Assim como outros países, o Brasil assumiu compromissos de redução na emissão de gases com efeito estufa como medida urgente no combate ao aquecimento global e às mudanças climáticas cada vez mais velozes e, nesse contexto, tem-se percebido certa movimentação de estados e municípios, sobretudo por meio de iniciativas tributárias de estímulo ao mercado de créditos de carbono e à produção de combustíveis de matriz renovável.
O exemplo mais recente dessa onda vem sendo liderado pelo município do Rio de Janeiro que, em junho de 2023, reduziu para 2% a alíquota de Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sobre determinados serviços relacionados ao mercado de carbono, tais como desenvolvimento de projetos e certificação de créditos de carbono (Lei nº 7.907, de 12 de junho de 2023).
Dentre as iniciativas, o Rio de Janeiro criou o programa “ISS neutro” para conceder créditos de ISS para abatimento do valor do imposto devido nas atividades promovidas por prestadores de serviços de desenvolvimento e auditoria de projetos de créditos de carbono, plataformas de transação desses créditos e serviços de inventário de emissões de gases de efeito estufa, desde que esses prestadores estejam estabelecidos no território do município.
A expectativa é de que esse benefício seja limitado até 2030 (ou até atingimento da meta de redução de emissões de gases poluentes a ser definida no regulamento) e, dentre outras condições, a ideia é que esteja restrito à diminuição de carga tributária que represente uma alíquota de até 2% de ISS, com montante anual máximo para todos os contribuintes de 60 milhões de reais.
Embora a validade do programa “ISS neutro” ainda dependa de regulamentação, a iniciativa do Rio de Janeiro é válida e mostra que a política voltada para incentivar o desenvolvimento do mercado sustentável é prioridade no município.
Regulação e ampliação da produção nacional
Sobre esse aspecto, é importante comentar que uma das formas de redução da emissão de CO2 está relacionada à ampliação da produção de hidrogênio verde no país, o que parece ser tema de interesse nacional, já que estão em trâmite no Congresso Nacional os Projetos de Lei nº 1.878/2022 e nº 725/2022, com a finalidade de disciplinar a utilização desse combustível como vetor energético para a transição para uma economia de baixo carbono.
Inclusive, no âmbito privado, a ABEEólica, Absolar, Abiogás e AHK Rio assinaram o Pacto Brasileiro pelo Hidrogênio Renovável para acelerar o desenvolvimento de hidrogênio verde na matriz energética brasileira.
Esse movimento se deve ao fato de que o hidrogênio verde é uma alternativa menos poluente aos atuais combustíveis fósseis derivados de petróleo e pode ser obtido a partir da eletrólise da água mediante utilização de energia de fontes renováveis, como solar e eólica.
Por sua matriz renovável, com a maior difusão da produção e utilização do hidrogênio verde no país, o Brasil poderia se beneficiar do mercado de créditos de carbono no âmbito internacional, por meio do sistema criado pelo Protocolo de Quioto para permitir que países com saldo positivo de utilização de carbono realizem a venda desses créditos para outros países.
Não por outra razão, outros entes da federação têm se movimentado para conceder incentivos fiscais à produção hidrogênio verde, como um produto que promete aprimorar os aspectos ESG – relacionados aos aspectos ambiental, social e governança, em português – de empresas de diversos setores.
No âmbito estadual, por exemplo, a Bahia já concede diferimento de ICMS nas saídas internas de energia renovável para produção de hidrogênio e amônia verdes, assim como Ceará e Piauí diferem o ICMS na entrada interestadual de energia a ser utilizada na produção de hidrogênio verde, sob determinadas condições.
Classificação fiscal específica para o hidrogênio verde
As iniciativas, contudo, ainda são tímidas e podem ser aprimoradas de forma mais consistente por outros entes da federação, inclusive pela própria União Federal, que pode incentivar a criação de classificação fiscal específica para hidrogênio verde que permita benefícios próprios sobre tributos federais.
Assim como a inclusão expressa dos projetos de hidrogênio verde como projetos de infraestrutura elegíveis a tratamentos diferenciados que estimulem a construção de plantas de produção, como o Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi), que desonera PIS/Cofins na prestação de serviços e aquisição de ativos para construção de projetos de infraestrutura.
Espera-se que a iniciativa do município do Rio de Janeiro seja o pontapé inicial para que as autoridades fiscais se movimentem e levem em consideração a importância da produção a partir de fontes de energia renováveis, como aquelas que dão origem ao hidrogênio verde, especialmente em um momento de reforma tributária e discussões sobre alterações legislativas que tenham impacto positivo na sociedade.
João Paulo Muntada Cavinatto é sócio de Tributário do Lefosse, com atuação em Tributos Indiretos e Direito Aduaneiro.
Rafaela Canito e Gabriela Cavalcanti são, respectivamente, counsel e advogada da área de Tributário do Lefosse, com atuação em Tributos Indiretos no setor elétrico e em projetos de infraestrutura.
Este artigo expressa exclusivamente a posição dos autores e não necessariamente da instituição para a qual trabalham ou estão vinculados.
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