativo desde 2007, há desconfiança também sobre a capacidade do novo titular do MME em dialogar com deputados e senadores em uma proposta impopular, sobretudo em ano eleitoral.
Capacidade de articulação do MME no Congresso será posta à prova
Críticas foram feitas também na base aliada. Escolhido presidente da Comissão de Minas e Energia e novo relator da Lei do Gás (PL 6403/2013), o deputado Marcelo Squassoni (PRB/SP) classificou como “um erro” a estratégia do governo de criar uma comissão especial para a debater a privatização com o Congresso.
“Envolveram um monte de gente que não tem nada com o setor. A comissão não faz reuniões porque não consegue ter quórum”, disse o deputado à E&P Brasil. Sua fala se aproxima das críticas feitas no mês passado pelo relator do projeto de privatização, deputado Carlos Aleluia, para quem o governo não vinha se esforçando pela privatização no Congresso e precisaria substituir alguns membros da comissão para reforçar o apoio à proposta.
Para acelerar a articulação com o Congresso, Moreira está contando com o apoio do novo secretário-executivo do MME, Márcio Félix. Na última terça-feira os dois se reuniram com autoridades do governo e deputados em uma série de reuniões para tratar da Lei do Gás (PL 6.407/2013), Cessão Onerosa (PL 8939/2017) e, claro, da Eletrobras.
Privatização tem poucas chances se ficar para o segundo semestre
Caso queira aprovar a privatização da Eletrobras, o governo precisa correr contra o relógio. Pouco mais de dois meses do Dia de São João, o Planalto sabe que reunir congressistas após as festas juninas em ano eleitoral será um desafio, muito mais para votar uma pauta considerada impopular por muitos.
Na prática do Congresso, as festas de meio de ano marcam o início informal da campanha eleitoral, sobretudo nos estados do Nordeste, onde a tradição é mais forte. A volta para casa no recesso marca a reaproximação dos parlamentares com suas bases e a consolidação das redes de aliança para a disputa eleitoral de outubro.
No Nordeste a iniciativa de privatizar a Eletrobras é especialmente mal recebida entre caciques. Todos os governadores da região assinaram no fim do ano passado uma carta enviada a Temer onde manifestaram sua oposição à privatização. Conseguir um clima favorável à proposta no segundo semestre do ano é um desafio nada desprezível.
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