RIO – A União aprovou em assembleia geral extraordinária (AGE), na tarde desta quinta-feira (30/11), as mudanças nas regras de indicação de conselheiros e administradores da Petrobras.
O governo Lula espera, com isso, encerrar uma disputa que ocorre internamente nas vedações por conflitos de interesse, especialmente no caso de agentes públicos indicados para o CA.
Minoritários tentaram adiar a decisão, em razão das pendências no Supremo Tribunal Federal (STF) — que derrubou trechos da Lei das Estatais com uma decisão liminar do ex-ministro Ricardo Lewandowski — e questionamentos feitos pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
O órgão de controle, aliás, ainda precisará validar um dos trechos da revisão do estatuto: o ajuste na redação do artigo 21, segundo o qual, para a investidura de cargo de administrador, a companhia considerará apenas hipóteses de conflito de interesse material — e para os casos de conflito de interesse formal, somente aqueles expressamente previstos em lei.
Em relação à indicação de conselheiros com atividade partidária nada muda. Se a vedação for restabelecida pelo STF, volta a valer. Independente do estatuto, a empresa está subordinada à legislação.
Outra mudança aprovada foi o fim da cobertura do seguro de proteção para diretores em casos de atos de dolo ou culpa. Além da criação de uma reserva de capital para o pagamento de dividendos.
As propostas foram aprovadas por 54,98% dos acionistas com direito a voto presentes na AGE. Os votos foram, sobretudo, da União. Outros 31,96% foram contra as modificações e 13,06% se abstiveram. Participaram da assembleia 93,27% dos acionistas com direito a voto.
O que muda no estatuto da Petrobras?
- O estatuto social da Petrobras havia incorporado a Lei das Estatais, com uma quarentena de 36 meses para dirigentes partidários, caso do conselheiro Sérgio Rezende, ex-ministro que deixou o PSB no fim do ano.
- E impedia o acúmulo de cargo de direção no governo e no conselho por agentes sem vínculo permanente com a administração pública, caso do secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia (MME), Efrain da Cruz.
- A segunda mudança, essa sem relação com o STF, mas com a Lei das S.A., trata de conflitos de interesse, que levou à falta de consenso na nomeação de Pietro Mendes, presidente do conselho e secretário de Petróleo e Gás do MME.
TCU questiona falta de pareceres
A cautelar do TCU afastou a questão que depende do STF, mas considera que há possíveis irregularidades na aplicação das hipóteses de conflito de interesse com risco de “ingerência indevida na interpretação do conceito legal”.
Considera que a Petrobras propôs a mudança sem o embasamento correto – “ausentes pareceres jurídicos ou manifestações da área técnica da companhia que oferecessem suporte a essa proposta”, diz o relatório do ministro Jorge Oliveira. O rito interno “demonstra açodamento da estatal e falha formal em sua apreciação”, diz.
Durante a AGE, a União, por meio do procurador-geral Ivo Timbó, propôs um ajuste no novo texto do estatuto, para especificar que a companhia considera como conflito de interesses os casos materiais, além dos casos formais que estejam expressamente previstos em lei.
“Entendia-se que estava um pouco obscura a redação proposta pela companhia. Para deixar claro que deve ser avaliado o eventual conflito de interesses de cunho material, a União está ajustando o texto a ser deliberado”, disse Timbó. Com isso, o governo espera ter o aval do TCU.
À proposta original, em que “a companhia somente considerará hipóteses de conflito de interesses formal nos casos expressamente previstos em lei”, foram acrescentadas as “hipóteses de conflito material”, cobrindo as alternativas (formal e material) que devem ser levadas em conta na escolha de administradores de companhias.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu duas investigações esse ano sobre o abuso no poder de voto da União, sem chegar a uma conclusão até o momento.
A proposta de alteração do estatuto foi feita pelo atual conselho de administração em outubro. Na ocasião, gerou reação negativa do mercado e a companhia esclareceu que não haveria redução nas exigências em relação à Lei das Estatais.
Segundo a empresa, o objetivo das alterações seria “manter o Estatuto Social da Petrobras atualizado, quaisquer que venham a ser as decisões judiciais sobre o tema”.
No governo de Jair Bolsonaro, a União elegeu Jonathas de Castro e Ricardo Soriano de Alencar, que haviam sido avaliados como inelegíveis pelos comitês internos da companhia.
Castro era secretário executivo da Casa Civil de Ciro Nogueira (PP). E Soriano, Procurador Geral da Fazenda Nacional (PGFN), órgão da Advocacia-Geral da União (AGU), na esfera do antigo Ministério da Economia, de Paulo Guedes.
Caso similar ocorreu com Pietro Mendes, agora no governo Lula. O secretário seria “detentor de informações estratégicas e proponente de políticas públicas que têm relação direta com as atividades desenvolvidas pela companhia”.
As vedações foram recomendadas sem consenso, justamente pelas diferentes interpretações da governança interna da Petrobras.
Nomeações de dirigentes será julgada em dezembro
Efrain da Cruz, secretário executivo de Minas e Energia (MME), e Sergio Machado Rezende, ex-ministro e ex-dirigente do PSB, passaram com a decisão liminar. Nesse caso, a vedação seria legal.
A decisão do STF, tomada este ano em ação movida pelo PCdoB, tornou inconstitucionais artigos da Lei da das Estatais. Internamente, o jurídico da Petrobras sustentou no início do ano que por se tratar de liminar, os comitês internos deveriam considerar o que estava no estatuto, uma cópia da lei.
Como a decisão cabe à assembleia, com maioria da União, os conselheiros indicados por Lula foram todos nomeados, desencadeando críticas à fragilização da governança da companhia. Decisões similares foram tomadas no governo de Jair Bolsonaro.
A ação pode ser julgada em definitivo na próxima semana e está sob relatoria de Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula que tomou posse esse ano na corte.
Reserva de capital vai ser usada para pagar dividendos
As alterações no estatuto da Petrobras aprovadas hoje também preveem a criação de uma reserva de capital para o pagamento de dividendos.
Na semana passada, o diretor financeiro e de relações com investidores, Sérgio Caetano Leite, havia explicado em coletiva de imprensa que a reserva ajudaria a companhia a manter os pagamentos aos acionistas em momentos de descompasso entre o lucro líquido e o caixa da empresa. “É uma modernização da governança. As grandes empresas listadas na B3 têm essa reserva”, disse.