Regulação

Democratização do gás natural? A participação social na nova regulamentação

Acelerar regulamentação do gás é fundamental, mas não pode comprometer qualidade e a participação social, escreve Clara Diniz

A participação social na nova regulamentação do gás natural levará à efetiva democratização do gás, questiona Clara Diniz [na imagem], analista de Energia da Abrace Energia (Foto Divulgação)
Clara Diniz, analista da Abrace, defende que regulamentações no gás sejam feitas de forma transparente e democrática | Foto Divulgação

O setor de gás natural brasileiro vive um momento de intensa transformação, impulsionado pela nova Lei do Gás (nº 14.134/2021) e pela crescente abertura do mercado. 

Em 2024, o número de contratos firmes entre supridores e distribuidoras saltou 77%, evidenciando a dinâmica desse novo cenário.

Essa expansão, por sua vez, trouxe consigo desafios complexos, como a análise detalhada dos preços e a garantia de que os repasses às distribuidoras sejam justos e transparentes. 

Diante dessa nova realidade, a necessidade de uma regulamentação robusta e a participação efetiva da sociedade se fazem ainda mais urgentes para assegurar a competitividade do setor e a proteção dos consumidores.

A explosão do número de consultas públicas em 2024, especialmente no segundo semestre, é um indicativo claro da intensa atividade regulatória. 

Agenda se intensifica no 2º semestre

Agências reguladoras estaduais e a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) abriram dezenas de consultas, abordando temas complexos e estratégicos para o setor. 

No entanto, a quantidade de consultas parece ter superado a qualidade, com prazos exíguos e pouco tempo para análise e discussão por parte dos agentes do mercado.

A falta de tempo para uma análise aprofundada das propostas e a elaboração de contribuições sólidas tem gerado questionamentos sobre a real intenção das agências em promover a participação social. 

A impressão é que a prioridade tem sido a velocidade na implementação das novas normas, em detrimento da qualidade e da transparência do processo.

Em especial, destacamos o movimento um tanto curioso da abertura simultânea de mais de 12 consultas públicas para o 4º trimestre de 2024, que chama atenção para uma aparente sincronia entre os órgãos reguladores. 

Participação social fica prejudicada por sobrecarga

Ao analisar o cenário anual, percebemos um crescimento exponencial do número de consultas com o passar dos meses em 2024. Essa quantidade expressiva sobrecarrega entidades nacionais, dificultando a participação efetiva em todas as discussões, dada a necessidade de priorizar e alocar recursos limitados para análises aprofundadas.

A falta de previsibilidade nos processos regulatórios tem gerado insegurança e atrasado investimentos. Para mudar esse cenário, é imprescindível estabelecer uma agenda regulatória clara e consistente, além de fortalecer as instituições responsáveis por sua implementação.

O acelerado processo de regulamentação do mercado de gás natural é fundamental para garantir o desenvolvimento do setor e a segurança energética do país. 

No entanto, a pressa em implementar as novas normas não pode comprometer a qualidade da regulação e a participação da sociedade.

É preciso encontrar um equilíbrio entre a velocidade e a profundidade das análises, garantindo que as decisões sejam tomadas de forma transparente e democrática. Somente assim será possível construir um mercado de gás natural mais competitivo, eficiente e sustentável.


Clara Diniz é analista de Energia da Abrace Energia, associação que representa os grandes consumidores de energia elétrica e gás natural.