Biocombustíveis

Raízen avalia unir distribuidoras com usinas de etanol, mas depende da ANP 

Empresa consultou agência sobre a revogação de regras que impedem a verticalização no mercado de biocombustíveis

Raízen planeja união de distribuidoras com usinas de etanol por meio de uma incorporação reversa, mas depende de decisão da ANP. Na imagem: Dutos e tanques de armazenamento de biocombustíveis imensos, na cor branca, com a inscrição "Raízen", na base de combustíveis em Rondonópolis, no Mato Grosso (Foto: Divulgação)
Base de combustíveis da Raízen em Rondonópolis/MT (Foto: Divulgação)

BRASÍLIA – A Raízen pretende realizar uma reestruturação societária por meio de uma incorporação reversa, em que a controlada Raízen Energia vai incorporar a controladora Raízen SA. No entanto, a operação esbarrou nas regras da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que impedem a verticalização no mercado de biocombustíveis.

A regulação impede que uma mesma empresa seja produtora de etanol e distribuidora de combustíveis, caso da Raízen Energia – dona das usinas – e da Raízen, a controladora do grupo de empresas e que é detida pela Cosan e Shell.

Essas informações foram antecipadas pelo político epbr (teste grátis por 7 dias), serviço premium de política energética da epbr.

Isto é, por mais que não haja vedação regulatória para um mesmo grupo empresarial atuar nos dois elos, hoje é necessário que isso se dê por meio de pessoas jurídicas diferentes.

O político epbr apurou que, em junho de 2023, a empresa fez uma consulta à agência reguladora, propondo revogar trechos das resoluções 944/2023 e 734/2018. Dentre os argumentos, consta a Lei de Liberdade Econômica, fruto de uma MP editada por Jair Bolsonaro em 2019, e suas medidas para “evitar o abuso do poder regulatório”.

Internamente, as áreas técnicas da agência se opuseram a promover uma mudança de regras sem o rito de revisão tradicional – realização de Análise de Impacto Regulatório (AIR), consulta e audiência públicas.

Paralelamente, a agência vem conduzindo estudos internos que envolvem a verticalização no mercado de downstream, mas o prazo de conclusão está previsto para meados de 2025.

Do ponto de vista regulatório, as áreas técnicas questionaram o mérito de autorizar a verticalização, apontando riscos concorrenciais. A procuradoria federal tem subsidiado a discussão, afastando a tese de revogação imediata das regras.

As informações constam em documentos obtidos pela agência epbr. A análise interna na agência não é definitiva e o caso deve passar pelo crivo da diretoria colegiada. Ainda não há previsão para entrar em pauta.

Segundo esses documentos, a mudança poderia ter implicações tributárias, mesmo que positivas. Mas por outro lado, há preocupações com o acesso das agências a informações dos agentes regulados.

Um exemplo são os preços: um agente verticalizado poderia transferir os produtos internamente, enquanto as vendas dos produtos entre empresas juridicamente distintas têm seus valores reportados à agência.

Isso ocorre no mercado de petróleo, em que a Petrobras utiliza preços internos de transferência, que refletem o valor do óleo refinado nas refinarias próprias da companhia. Até o início de 2023, os valores constavam no balanço da companhia.

Eventuais soluções para permitir a verticalização, com possíveis ganhos de eficiência, mas mitigando riscos concorrenciais, dependeria assim de uma revisão regulatória ampla e não apenas da revogação de trechos das resoluções, segundo a leitura de técnicos da agência.

O que diz a Raízen?

Procurada pela agência epbr, a Raízen afirmou em nota que a mudança “permitiria a redução no volume de obrigações acessórias de reportes ao mercado e traria maior eficiência à gestão dos negócios”.

A companhia também argumenta que nas resoluções da agência “já é permitido que produtores de derivados atuem simultaneamente na distribuição de combustíveis”.

A decisão final caberá à diretoria colegiada do órgão regulador, mas não há prazo para o processo entrar em pauta, uma vez que as superintendências ainda analisam o caso.

Procurada na tarde desta segunda-feira (17/6), a ANP ainda não se manifestou imediatamente sobre o caso. Nesta terça-feira (18/6) a agência informou que o processo e elaboração e alteração de normas segue o Decreto 10411/2020. Assim, qualquer revisão que afete o mercado deve passar por AIR, consulta e audiência públicas.

A ANP reiterou que ainda não houve decisão sobre o caso, que encontra-se em análise, e confirmou que foram feitas consultas internas à Procuradoria Federal. As observações serão consideradas pela área técnica, que submeterá o caso à diretoria.

Veja a íntegra da nota da Raízen à agência epbr:

A Raízen formalizou consulta à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) sugerindo a flexibilização de normas regulatórias que vedam que uma mesma pessoa jurídica atue na produção de biocombustíveis e na distribuição. Eventual posicionamento favorável da Agência permitiria a redução no volume de obrigações acessórias de reportes ao mercado e traria maior eficiência à gestão dos negócios. Atualmente, nas resoluções da agência já é permitido que produtores de derivados atuem simultaneamente na distribuição de combustíveis. Até o momento, não houve manifestação definitiva da ANP sobre o tema.