O prejuízo crescente dos consumidores não adotantes da geração distribuída (GD) diante da expansão do uso desses sistemas foi o principal argumento da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ao longo dos últimos anos para justificar a necessidade de mudança nas regras do segmento.
Mas, no acordo que fecharam com representantes do setor de energia solar e do Ministério de Minas e Energia (MME) em torno de uma proposta de marco legal para a GD, como num passe de mágica, isso foi esquecido.
O texto entregue na semana passada a lideranças do Congresso Nacional e que pode ser votado a qualquer momento pela Câmara dos Deputados nos próximos dias também não contou com a participação dos consumidores em sua elaboração.
Cabe-lhes apenas a responsabilidade por pagar a conta, num momento em que as tarifas já estão extremamente elevadas.
É inacreditável que as instituições participantes tenham tomado a decisão sem qualquer sensibilidade e entendimento da realidade da grande maioria dos brasileiros.
- R$ 26 bi já foram pagos em subsídios na energia Em 2018, os benefícios representaram 5,51% da tarifa dos consumidores residenciais. Em novembro de 2022, atingiram 12,59%
A proposta de projeto de lei assinada por representantes das associações de energia solar (Absolar), geração distribuída (ABGD), além da Abradee e dos órgãos governamentais, prevê a manutenção, até 2045, das regras de compensação de energia para unidades de geração distribuída já conectadas e transição, até 2027, para novos projetos.
Durante esses períodos, os custos associados ao uso da rede de distribuição de energia elétrica pelos detentores de sistemas de GD serão repassados aos consumidores cativos não adotantes do mecanismo.
O repasse deve ser feito por meio da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) paga pelos consumidores cativos.
Ou seja, quem não tem condições de instalar o próprio sistema fotovoltaico ou migrar para o mercado livre terá de arcar com um custo cada vez maior via o encargo, um impacto que a própria Aneel chegou a estimar na faixa de cerca de R$ 3 bilhões por ano.
Também é preocupante a previsão de que o excedente de energia produzido pelos projetos de GD possa ser vendido apenas para as distribuidoras.
É que essa ideia de se criar um mercado regulado vai totalmente na contramão da modernização do setor, que pressupõe que o gerador tenha autonomia em relação ao destino desses excedentes.
Além disso, é preocupante a determinação de que as distribuidoras tenham direito à exposição involuntária pela energia que deixar de ser consumida por adotantes de GD.
Ou seja, o custo associado a essa energia também será repassado aos consumidores cativos, quando esse é um risco inerente ao negócio e deveria ser gerido pelas concessionárias.
Finalmente, o único potencial benefício do acordo diz respeito à possibilidade de uso de recursos do Programa de Eficiência Energética (PEE) para a implantação de projetos fotovoltaicos para consumidores de baixa renda, que dificilmente teriam condições de acessá-los.
Além dessa destinação, o modelo deveria ser empregado em benefício de consumidores dos sistemas isolados e pequenos agricultores.
O fato é que, na impossibilidade de se extinguir o subsídio, isso é o mínimo que poderia ser feito, tendo em vista que a GD pode ser uma alternativa para se reduzir o peso da energia no orçamento familiar dessas parcelas mais carentes da população, por meio de energia sustentável e a preços acessíveis, em linha com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 7 da ONU.
Clauber Leite é coordenador do Programa de Energia e Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
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